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quez de Vallada, embora nas melhores intenções; mas como entendo que cumpre á cordura e moderação d'esta camara. Respeitando a liberdade de pensar e discutir dos dignos membros d'esta casa, e os meios de opposição de que cada um póde servir-se, e de que com talento e habilidade se serve muitas vezes o digno par, parece-me todavia que ha occasiões solemnes para os altos poderes do estado, em que é talvez incurial e inconveniente fazer das interpellações ao governo actos de aggressão e recorrer á acrimonia, ás personalidades e á opposição acalorada. Ha occasiões solemnes na vida dos governos livres em que é mister, é indispensavel que a representação nacional se agrupe em volta do poder executivo, e em que as opposições fazendo treguas dêem força aos principios de ordem, sem os quaes não póde existir a verdadeira liberdade.

Eu, sr. presidente, não acompanho o digno par nos seus receios das associações secretas, e muito principalmente quando esse segredo nominal se torna do dominio do publico. Eu não tenho medo das sociedades secretas, não tenho medo de reacções ou excessos politicos, emquanto tivermos a uma, emquanto tivermos os parlamentos, emquanto tivermos a imprensa, emquanto estivermos na fruição de todas as garantias da liberdade. O que porém não posso approvar é que essas associações se afastem do caminho constitucional e legal para conseguir os seus fins. Essas associações têem feito grandes serviços á emancipação dos povos nos tempos da oppressão e do absolutismo. Ellas são porém uma contradicção, uma excrecencia, quando se apoiam no segredo e no mysterio, no meio de um povo livre.

Eu, sr. presidente, nunca pertenci a ellas, nem desejo pertencer. Mas se um dia voltasse o despotismo á nossa boa terra, o que Deus afaste, eu folgaria de ser dos primeiros a inscrever-me nos seus registos. Se o governo tem sido tolerante para com ellas, não o crimino por isso. O que lamento é que sejam trazidas para esta casa, quando umas são inofensivas, e inuteis, quando outras devem estar abaixo da discussão. E por iguaes rasões que não julgo conveniente trazer tambem para esta camara 'a imprensa periodica, e discuti-la aqui. Façamos e discutamos aqui boas leis para o paiz. E ás questões e aggressões da imprensa responda-se pela mesma imprensa, já que a temos livre, e não confundamos os campos que têem regras e combatentes diversos.

Estabelecidos estes principios, sr. presidente, e pondo de parte toda a idéa de opposição ou censura, pergunto ao governo se deu as providencias necessarias, como supponho que daria, para que a ordem publica não fosse alterada, e se tem a força sufficiente para reprimir quaesquer attentados contra ella.

É esta, como já disse, a occasião solemne em que todos os partidos devem reunir-se em volta do governo e das instituições, para que estas permaneçam intactas, para que aquelle revestido de força se mantenha na altura da sua dignidade. Estes acontecimentos irregulares, estas reuniões illegaes, estes ajuntamentos e discursos nas ruas e nas praças são meios contrarios aos que a carta e as leis facultam ao cidadão para enunciar as suas opiniões, para propagar as suas doutrinas, para fazer os seus requerimentos, para pedir a sua justiça. As reformas fazem-se nos parlamentos e discutem-se na imprensa. Os requerimentos fazem-se aos poderes responsaveis do estado, e fazem-se pelo caminho legal. As garantias não estão suspensas. Estamos no pleno uso das nossas liberdades; não abusemos dellas.

Dou por terminadas as minhas observações sobre este objecto. Ellas foram prevenidas em parte pelo digno par, O sr. visconde de Algés, a quem coube mais cedo a palavra. Não quiz porém eximir-me de dizer a minha opinião, e de fazer ao governo, com toda a cordura e moderação, que me parece estar na mente d'esta camara, aquellas duas perguntas já formuladas: = Deu o governo as providencias necessarias para manter a ordem? Tem porventura força para continuar a faze-lo? =Os meus desejos, e parece-me que os de toda a camara, são dar-lhe esta força, é auxilia-lo com quaesquer medidas legislativas de que se careça para segurança da liberdade e das instituições.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Disse que agradecia ao digno par a maneira polida e delicada com que lhe dirigiu as suas perguntas, e responde muito categoricamente, que o governo, antes da reunião, tinha quasi a certeza de que resultaria alguma cousa de mais; e por isso deu as ordens mais terminantes para que se se tentasse de qualquer modo perturbar a ordem, ou os grupos tomassem qualquer direcção, não lhes fosse isso permittido. Em virtude d'essas ordens o Sr. governador civil, apenas lhe constou que os grupos se dirigiam para um outro sitio, seguiu-os e intimou-lhes que se dispersassem. S. ex.ª ia seguido por uma força da guarda municipal, de que felizmente não foi preciso usar porque os grupos obedeceram logo. Que assim podia ver o digno par que o governo empregou os meios que tinha á sua disposição, e que tem a consciencia de que havia de poder manter a ordem, se por ventura se tentasse altera-la.

O sr. Marquez de Niza: — Disse que na sessão de 23 do mez passado, dirigira-se ao sr. ministro do reino, pedindo a s. ex.ª que conviesse em que a interpellação que tinha annunciado na anterior sessão podesse ter logar na immediata; ao que s. ex.ª, com toda a urbanidade, respondeu que estava prompto até n'esse mesmo momento para responder; e conveiu-se a final que ficasse ella para a sessão seguinte, por ter elle, orador, declarado que não tinha trazido as notas.

A primeira sessão a que póde assistir depois d'esta, por ter adoecido, o que o digno par o sr. conde de Mello lhe fez o favor de participar á camara, foi no sabbado; mas quando entrou na camara já tinha começado a ordem do dia, e a sessão acabou pelo doloroso acontecimento que poz em risco a vida de um respeitavel collega. Que poderia hoje verificar-se a interpellação, mas não lhe parece conveniente faze-lo, porque ha objectos de mais interesse a considerar actualmente; mas não quiz deixar de fazer esta declaração, por saber que alguem tem supposto que elle, orador, tinha prescindido de fazer a interpellação e de sustentar o objecto que se propõe tratar.

Se o sr. ministro do reino convem em que a interpellação se verifique depois de terminado o objecto pendente, seria muito conveniente. (O sr. Ministro do Reino: — Não tenho a menor duvida, mas desejarei ser avisado para poder vir munido dos papeis necessarios). O orador deu-se por satisfeito com a resposta do sr. ministro.

O sr. Marquez de Vallada: — Antes de responder ao sr. presidente do conselho, quer fazer algumas reflexões sobre o que acabou de dizer o sr. visconde de Gouveia. S. ex.ª ha de permittir que lhe diga que aceita o seu discurso como lição, como codigo de preceitos, e como commentario. Como commentario, porque s. ex.ª tem o direito de faze-los a todos os discursos; como codigo de preceitos, porque com alguns que s. ex.ª apresentou concorda o orador ainda que não com todos; e como lição, tem por força de admitti-la, porque s. ex.ª mostrou censura-lo no modo como tinha pedido explicações ao sr. presidente do conselho, e porque elle orador, tambem censurara o mesmo sr. visconde quando aqui se tratou de um processo em que s. ex.ª se mostrou muito empenhado, e se retirou antes de estar concluido. S. ex.ª censurou-o hoje a elle, que o censurara n'outra occasião: estamos pagos.

Não podendo deixar de respeitar em s. ex.ª a sciencia juridica, que por todos é reconhecida, se bem que esta camara já combateu a s. ex.ª; e reconhecendo que s. ex.ª é muito competente, do que folga de lhe dar este testemunho de reconhecimento e homenagem, nem por isso deixará de fazer ligeiras considerações. S. ex.ª disse, e o orador confessa não perceber para o que, que as sociedades secretas o não amedrontam; tambem o orador não tem medo dellas, entretanto, quer se assustem quem não com ellas, o orador tem direito de chamar a attenção do governo, e de a chamar em termos fortes e energicos, quando entende que o governo não cumpre o seu dever. Disse que o digno par já declarou que as sociedades secretas prestaram serviços n'outras epochas, e tambem que se corressem perigo as liberdades patrias, não teria duvida em se unir a ellas; declarações que lhe excitavam as seguintes observações.

Se aquellas sociedades são boas, como querem dizer, deviam todos desejar tomar parte nellas, principalmente sendo de beneficencia, como dizem, porque todos desejam praticar actos de beneficencia: e porque é que não é assim?...

O direito que tem todos os dignos pares de chamar a attenção do governo sobre estes negocios, é incontestavel; mas na actualidade quando não é elle só que o faz, porque já o seu nobre amigo o sr. conde do Sobral o precedeu, não sabe como lhe póde ser extranhado o exercicio de um direito, que muitos outros dignos pares têem exercido, e que o regulamento d'esta casa não prohibe. Ha de portanto continuar a usar tanto d'esse como de todos os direitos que lhe competem, embora o sr. visconde de Gouveia por não receiar as sociedades secretas, e o governo por não cumprir a lei, o levem a mal. Este embraveceu-se contra uma sociedade inoffensiva, e fulminou-a com o fundamento de que não está em conformidade com as leis; mas desde que começou a querer applicar as leis contra umas, é necessario que a applique contra todas: quem não gosta, que tenha paciencia.

Como esta questão se ha de tratar mais de espaço n'outra occasião, espera que terá o sr. visconde de Gouveia ao seu lado para o illustrar e ensinar, porque está resolvido a receber as lições de s. ex.ª n'esta parte politica, e em todas as materias em que tem tanta proficiencia.

Dirigindo-se ao sr. presidente do conselho, disse que, quando o governo cumprir as leis, e se mostrar forte com justiça, não terá duvida em apoia-lo; mas, como tem visto que o governo só tem mostrado brandura a um certo partido, que não ha duvida nenhuma que é revolucionario, porque essa associação, como o governo acaba de dizer, não tem estatutos, e o governo não sabe quaes são os seus fins... (O sr. Presidente do Conselho: — A associação requereu a approvação de uns estatutos, que mandou para o governo civil.) Ainda os não tem, e por consequencia ao governo compete vigiar para que a ordem publica não seja alterada em resultado dos manejos de gente que quer para si um direito e outro para os outros. Foi este o ponto em que tocou; e estima muito que o sr. presidente do conselho fizesse hoje uma paraphrase da declaração que tinha feito n'uma sessão passada. S. ex.ª entendeu que elle chamava revolucionarios a todos aquelles que não partilhavam das suas opiniões, o que não era possivel que fizesse, porque tem manifestado claramente quaes são as suas idéas, e que, quando se refere ao partido revolucionario, é sempre aquelle que só usa da calumnia, que assassinou Agostinho José Freire, que não duvida offender a honra dos soberanos e de tudo que ha de mais respeitavel e de mais sagrado na terra: estes é que são revolucionarios, estes é que não devem ser admittidos como protegidos, dando-se-lhes empregos e consideração. Estava, portanto, no seu direito quando lhe chamou partido revolucionario, o que fez em nome da logica e do senso commum.

N'outra occasião espera, poder chamar a attenção do governo sobre este assumpto; mas desde já, e como explicação, não podia deixar de usar da palavra, para mostrar ao sr. presidente do conselho que estimou muito que s. ex.ª fizesse a paraphrase da sua declaração ultima, desvanecendo d'este modo a impressão desagradavel que tinham causado as suas palavras. E concluiu dizendo, que espera continuar a defender sempre, como o tem feito até hoje, a

causa da justiça e da verdade, inspirado pela sua consciencia e pelo dever de par do reino, como esta camara tem sido testemunha (apoiados).

O sr. Presidente: — Tinha agora a palavra o digno par o sr. visconde de Balsemão: mas note s. ex.ª que ha uma resolução da camara, para que depois de lida a correspondencia, e passada meia hora, se entre immediatamente na ordem do dia. Já passou mais de meia hora, e por consequencia não póde continuar esta discussão, sem que a camara dispense na sua resolução. Vou portanto consultar a camara se devemos passar á ordem do dia.

Depois da votação:

O sr. Visconde de Balsemão: — Peço a palavra.

O sr. Presidente: — É sobre a ordem?

O sr. Visconde de Balsemão: — É para dizer que sinto muito que se me corte a palavra em uma questão tão importante.

O sr. Marquez de Niza: — Não está decidido que se passe á ordem do dia. Peço que se contem os votos para se poder verificar.

O sr. Visconde de Balsemão: — Eu submetto-me á decisão da camara, se ella determinar que V. ex.ª me negue a palavra n'uma occasião tão solemne.

O sr. Presidente: — Isto não é cousa nova. E uma resolução muito antiga, que está registada, e faz parte do regimento— que depois de lida a correspondencia, e passada meia hora, se entre na ordem do dia: comtudo, como se tratava de um objecto de ponderação, e varios dignos pares me tinham pedido a palavra para antes da ordem do dia, por isso deixei passar alem da meia hora; agora porém, julguei do meu dever consultar á, camara se deviamos passar á ordem do dia...

O sr. Marquez de Niza: — Eu peço a palavra para responder a V. ex.ª

Se V. ex.ª, em virtude da antiga resolução da camara, tivesse dito no fim da meia hora que passava á ordem do dia, ainda que me parecesse injusto tirar a palavra a um digno par, tendo deixado fallar todos os outros, não teria reclamado; mas como V. ex.ª entendeu que não devia fazer obra pela antiga deliberação, e depois quiz consultar acamara, sustento que a devia ter antes consultado, e tenho a convicção de que não houve vencimento na votação que se acabou de fazer. Portanto, respeitando muito a lição que V. ex.ª me quiz dar, entendo que não a mereci.

O sr. Presidente: — Consultarei novamente a camara, se quer que se passe á ordem do dia.

Decidiu-se negativamente.

O sr. Presidente: — Está decidido que se não passe á ordem do dia; por tanto póde fallar o digno par.

O sr. Conde de Thomar: — Então tambem eu peço agora a palavra.

O sr. Presidente: — Tem primeiro a palavra o sr. visconde de Balsemão.

O sr.. Visconde de Balsemão: — Eu sinto ter de tomar a palavra debaixo do aspecto que tomou esta camara (O sr. Conde de Thomar: — é honra); digo isto porque me pareceu á primeira vista que se hesitava em votar pelo modo que se acaba de verificar (Vozes: — não, não). Eu limito-me a poucas palavras, por isso mesmo que a minha intenção era agradecer ao sr. presidente do conselho, a lealdade e franqueza da sua resposta; tanto mais que eu tinha sido um d'aquelles que n'uma das ultimas sessões tinha previsto o caso que se podia dar de se deixarem fazer taes reuniões, declarando por essa occasião que reconhecia a todos o direito de se associarem e representarem pela fórma que o permitte a constituição do estado, pelo que entendia (disse eu logo bem claro) que os tumultos nas praças e nas ruas não era cousa permittida; e que reparasse o governo, que assim como se gritava pedindo a reforma d'esta camara, ámanhã ou outro dia podia reclamar-se a reforma da dynastia; e assim era fóra de toda a duvida que estes precedentes podiam ter consequencias fataes; Eu previ pois que haveria algum tumulto, e que este havia de ter algum fim. Não foi o que se esperava, em vista do que se tinha annunciado, mas um outro, e talvez mais até do que aquillo com que contassem os primeiros instigadores (apoiados). Assim eu queria desde logo prevenir, visto que é sempre melhor prevenir do que remediar; até porque em taes casos o remedio póde vir por necessidade a ser violento.

Sr. presidente, os tumultos nas praças intimidam toda a gente de bem, quando se vê que elles são anarchicos, e o de hontem tinha esse caracter; por isso mesmo que se pedia o que não está na constituição, e se dirigiam a casa de um cidadão para o arvorar como dictador para impor á nação aquillo que elles queriam, sem comtudo saberem se esse cidadão annuiria aos seus votos!

Eis aqui por que eu queria que o governo tomasse todas as precauções; e felizmente o nobre presidente do conselho acaba de dizer que as medidas estavam tomadas, esperando o governo que a ordem publica se não transtornaria, o que tinha muito a peito conforme já havia declarado n'esta camara. Felicito pois o governo; e não felicito menos os habitantes d'esta capital, que deram uma prova da sua cordura, no desprezo com que olharam para tal reunião (apoiados), que era guiada por meia duzia de homens, sem serviços e sem conhecimentos. Assim, sr. presidente, a verdade é, que quasi toda a gente olhava para aquelle espectaculo ridiculo e voltava-lhe as costas (O sr. Ministro da Fazenda: — Apoiado. Vozes: — E exacto, é verdade). Filicito-me pois eu mesmo, por ser chegada a epocha em que o bom povo portuguez mostrou que não se deixava illudir por meia duzia de homens que tentam especular á custa do mesmo povo (muitos apoiados).

Disse estas poucas palavras, sr. presidente, para mostrar francamente, e em occasião tão solemne, quaes são as minhas idéas, que effectivamente são as de liberdade, mas de