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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

ministro renovam as suas pretensões de longos annos. Este systema applica-se em Arganil com igual perfeição aos empregados de fazenda.

O delegado Palma chegou a Arganil, quando já era presidente do conselho o sr. marquez d'Avila, em 24 de dezembro; e a primeira cousa, que lhe apresentaram, foi um auto de investigação contra os dois empregados fiscaes por crimes por elles praticados.

O maior crime, que se imputava ao recebedor da comarca, era ter distrahido fundos para o escrivão de fazenda fazer um lagar. Posta a questão n'este terreno a primeira cousa, que o delegado do procurador regio fez, foi perguntar ao delegado do thesouro se o empregado estava em alcance. A resposta foi que o recebedor da comarca estava em dia com a fazenda, e então o delegado do procurador regio, em vista d'este documento e de depoimentos de testemunhas insuspeitas, desistiu de proceder criminalmente contra os denunciados.

Mas não o entendeu assim só o delegado do procurador regio. Este benemerito funccionario dirigiu-se ao procurador regio a dar-lhe parte do seu procedimento; esse officio não está aqui, porque não vieram todos os documentos que se pediram, mas nos documentos vem um que prova sufficientemente este facto, que é o officio do delegado de 20 de maio.

Leio á camara o documento d'onde se mostram as rasões por que o delegado deixou de querelar contra os denunciados e querelou contra os denunciantes.

É o seguinte:

«José Joaquim de Campos, escrivão e tabellião de um dos officios, e actualmente encarregado do terceiro, d'ante o juizo de direito da comarca de Arganil, por Sua Magestade Fidelissima, que Deus guarde, etc.

«Certifico que em meu poder e cartorio existem os autos de querela do ministerio publico, contra José Alves da Eufemia, da Cerdeira, por denuncia calumniosa contra o escrivão de fazenda d'este concelho, dada directamente por escripto por elle assignado ao administrador d'este mesmo concelho, e dos mesmos a fl. 73 se vê que em 8 de março ultimo, pelo doutor delegado foi requerida uma declaração do participante, ao que o juiz de direito deferiu por despacho de 9 do mesmo mez; e a fl. 88 se vê que o mesmo delegado em 23 do referido mez requereu se procedesse a corpo de delicto directo e indirecto contra o escrivão de fazenda, ao que o sobredito juiz, dr. João Vasco Ferreira Leão, deferiu no mesmo dia, procedendo-se ao corpo de delicto directo em 28 do sobredito mez, e ao indirecto em 26 de abril ultimo, não havendo querela contra o referido escrivão de fazenda.

«Mais certifico que a fl. 108 se acha a promoção do teor seguinte:

«Tendo José Alves da Eufemia, residente na Cerdeira, em 3 de janeiro do corrente anno, apresentado na administração d'este concelho de Arganil uma denuncia em que declarou á auctoridade administrativa que o escrivão de fazenda d'este concelho, Francisco Antonio Maria da Veiga, falsificava a matriz para collectar quem lhe aprazia, como aconteceu com elle denunciante, que na ultima distribuição dos gremios, não estando inscripto na matriz como tosquiador de animaes, appareceu collectado por exercer tal industria, e que o mesmo empregado, mancommunado com o recebedor da comarca, desviava dos cofres do estado avultadas sommas, já para uso seu, já para o de ambos, factos estes que são mencionados nos artigos 12.° e 13.° da sua denuncia, declaração esta que o dito Eufemia ratificou perante o juiz de direito d'esta comarca, como se vê a fl. 75 e seguintes d'estes autos, declarando ahi que fôra elle quem mandára escrever quanto se achava na denuncia, e que elle proprio apresentou ao administrador d'este concelho, e é a que se lê de fl. 2 a 4, sendo d'elle denunciante a assignatura da mesma, bem como que fôra elle quem apresentára os documentos que á mesma denuncia foram juntos, e que da verdade dos factos ali mencionados e sua prova tomava a responsabilidade, acrescentando que o documento a fl. 6 e 7 lhe fôra fornecido pelo bacharel João da Cunha Vasconcellos Delgado, residente na Cerdeira, o qual lhe declarára que tal carta lhe fôra a elle dirigida pelo escrivão de fazenda, sendo comtudo certo que o bacharel não é sacerdote como se mostra do seu depoimento a fl. 68 e seguintes d'estes autos, mostrando-se da mesma denuncia que ella se acha datada de 3 de janeiro do corrente anno, e assignada e reconhecida a assignatura em 2 do mesmo mez e anno, foi escripta posteriormente a ser assignada, mostrando-se mais do auto de exame directo, feito nas matrizes e cadernos das sessões das juntas de repartidores da contribuição industrial, que a falsificação mencionada no artigo 12.° da denuncia ou qualquer outra, não existia, mostrando-se pelo contrario que o denunciante se achava na mesma matriz inscripto como exercendo a industria de tosquiador de animaes, classificação de que não reclamou, por cuja rasão se não acha constatado o facto da falsificação de que o mencionado escrivão de fazenda é, pelo denunciante, accusado; verificando-se por isso que tal declaração feita tanto á auctoridade administrativa como á judicial é falsa, e por todas as circumstancias mencionadas, que alem de falsa é calumniosa, e só feita com o fim de encommodar e desacreditar similhante empregado.

«Sendo tambem certo que os desvios dos fundos publicos dos cofres do estado só se podem verificar por meio de um balanço dado na recebedoria da comarca, sem o qual não póde por tal motivo haver procedimento judicial, visto que a base d'este é á conta corrente do alcance, e constando do officio do delegado do thesouro do districto, que agora junto por certidão, que o referido recebedor não tem alcance algum para com a fazenda, e portanto se mostra que não houve extravio de fundos da parte d'este, e muito menos do escrivão de fazenda, que não tem a seu cargo a conservação e guarda de dinheiros publicos; o que igualmente se mostra dos depoimentos das testemunhas inquiridas, pois que a unica que em extravio falla, não affirma tal facto, e apenas se refere ao actual escrivão da camara Francisco Garcia de Carvalho, como o fazem as demais inquiridas no auto de investigação, o qual escrivão nega dissesse o que a testemunha padre José Joaquim Marques de Oliveira affirmára quando inquirido pelo administrador do concelho, e já não affirma no corpo de delicto, o que torna de maior importancia o depoimento do referido escrivão da camara, negando as demais testemunhas inquiridas, e todas de reconhecida probidade, a existencia do crime de que trata o artigo 13.° da mencionada denuncia.

«Em vista pois da declaração do delegado do thesouro e depoimento das testemunhas inquiridas, é fóra de duvida que a accusação feita no citado artigo 13.° é calumniosa, e a participação dada pelo denunciante ao administrador do concelho e rectificada n'este juizo, é falsa.

«Mostra-se portanto que não se tendo constatado algum dos dois unicos factos, de que o poder judicial podia e devia tomar conhecimento, e antes pela fórma da denuncia e differentes circumstancias apontadas, se verificou a má vontade que o denunciante tem ao denunciado, é evidente que José Alves da Eufemia, residente na Cerdeira, fazendo a participação que se lê a fl. e que ratificou pelo auto de fl. denunciou calumniosa e directamente á auctoridade publica, que o dito escrivão de fazenda Francisco Antonio Maria da Veiga havia praticado os crimes constantes da denuncia por elle assignada e mencionada nos artigos 12.° e 13.°; e porque tal facto seja um crime publico, previsto e punido pelos artigos 242.° e 245.° do codigo penal, requeiro que, julgado com relação a tal facto, constituido com estes autos o corpo de delicto, se me tome querela contra o dito José Alves da Eufemia, e contra quem mais do summario se mostrar auctor ou cumplice no referido crime.

«Protesto nomear no auto as testemunhas a inquirir no summario.