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SESSÃO NOCTURNA N.° 61 DE 8 DE AGOSTO DE 1908 3

ABERTURA DA SESSÃO - Ás 9 horas da tarde

ORDEM DA NOITE

Continuação da discussão do projecto de lei n.° 25 (Orçamento Geral do Estado)

O Sr. Estevam de Vasconcellos: - Sr. Presidente: o primeiro orador opposicionista, que falou na discussão do orçamento, principiou por declarar com uma modéstia inteiramente descabida, porque todos reconhecem o seu alto valor parlamentar e a sua competencia em assuntos financeiros, que apenas abria o debate em nome da opposição dissidente, pela circunstancia muito eventual de estarem ausentes ou doentes alguns dos seus collegas.

Eu principio por declarar que apenas abro o debate em nome da minoria republicar, pela circunstancia muito simples de ter de abandonar nesta occasião os trabalhos parlamentares para ir reassumir as minhas funcções de medico municipal.

Se não fora este facto eu teria escolhido para me inscrever, em assunto tão grave, outra altura do debate que fosse mais adequada á deficiencia das minhas aptidões e ao meu limitado tirocinio parlamentar. (Não apoiados).

Nas succintas e despretenciosas considerações que vou ter a honra de expor a V. Exa. e á Camara procurarei encarar o problema dos impostos.

E todos com prebendem decerto quanto esse problema é interessante na discussão do orçamento desde que se attenda a que, aparte os 4:500 contos provenientes dos proprios nacionaes e de outros rendimentos d" somenos importancia, os impostos constituem a fonte exclusiva de onde se extraem os recursos de que o Estado pode lançar mão para as despesas essenciaes á sua manutenção e para os melhoramentos que pela sua estructura material ou pelo seu alcance social contribuem para a prosperidade do país. (Apoiados).

D'ahi já se conclue a sua grande importancia.

Mas essa importancia ainda mais avulta pelo seguinte:

Os impostos não podem deixar de ter, pela acção que exercem em todos os phenomenos de producção, circulação e consumo, uma influencia decisiva na vida economica dum país, nas suas condições de existencia, na sua productividade agricola, no seu desenvolvimento industrial, em tudo o que concorre para a sua evolução progressiva, quando elle possue elementos de viabilidade que lhe permittem manter a sua autonomia politica e financeira, ou para o seu descalabro quando não possue esses elementos. (Apoiados).

Por isso mesmo que o assunto é de uma tal gravidade e de uma tal repercussão em toda a vida nacional, muito mal teem procedido aquelles que em Portugal se teem limitado a considerar os impostos como um processo de angariar recursos para o Estado, aumentando-os a esmo muitas vezes, com simples addicionaes, sempre que as circunstancias do Thesouro se tornem mais afflictivas. (Apoiados).

Basta attender á forma como hoje se encara em economia social este problema tão complexo para se ver bem como tem sido absurdo o systema geralmente adoptado entre nos para o lançamento de novos impostos.

Por isso mesmo que esse criterio não se tem baseado num conhecimento rigoroso das razões que determinara o imposto e das consequencias que elle pode produzir, os seus resultados não podem deixar de ter sido contraditorios e funestos.

O imposto não se cobra apenas para. que o Estado gaste em seu proveito e em beneficio dos seus agentes e apaniguados uma parte da riqueza nacional, que a todos pertence, e que antes deve redundar em beneficio da communidade.

Igualmente o imposto não se pode considerar uma transacção em virtude da qual os Governos correspondam aos sacrificios dos contribuintes, organizando e mantendo serviços que possam equivaler integralmente ás quantias cobradas.

Finalmente, o imposto nem sequer se pode classificar como uma especie de premio de seguro por meio do qual os contribuintes adquiram uma garantia efficaz de que os seus direitos serão sempre acatados, de que não se produzirá o menor attentado contra as suas regalias individuaes, que tudo emfim venha a decorrer nos limites da mais rigorosa justiça.

E se assim é, se o imposto constitue uma formula tão imperfeita embora indispensavel, a que o Estado tem de recorrer para garantir a sua propria manutenção, que ao menos se procurem tirar d'elle algumas vantagens sociaes, que não seja apenas um instrumento de oppressão e extorsão, que constitua antes um correctivo para as grandes iniquidades, para os privilégios monstruosos que a sociedade mantém.

É esta a minha orientação sobre o assunto mas comprehendo bem que a camara a julgue demasiadamente avançada. Com prebendo bem que ella me não acompanhe nas minhas aspirações, as quaes n'este ponto como em tantos outros se confundum com as dos socialistas collectivistas, muito embora me tenha limitado a declarar republicano, por isso mesmo que julgo a solução do problema economico dependente da solução do problema politico e não supponho possivel a realização de quaesquer medidas de caracter social num país administrado da forma como Portugal o tem sido com o regime monarchico.

E longe de mim, Sr. Presidente, a ideia de impor a minha orientação pessoal nesta discussão do orçamento.

Quero mesmo admittir por um momento que o imposto deva exercer uma funcção exclusivamente fiscal, que não possa mesmo concorrer para a solução do problema social.

É esta, de resto, a opinião de muitos economistas. Mas ha um ponto em que tudos estão de acordo - é que o imposto, quando não seja justiceiro, deve ao menos ser justo, quando não corrija as iniquidades sociaes, deve ao menos não as aggravar, tornando ainda mais precarias as condições de vida das classes pobres.

Ora admittida mesmo esta orientação opportunista, eu affirmo que o imposto em Portugal não tem assentado em bases scientificas.

Ainda se não pensou neste país em subordinar a distribuição dos impostos á capacidade contribuitiva d'aquelles que teem de os pagar, adaptando-os ás suas condições individuaes.

Ainda se não pensou em que o sacrificio deve ser para todos equivalente, isto é, que os impostos devem ser lançados de maneira que depois da sua cobrança todos os contribuintes se mantenham nas mesmas condições relativas em que anteriormente se encontravam.

E precisamente o contrario do que succede entre nós.

Os grandes potentados politicos, os caciques e influentes eleitoraes, os que se sabem impor a todos os Governos depois de pagarem as suas contribuições continuam vivendo com o mesmo conforto e ostentando a mesma opulencia.

Pelo contrario, o pequeno proprietario, que não dispõe de influencia politica, ou o pequeno industrial, que não é ouvido nas altas regiões do poder, soffrem muitas vezes pelo simples facto do pagamento dos impostos um tal des-