1502 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
natureza, se s. exa. permitte, vou concedel-a ao sr. Marçal Pacheco.
O sr. Marçal Pacheco (para um requerimento): - Peço a v. exa. que consulte a camara sobre se consente que eu possa desde já responder ao sr. Ferreira de Almeida.
Vozes: - Falle, falle.
O sr. Presidente: - Tem s. exa. a palavra.
O sr. Marçal Pacheco: - O illustre deputado a quem vou responder começou por declarar que eu tinha proferido algumas palavras menos proprias do decoro parlamentar.
Não me faço cargo de responder a s. exa. n'este ponto, porque acaba de o fazer o nobre presidente d'esta camara com a auctoridade que lhe é propria, e é a elle, mais do que a nenhum de nós, que incumbe zelar a honra do parlamento. Mais ainda. Se eu tivesse proferido qualquer phrase menos digna, mais ou menos attentatoria da dignidade do parlamento, não teriam decorrido quatro ou cinco minutos sem que qualquer dos seus membros se levantasse a reclamar contra ella. A honra e o decoro parlamentar não são apanagio de nenhum membro d'esta casa. E todavia certo que ninguem reclamou. Ve, pois, o illustre deputado, a quem me estou referindo, que inteiramente é injusto, quando classifica de menos decorosa para o parlamento qualquer phrase por mim proferida. (Apoiados.}
Liquidado este ponto, passo, sem mais demora, a responder ao illustre deputado no ponto principal dos aggravos que viu, para a sua dignidade, n'algumas das phrases, por mim pronunciadas n'uma das sessões anteriores. Sr. presidente, se bem me lembro tenho dez annos de parlamento: tenho feito, não direi muitos discursos, mas algumas observações, repetidas vezes, n'esta casa e ainda até hoje não tive necessidade nem de explicar nem de retirar qualquer palavra que tivesse pronunciado. Isto prova - e dá-me o direito de o dizer - que fui sempre urbano com os meus collegas. (Apoiados.)
É hoje a primeira vez que acontece dar explicações das minhas palavras e, felizmente, posso dal-as completas e satisfactorias, sem alterar nem retirar, como não altero nem retiro, nem uma palavra, nem uma virgula do que proferi e está escripto. Não fica, pois, interrompida a linha do meu procedimento anterior.
O illustre deputado sentiu-se mais ou menos aggravado com algumas phrases que proferi. Mas isso prova a nimia susceptibilidade do illustre deputado, e nada mais.
S. exa. está no seu direito: cada um toma a peito o sen melindre pessoal segundo os seus sentimentos e segundo quer; é, porem, preciso ver o que e propiamente materia do direito e vontade de cada um e materia objectiva de offensa ou aggravo.
Sr. presidente, v. exa. sabe que quando na segunda feira eu entrava na camara - e nem ouvi fallar o sr. Ferreira de Almeida - me disseram que s. exa. só tinha associado a um requerimento do meu collega, o sr. Luiz José Dias, pedindo com urgencia os documentos indicados no requerimento que este illustre deputado primeiro fizera.
Não discuti nem discuto o direito que tem cada deputado de ser juiz da opportunidade de pedir quaesquer documentos. Cada qual trata as questões quando e como quer. Mas o que me causou reparos, e isto e objecto de uma apreciação critica que me pertence a mim, como a todos os meus collegas, foi a urgencia de documentos, cinco mezes depois da camara aberta. (Apoiados.)
Sobre este ponto fiz apreciações na alçada da minha critica, e no uso do meu direito.
Então disse eu, sr. presidente, «que n'estes termos e n'estas condições, a urgencia dos documentos parecia ter outro intuito que não fosse o de esclarecer a camara e o paiz ácerca d'esta questao».
Observa o illustre deputado «que não ha nem pode haver, por parte de qualquer membro d'esta casa, nenhum outro intuito que não seja o de esclarecer a camara e o paiz sobre os diversos assumptos que sejam submettidos ao seu exame».
Peço perdão para dizer que não é assim. Pergunto: O illustre deputado discutiu as reformas politicas? Esclareceu s. exa. a camara e o paiz ácerca d'este assumpto submettido ao exame do parlamento? O seu partido esclareceu a camara e o paiz sobre as reformas politicas? Não. Logo, s. exa. e o seu partido tiveram outro intuito que não foi o de esclarecer o paiz e a camara. Qual foi esse outro intuito? O intuito puramente politico, faccioso até, se quizerem, o intuito imposto pela disciplina, pela ordem de idéas e marcha do partido. É isto offensivo para alguem? (Apoiados.)
Não é, não o podia ser, nem para s. exa., nem para ninguem, tanto mais quanto eu disse nas minhas observações o seguinte: «Isto não é fazer injuria nem ter em menos consideração as intenções honradas dos illustres deputados», etc. V. exa. e a camara vêem, pois, que nas observações que fiz não tive outro intuito senão o de apreciar o pedido de urgencia feito pelos illustres deputados sob o ponto de vista puramente politico, sem intenção de maguar nem de ferir ninguem. Posso dizel-o alto e bom som, e tenho n'isso muitissimo prazer, porque se não fosse essa a minha intenção, tel-o-ia dito de outra férma e por outros termos, e não como está aqui escripto.
E peço a v. exa. e á camara que notem esta circumstancia. Eu não revi as notas tachygraphicas d'estas observações, e por conseguinte não alterei nem modifiquei o que lá estava.
O que disse não dava margem a susceptibilisar-se ninguem, e muito menos o illustre deputado que será o primeiro a dar testemunho de que, durante longos annos, conservei sempre as relações mais cordeaes com s. exa. S. exa. mais de uma vez me deu provas inestimaveis da consideração que tinha para commigo, e eu da consideração que tinha pelo illustre deputado. Por consequencia, havia de ser de um momento para o outro, sem se ter dado facto nenhum, nem publico, nem particular, que produzisse uma offensa grave, que viria provocar o meu collega no parlamento, dirigindo-lhe insinuações offensivas da sua dignidade? (Vozes: - Muito bem.)
Não faz sentido. (Apoiados.)
Quanto a outro periodo que s. exa. notou, tambem não tenho a menor duvida em mostrar-lhe a sua significação.
Esse periodo diz assim:
«É simplesmente dizer que eu, que sou deputado pelo Algarve, e que conheço este negocio, não tenho a menor duvida em discutil-o largamente com qualquer dos meus collegas, sendo isso mais proveitoso do que pretender, por meio de insinuações ou ameaças, fazer medo ao sr. ministro da marinha.»
Todos sabem a ordem de idéas a que me referi, porque todos sabem o que se tem dito lá fóra a proposito d'esta questão.
Disse, e digo-o ainda, que era e é melhor levantar no parlamento uma discussão larga de um e outro lado, dizer-se o que se julgasse conveniente e justo, do que andar lá por féra, nos jornaes, affirmando cousas tão extraordinarias, que não as quero nem devo repetir aqui.
Não disse que o illustre deputado as tinha affirmado, mas alludi ao que lá por fóra se passava. Tanto não me referi a s. exa. que estimei que o illustre deputado viesse pedir esclarecimentos e logo me associei a esse pedido.
Resumindo e concluindo, affirmo, em primeiro logar, que não proferi uma unica palavra que podesse ser attentatoria ou offensiva da dignidade e do decoro d'esta casa.
Dá-me a certeza disto o facto de v. exa. me não chamar á ordem, e o de não haver reclamado nenhum dos illustres membros d'esta casa que têem tanta dignidade como o illustre deputado. (Apoiados.)
Em segundo logar e quanto aos motivos especiaes que o