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298 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

ptorio de s. exa. chegasse um individuo para tratar de uma questão insignificante, por exemplo - permitia-me a expressão - da simples compra de um burro (Riso.) com um documento d'esta ordem, que não tem assignatura, que não tem data, que é anonymo, não se sabendo quem n'elle figurou, v. exa. faria obra por similhante documento?!...»

O sr. Luciano Monteiro: - Eu respondo e vem a geito. Se fossem ao meu escriptorio consultar-me sobre a venda de um burro, eu apreciaria e veria todos os documentos. Mas deixe-me dizer a s. exa., que parece confundir a nacionalidade portugueza com um burro; e de facto assim é, porque o projecto do governo, na opinião de s. exa., mira fatal e inevitavelmente ao meu caso, chamar borro a Portugal!...

O Orador: - o meu pensamento é nitido e claro para toda a camara; sirvo-me d'esta comparação, como me poderia servir de um campo, de um pedaço de terra ou de um objecto mais insignificante, uma arma, um revolver; é um exemplo como outro qualquer.

Já me não dirigirei a s. exa., para que não imagine que o quero incommodar, mas dirijo-me aos advogados d'esta camara, onde de facto ha bastantes e muito illustrados, a quem pergunto directamente: «digam-me se um documento n'estas circumstancias podia servir de prova irrefragavel?»

Isto em relação á fórma externa; mas, pelo que respeita ao conteudo, ha cousas muito mais graves e attentatorias n'este documento.

Contém elle, desde o principio até ao fim, um tom desagradavel e quasi injurioso para o nosso paiz! Este documento refere-se á gerencia do sr. Dias Ferreira, e diz «que, em consequencia dos factos passados no seu ministerio, todas as cautelas são poucas em relação aos intermediarios»! E eu vou citar as paginas:

São, pagina 14, onde se lê: «Le comité, dans sou rapport lu tout à leure, faisant allusion aux pourpalers qui eurent lieu sous le ministere de mr. Dias Ferreira, a dit qn'on ne saurait se montrer trop circonspect sur les qualités et pouvoirs des négociateurs.»

E, demais, elle está recheado de palavras deprimentes para o nosso paiz. Dizem, por exemplo, aqui os nossos credores, que é preciso fazer um bloqueio na bolsa de Paris, para obrigar o governo portuguez a acceitar o convenio com elles; e todo este conteúdo não respira senão a hostilidade aberta e má vontade contra o nosso governo. E é este documento que o sr. Dias Ferreira classificou como parto de uma reunião memoravel!

Mais ainda. No fim das conclusões d'essa reunião, encontra-se o seguinte, que é edificante:

«Segunda resolução. - A assembléa, considerando que é de interesse commum de Portugal e de seus credores que a regulamentação de todas as suas dividas exteriores seja effectuada com urgencia, emitte o voto de que a reparação seja completa e comprehenda todas as emissões portuguezas, sem excepção.»

Note-se bem, todas eu dividas exteriores, mesmo as de D. Miguel! Bem se póde ver aqui o dedo do conde de Reilhae, o nosso inimigo e o nosso diffamador!

Pois bem, é tudo isto que o sr. Dias Ferreira acaba de exaltar n'esta camara e de que fez uma das suas principaes argumentações, para mostrar que a base principal do projecto que se discuto não podia ser acceita!

Escuso de dizer mais nada, para fazer caír pela base, n'este ponto, a argumentação de s. exa.

E agora perguntarei qual é mais vexatoria: a consignação dada aos nossos credores do rendimento das nossas alfandegas, ou o estado actual, como resulta da lei de 20 de maio de 1893? Nós, por este projecto, consignando o rendimento das alfandegas, nada temos com os credores, nem elles comnosco, porque os rendimentos das alfandegas chegam de sobejo para os assegurar e para que elles se não inquietem com a fiscalisação. Mas, pelo regimen actual, os credores tinham de nos vigiar constantemente; e como tem acontecido, e consta - segundo creio - de reclamações internacionaes, se desviassemos ou diminuissemos um ceitil só do rendimento das alfandegas, ahi estariam elles a protestar e a desconfiar da nossa boa fé.

D'este modo, desapparecerá, pois, a vexação d'essa tutela ominosa que resulta da legislação anterior, de que o governo não tem a minima responsabilidade, e pela qual não podiamos abater um ceitil do rendimento das alfandegas, sem inconvenientes internacionaes, nem podiamos augmental-o, sem que metade fosse para os credores externos.

Pelo projecto que se discute, daremos, é certo, uma garantia, mas completamente desprendida de toda a vexação; e essa garantia tambem o sr. conselheiro Dias Ferreira se prestava a dal-a na lei de 1892.

Para mostrar que não resulta d'aqui nenhuma deshonra para o paiz, citarei tambem uma outra auctoridade insuspeita n'esta camara, que tenho pena de não ver presente, porque desejava testemunhar-lhe na presença o grande apreço em que tenho o seu enorme talento e o resplendor d'essa intelligencia assombrosa, que constitue um dos vultos mais proeminentes da nossa moderna historia politica. Refiro-me ao sr. Marianno de Carvalho.

No livro que elle escreveu, Planos financeiros, diz muito expressamente, a pag. 98, o seguinte:

«Dar segurança aos credores, quando com elles se ajusta reducção dos juros e amortisações, que se torna impossivel pagar integralmente, não nos parece que tenha nada de deprimente para a dignidade de uma nação, sempre que - repetimos - n'essa concessão de seguranças não haja quebra de decoro, nem diminuição dos direitos soberanos.»

Aqui está uma opinião insuspeita, escripta por um homem cuja auctoridade n'estes assumptos é irrefutavel.

Creio ter demonstrado que não ha nada de deprimente para o paiz na garantia consignada no projecto; mas, se alguma cousa ha de deprimente, a culpa não é nossa. (Apoiados.) E tanto mais que, segundo tenho ouvido dizer, uma condição irrevogavel, lembrada pelos credores externos, para se poder fazer o accordo com elles, é o garantirmos nós, de um modo definitivo, o pagamento do seu credito.

E repetirei novamente. Se é deprimente similhante consignação, muito mais deprimente é o regimen que resulta da lei de 20 de maio de 1893, pela qual os credores têem direito a fiscalisar, e fiscalisar ceitil a ceitil, o que arrecadamos nas alfandegas, levantando a toda a hora, por causa d'isso, reclamações contra o nosso paiz. (Apoiados.)

Segue-se tratar da outra clausula do projecto, e é a que se refere ás despezas da operação.

O sr. Dias Ferreira não se referiu a este ponto, mas eu quero tratar completamente de toda a materia, como entendo e posso, segundo os meus pequenos recursos. Por consequencia, refiro-me a este ponto, franca e desassombradamente; e, sem esperar pela argumentação da opposição, vou ao seu encontro.

Estas despezas estão calculadas n'um terço do valor nominal do fundo amortisavel. Calculando estas despezas, andam por oitocentos e tantos contos, e com o valor do cambio, a 50 por cento, approximadamente, andarão ellas por 1:300 contos, tambem approximadamente. Mas o governo só gastará, dentro d'este limite, o que for necessario; e, quando tenha de gastar tudo, terá de emittir titulos para isso, vindo assim, quando muito, o encargo annual a ser de 60, 70, 80 ou 90 contos, conforme a taxa do juro dos papeis que emittirmos.

Eu não sou mathematico, e por isso peço aos srs. deputados, conhecedores do assumpto, que corrijam este calculo, se n'elle ha inexactidão. Em todo o caso, o erro, se o ha, não será grande; e, calculada assim a media em 70,