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Discurso do Sr. C. de Lavradio, que se não consignou na Sessão de 15 da corrente pela razão ahi apontada, e devia ter logar a pag. 202, col. 1.ª; discurso a que respondeu o Sr. C. de Thomar a pag. dita.

O Sr. C. de Lavradio — Sr. Presidente, mais de metade do tempo marcado pela lei fundamental para a duração das nossas Sessões Ordinarias, está já passado; e forçoso é dize-lo, até agora ainda não tractámos de negocio nenhum de utilidade nacional. Parece-me, Sr. Presidente, que era já tempo de acabar com os duestos; e parece-me, Sr. Presidente, que era tempo de nos occuparmos seriamente dos graves negocios desta desgraçadissima Nação: é para este fim, Sr. Presidente, que estamos neste logar.

Persuadido desta verdade, Sr. Presidente, e convencido tambem de que a primeira vez, que tive a honra de fallar nesta discussão, tinha dito quanto era sufficiente para provar, senão o acerto de todos os actos praticados pela administração, a que tive a honra de pertencer, ao menos a lealdade e boa fé dos individuos que a tinham formado; estava resolvido a não pedir a palavra, para não complicar esta discussão, porque não a quero tornar mais longa. Mas, Sr. Presidente, eu invoco o testimunho todo da Camara, fui provocado, lançaram-me a luva, e eu não seria cavalheiro se a não levantasse.

Tres D. Pares me combateram: os dois primeiros, os Srs. C. do Tojal, e Gomes de Castro, justiça é dize-lo, combateram-me com vigor, mas com muita urbanidade e extrema polidez, honra lhes seja feita. Estimo dar-lhes este testimunho da minha consideração e dar-lh'o em publico; porém poderei eu dizer o mesmo do terceiro D. Par que me combateu? Não por certo; e eu não serei injusto dizendo, que se S. Ex.ª no seu primeiro discurso foi violento, no segundo foi provocador. Não o imitarei; mas procurarei ser fortiter in rê suaviter in modo.

Sr. Presidente, o segundo discurso do D. Par, foi verdadeiramente uma repetição de todas as accusações, quantas S. Ex.ª tinha feito no seu primeiro discurso, com o augmento de um grande numero de expressões provocadoras, como eu disse.

A parte deste discurso já respondeu o meu nobre amigo o Sr. Rodrigo da Fonseca Magalhães, com uma força e uma eloquencia, que seria grande presumpção pertender iguala-lo. S. Ex.ª defendeu, e com grandissima imparcialidade (porque não deixou de notar os erros que commetteu), a administração a que pertencia. Em meu nome, e posso dizer que em nome da administração toda, eu lhe agradeço o modo pelo qual S. Ex.ª nos defendeu; mas direi, que S. Ex.ª até certo ponto estava obrigado a tomar esta defeza, porque ninguem melhor do que elle conhecia a pureza das intenções daquella administração (apoiados). S. Ex.ª não foi membro daquella administração, mas prestou-lhe um constante decidido, e sempre desinteressando apoio; S. Ex.ª assistiu a um grande numero, senão a todas, das nossas mais importantes deliberações: S. Ex.ª estava pois habilitado para nos defender, e tinha mesmo rigoroso dever de o fazer. Portanto, Sr. Presidente, se eu quizera repetir no meu estylo humilde e rasteiro, o que S. Ex.ª disse, não faria senão diminuir a impressão, que sobre esta Camara haviam produzido as palavras de S. Ex.ª, ditas em uma linguagem que faria inveja aos nossos melhores classicos. Mas vamos ao objecto do discurso.

O D. Par o Sr. C. de Thomar, começou logo por uma forte accusação contra mim, dizendo — o Sr. C. de Lavradio apresentou o programma da união da familia portugueza, e mostrou logo que não era sincero, mostrou que não queria observar o tal programma. (O Sr. C. de Thomar — As obras não correspondem ás palavras.) Esta accusação foi na verdade grande! Mas, Sr. Presidente, será verdade que eu não quiz aquillo que todos os bons portuguezes devem querer, e que venho ainda enganar esta Camara, exprimindo desejos e sentimentos, que não tenho? Não: eu fui sincero. Mas vejamos, Sr. Presidente, como e que eu entendo que se póde obter a união da familia portugueza, e como é que o D. Par a pretende obter. Eu entendo, que para se conseguir esta união da familia portugueza, é necessario, primeiro que tudo, que ella se faça sem humiliação, não digo só dos partidos, mas nem ainda dos individuos (apoiados); porque, só assim é que ella póde ser solida; e não quero que haja, como na antiga Suissa, cantões soberanos, e cantões vassallos. Mas como á que o D. Par pretende obter a união da familia portugueza? É pela subserviencia de todos os partidos ao seu. (O Sr. C. de Thomar — Eu não disse isso.) V. Ex.ª interpretou, como quiz, o que eu disse: seja-me tambem licito interpretar as palavras pelas obras. (O Sr. V. de Fonte Arcada — Apoiado.) O D. Par quer subserviencia para o partido a que pertence; e como se apresenta como symbolo desse partido, quer a subserviencia á sua pessoa.

Eis aqui pois a grande differença que ha entre mim e o D. Par. Eu quero que esta consiliação se faça pelo reconhecimento da igualdade dos direitos de todos os portuguezes, e S. Ex.ª quer que o haja pela submissão a um partido, a cujo partido quer se reconheçam direitos superiores aos do outro.

Mas, Sr. Presidente, e sem duvida, que os homens influentes nos partidos, são os que mais podem concorrer para essa união: prestem pois este grandissimo serviço ao Paiz, e o Governo rebata as paixões dos partidos, concilios todos, e sobre tudo seja justo para todos: eu não peço mais nada (apoiados). Renunciando a esse terrivel principio do exclusivismo, considere para os empregos só estas duas qualidades — capacidade e moralidade — não pergunte ao individuo donde vem (O Sr. C de Thomar — Apoiado), mas sim para que serve. Siga o Governo este systema, e facilmente, conseguirá a união de toda a familia portugueza. Renovo pois solemne e cordealmente o protesto, de que eu desejo como aquelles que mais a desejam, aquella união, e estou prompto a fazer todo o sacrificio de amor proprio, e até daria a propria vida se della dependesse a mesma união, tal é a importancia que eu dou ao conseguimento de tão desejado bem!

Disse depois S. Ex.ª que era para sentir que eu, e o D. Par que se assenta ao meu lado esquerdo, não nos tivessemos combinado sobre as causas da revolução; e que ainda mais notavel era, que eu me não tivesse combinado comigo mesmo. Quanto á primeira parte teve razão o D, Par, e invoco o testemunho de S. Ex.ª o Sr. Fonseca Magalhães, para que diga se nós nos combinamos: cada um veio aqui dizer os seus sentimentos, conduzido pelo conhecimento dos factos. Creio comtudo, que sem nos havermos combinado em particular, não houve notavel divergencia nas nossas opiniões, havendo só differença na superioridade do talento do meu amigo. Enganou-se o D. Par quando disse, que eu havia attribuido a tal ou tal Lei a revolução do Minho; porque eu estou persuadido, como sempre o estive, de que não foi uma unica causa a que deu motivo aquelle acontecimento, mas sim o complexo de muitas causas; e permitta-me S. Ex.ª que, sem de nenhum modo o querer offender, lhe diga e aos seus illustres collegas, que a verdadeira causa da revolução, foi a serie d'erros commettidos desde 10 de Fevereiro de 1842 até 20 de Maio de 1846: foi esta serie d'erros que eu combati, sem proveito algum, durante o espaço de quatro annos, com o fim d'evitar uma revolução; e agora chamam-me revolucionario!! Revolucionario eu! Não o sou: não só contraria os meus principios esse caracter, mas tenho a maior inhabilidade para o desempenhar. Por ventura serei revolucionario, por haver advertido durante quatro annos essa Administração, de que seguia um caminho errado? E não foram as Leis que eu mais combati, aquellas que mais apressaram a revolução?! Mas eu não quero, Sr. Presidente voltar atraz; já tractei desta materia; e se agora tractasse della outra vez, talvez fosse excitar mais as paixões, o que desejo evitar, e o que está dito está dito; isto é — que a causa verdadeira da revolução, foi a serie de erros commettidos pela Administração dos quatro annos. (O Sr. C. de Thomar — As arguições não foram pelo que disse como D. Par, foi pelo que fez como Ministro.) Pelo que fiz como Ministro é que fui revolucionario?!.. (O Sr. C. de Thomar — Sim Sr.) Pois bem. As notas que eu tomei são de certo muito numerosas, e por conseguinte, senão responder a todas as arguições que V. Ex.ª me fez, peço-lhe que me advirta.

Fez o D. Par varias observações, para provar os bens que a sua Administração havia feito a este Paiz, e chegou até a ter a leviandade de se querer comparar com o grande estadista, o M. de Pombal!... Os bens que e te grande homem fez, ainda hoje se sentem, e todos os reconhecem; mas poderá dizer-se o mesmo da Administração de S. Ex.ª? Eu nella só vejo erros.

Disse S. Ex.ª, que o commercio, a agricultura, e até a moralidade, tinham feito grande progresso durante a sua Administração; e accrescentou mais (o que eu ouvi com espanto!) — nunca o giro commercial teve tão grande acção, como naquella época — e eu assim que sahi desta Casa dirigi-me logo a alguns negociantes, perguntei-lhes pelo estado do commercio naquelle tempo, e todos elles me disseram o contrario daquillo que o D. Par aqui nos asseverou: eis aqui no que ficou o grande progresso e giro commercial!... Disse mais — que a agricultura havia prosperado de uma maneira incrivel — e eu confesso que esta asserção ainda mais me espantou! e perguntarei aos D. Pares presentes, que todos, ou quasi todos são proprietarios, se a agricultura naquella época teve esse immenso progresso. Mas S. Ex.ª não contente ainda com isto, disse-nos — e não só a agricultura prosperava tão rapidamente, mas até nunca o agricultor tinha tido com tanta facilidade o dinheiro necessario para os seus trabalhos. O contrario disto devia dizer o D. Par. Desgraçado daquelle que recorria a um emprestimo, porque ficava inteiramente perdido: o D. Par, tinha a fortuna de ser proprietario e capitalista, e por isso não conheceu os soffrimentos da agricultura naquella época; mas o pobre lavrador que não era capitalista, não achou esse bem; e em prova do que digo, appello para o testimunho dos D. Pares proprietarios que estão presentes. (O Sr. C. de Thomar — Mas é que os factos são contra.) Serão na opinião de V. Ex.ª Mas vamos á moralidade.

Quaes foram os argumentos, que S. Ex.ª apresentou para provar o augmento dessa moralidade? Essas statisticas nada provam, e sobre tudo n'um Paiz, onde eu já disse, o crime se tem conservado tantas vezes impune. Essas statisticas, Sr. Presidente, mesmo nos paizes mais civilisados do que o nosso, são quasi sempre inexactas: com tudo podem servir para sobre ellas se formar algum juizo, e dellas me tenho servido muitas vezes; mas das nossas nunca me servi porque reconheço o seu pouco credito. Ora perguntando eu ao D. Par, o que a favor da educação e instrucção religiosa fizera a Administração, a que S. Ex.ª pertencera, respondeu-me o D. Par — e que fez a Administração de Maio? — Oh! Sr. Presidente, pois uma Administração era quatro annos de paz não póde fazer cousa nenhuma, e queria S. Ex.ª que outra Administração á quatro mezes de anarchia, tivesse feito alguma cousa, quando essa Administração sem meios, apenas tinha tempo para tractar de acabar a anarchia, o que conseguiu, e no que, creio eu, não fez pouco! Mas appello para o nosso Presidente: V. Em.ª póde dizer, quaes eram os sentimentos em que eu estava, bem como os outros Membros da Administração, sentimentos que tive a honra de communicar a V. Em.ª a primeira vez, que lhe fallei depois de ser Ministro.

O D. Par apresentou tambem, entre outros beneficios feitos ao Paiz, a Reforma Judiciaria; e eu, Sr. Presidente, tenho sempre ouvido dizer a todos os Jurisconsultos deste Paiz, que uma das nossas primeiras necessidades, é reformar essa Reforma Judiciaria! Em quanto a mim confesso, que não sou Juiz competente para o poder avaliar; mas ingenuamente digo, que ainda não ouvi fazer a um unico Jurisconsulto o elogio da Reforma Judiciaria! Pelo que respeita a uma parte della, que é a Tabella, já eu consegui que se lhe fizesse uma reforma; mas presentemente lá appareceu na Camara dos Srs. Deputados uma proposta, para a reforma da reforma daquella Tabella, sem duvida bem oppressiva para os Povos. Vamos a outra arguição.

Tornou ainda o mesmo D. Par a caracterisar a Administração presidida pelo Sr. D. de Palmella, como uma Administração revolucionaria, e dando-lhe outros epithetos. Chamou-lhe revolucionaria, sem querer considerar qual era então o estado do Paiz, nem a missão dessa mesma Administração, á qual eu chamarei ante-revolucionaria (apoiados). Apresentarei pois alguns documentos daquelle tempo, a fim de provar por documentos de homens, que não podem ser suspeitos, qual era a opinião que elles formavam do estado do Paiz; e entre outros citarei um de certo cavalheiro notavel pelo seu honrado caracter, e pelo seu valor como militar; e creio que os seus illustres camaradas aqui presentes, me apoiarão todos nesta parte: é um documento do Sr. C. de Vinhaes (então V. de Vinhaes), e veremos qual era o juizo que S. Ex.ª formava então do estado do Paiz. Eis-aqui a proclamação que elle fez, e não lerei toda para abreviar um pouco mais. (Leu o § 3.º daquella Proclamação, inserta no Periodico Revolução de Setembro de 6 de Junho de 1846 n.º 1519. pag. 2, col. 3.ª) Segue-se uma representação feita por S. Ex.ª mesmo, á qual se deve dar muitissimo pezo. (Leu-a: está inserida no citado Periodico n.º dito, e pag. ditas). E eu tambem advertia o Governo sobre todos estes pontos, mas elle surdo ás minhas supplicas não queria conhecer a verdade, nem os seus erros.

Não era Soajo que se levantava, eram todas as Provincias, como dizia este honrado e valente General, que clamava havia muito tempo, e como Authoridade se dirigio ao Governo pedindo-lhe remedio para tão grandes males, e queixando-se de que as suas supplicas não tivessem sido ouvidas. Eis-aqui a representação que elle diz ser justa e verdadeira: é a representação feita pelos habitantes de Chaves. (Leu-a: está inserida no citado Periodico, n.º dito, pag. 3.ª, col. 1.ª) Havia direito de petição?.. Aonde estava elle? E de que serve o direito de petição sem o cumprimento do dever de deferir? Que significa um sem outro? Um escarneo. (O Sr. Conde de Thomar — Ha muitas representações como essa.) Mas eu li esta, por ser de um General notavel pelo seu valor, e honrado caracter, o qual não duvida dizer aos Povos que elles tem razão.

Li aquelle documento e podia lêr seiscentos daquella natureza, isto é, Representações de todas as partes do Reino, cujas Representações se devem encontrar na Secretaria d'Estado, em todas queixando-se os Povos das vexações que soffriam, e do miseravel estado do Paiz. Foi nestas circumstancias, Sr. Presidente, que aquella Administração declarou não poder continuar a reger os negocios publicos, e eis aqui está um documento mesmo do Sr. C. de Thomar que o próva. (Leu no já citado Periodico do 1.º de Junho de 1846, n.º 1514, pag. 2, col. 2.ª transcripto do Periodico Espanhol El Commercio, a declaração dos Srs.

C. de Thomar, e J. B. da Costa Cabral, sómente o § 1.°, e do 2.° o primeiro periodo). Este documento é assignado por S. Ex.ª o Sr. C. de Thomar, e por elle se vê, que o nobre D. da Terceira confessava o mesmo, que dizia o nobre C. de Vinhaes. Foi neste estado de completa desordem e anarchia, consequencia das medidas tomadas, como já disse, por aquella Administração; que se formou a Administração de Maio, Administração chamada revolucionaria, posto que nenhuma parte tomasse na revolução! bem longe disso, os membros que a composeram, uns nesta Camara, e outros na dos Srs. Deputados, bastantes vezes tinham advertido o Governo anterior, do abysmo em que parecia elles quererem lançar-se. Como?! revolucionarios aquelles que queriam evitar a revolução?! aquelles que tiveram a dedicação de querer impedir-lhe a marcha, embora ella os esmagasse e passasse por cima de seus corpos?!...

Dos homens que entraram no Ministerio de Maio, Sr. Presidente, nenhum entrou por vontade, todos foram violentados; e eu vejo aqui um D. Par, que sabe muito bem a violencia com que eu entrei (O Sr. Barão de Chancelleiros — Apoiado); mas se entrei, não foi por ambição do poder, Sr. Presidente, porque eu já tenho dado provas de que não a tenho, nem julgo que o poder neste Paiz, mormente em certas circumstancias, excite a ambição (apoiados); e posso dizer com verdade, que já por mais d’uma vez, na minha carreira publica, regeitei entrar no Ministerio; e que tendo sido chamado por Sua Magestade para formar uma Administração, eu respondi que reconhecia para tal encargo a minha incapacidade, e não era o homem que para elle convinha. Torno a repetir, visto que o D. Par repetio as suas accusações — o primeiro pensamento da Administração de Maio, aquelle que a dominava, era o restabelecimento completo da ordem no Paiz, para depois tractar da sua organisação. Quando depois se formou a Administração, não se reconhecia nem Lei Fundamental, nem Lei alguma; o Paiz representava uma federação mal organisada; pequena divisão de territorio tinha a sua Junta Governativa; e consta-me que até o Bairro de Belem projectara formar uma Junta Governativa independente de Lisboa. Neste estado de cousas já se vê, que o primeiro dever do Governo era o restabelecimento da ordem, e a salvação do Estado. Repito o que já confessei — a Administração de Maio foi uma Dictadura necessaria, cuja missão era a prompta restituição da ordem, e conseguindo este grande fim, o dever dos que propozeram aquella Dictadura, era apresentarem-se com seus actos na mão perante a Representação nacional, para esta resolver se mereciam elogio ou condemnação; e eu ainda me julgo debaixo do pezo da responsabilidade que contrahi, e aqui estou para responder, me hic adsum; submetter-me-hei á sentença desta Camara, qualquer que ella fôr; irei para onde quer que ella me mande, ou seja para os desertos de Africa, ou para a prisão; mas irei com uma grande consolação, qual é a da tranquilidade da minha consciencia, que me diz — que se errei, ao menos foi desejando o bem.

Considerou-se pois o Governo Dictador, e então julgou que não só podia, mas devia fazer tudo que lhe parecesse necessario para conseguir seu grande fim, que era a restituição da ordem. Tomou um grande numero de medidas: praticou actos a que o não authorisavam as leis vigentes, algum, ou alguns mesmo contra as disposições da Carta Constitucional; mas bastava haver-se arrogado as attribuições do Poder Legislativo (se a necessidade se não provasse), para haver commettido o maior attentado, como já muito bem notou o D. Par que se senta ao meu lado: disse muito bem, que nada havia de mais contrario á Carta do que legislar o Governo sobre qualquer materia. (O Sr. Fonseca Magalhães — Apoiado) Legislar o Poder Executivo é sem duvida atacar a Carta Constitucional na sua essencia. (O Sr. C. de Bomfim — Apoiado.) Mas o Ministerio de Maio legislou? Sim senhor, e nenhuma desculpa teria de haver commettido tão grande attentado, se não fosse a assas provada necessidade: reconheço porém, que esses que praticaram aquelles actos são responsaveis; e reconheço mais, que ao Dictador não é licito praticar acto algum extra-legal, cuja necessidade se não possa provar (apoiados). (O Sr. Fonseca Magalhães — Muito bem. Muito bem). E por isso digo: aqui estou para responder por todos os meus. Parecia-me que depois da exposição do estado do Paiz; depois desta confissão que já antes havia feito; não tornaria o Orador a renovar as suas accusações: todavia o D. Par tomou ainda a descer, não só a accusações geraes, mas tambem ás especiaes. Entre outros actos da Administração de Maio S. Ex.ª novamente stigmatisou o Decreto de 3 de Agosto de 1846; e com effeito, de ninguem esperava eu menos esta censura do que do D. Par, que foi o author do Decreto do 1.° de Agosto de 1844, publicado quando o Paiz gosava de tranquillidade, e o Governo se não achava revestido do Poder Dictatorial, Decreto do qual o D. Par fez, com já provei, um largo uso, ainda antes de haver elle sido approvado pelas Côrtes. Parecia-me pois, que era o D. Par o unico que não devia censurar o Decreto de 3 de Agosto de 1846, Decreto que eu confesso, tive grande difficuldade em approvar: direi mais, que quando elle foi pela primeira vez apresentado em Conselho de Ministros, votei formalmente contra elle; mas taes foram as representações das authoridades competentes, taes as provas que me apresentaram os Srs. Ministros do Reino e da Justiça, que eu me convenci da necessidade temporaria daquelle Decreto, para evitar que os povos continuassem o estar sem Juizes, que lhes administrassem justiça. E note-se mais, que a duração daquelle Decreto era limitada á das extraordinarias circumstancias, em que estava o Paiz, e as suas disposições não atacavam a independencia do Poder Judicial. Tambem não é exacto o que o D. Par disse, a respeito da disposição relativa ás transferencia dos Juizes. Não foi, como S. Ex.ª disse, para acommodar os homens da situação, que se estabeleceu aquella disposição, e isto facilmente se poderá verificar á vista das remoções feitas.

Quanto á accusação que o D. Par renovou sobre o abuso, que a Administração de Maio fez do poder dimissorio, sabe S. Ex.ª, que tem de certo esquadrinhado a minha vida publica, que eu não dimitti nenhum individuo do corpo diplomatico, nem do consular, nem, creio eu, da Repartição dos Correios. (O Sr. C. de Thomar — Só meu irmão do logar de Correio.) Nem esse mesmo me parece que dimitti; e confesso com sinceridade que não me lembro de ter assignado tal dimissão. Posso pois segurar ao D. Par e á Camara, que eu não pratiquei nenhum acto arbitrario: se acaso dimitti algum empregado da Repartição dos Correios, do que me não lembro, foi em presença das informações dos chefes das Repartições, e authoridades competentes. (O Sr. C. de Thomar — Eu declaro ao D. Par, que a accusação que eu fiz não foi especial, mas á parte que S. Ex.ª teve nessa Administração, porque o Ministerio era solidario, o D. Par pertenceu a elle, e por isso lhe cabe a responsabilidade.) Continuarei dizendo, Sr. Presidente, que quando fui por Sua Magestade encarregado da Repartição dos Negocios Estrangeiros, tractei de attender aos direitos de todos os empregados, meus