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SESSÃO N.° 27 DE 14 DE JULHO DE 1908 3

que nessas despesas ordinarias e extraordinarias vem o seguinte:

16:600 contos de réis de deficits em quatro annos e 27:621 contos de réis de recursos extraordinarios, alem das receitas ordinarias e extraordinarias, não encontrando explicação para justificar a verba de 10:971 contos de réis.

Todos sabem que pelas operações de thesouraria se fazem despesas, que se não justificam facilmente, e tanto que não vêem com a devida clareza descritas no orçamento.

Podem os Pares do Reino e Deputados, os representantes do Pais, não ter conhecimento de onde desapparecem os dinheiros? É preciso que nos unamos todos, progressistas, regeneradores, todos os portugueses, para que estas cousas se não repitam. É necessaria toda a luz, toda a clareza, para que todos saibam, real a real, quanto entra nos cofres do Thesouro, e qual a applicação que tem esse dinheiro.

É possivel que se possa justificar em que se gastam estes dinheiros. Eu tenho procurado os relatorios de fazenda, e em todos estes documentos encontro nestes quatro annos um desequilibrio que não sei justificar.

Pode isto continuar?

Appello para a Camara, para que me diga se é ou não necessario empregar meios que ponham cobro a este estado de cousas.

É necessario entrar em vida nova para que tudo seja claro, nitido e transparente, para que o Pais saiba o que se gasta. Emquanto isto se não fizer, o Pais fica desconfiado de que o seu dinheiro tem applicações injustificaveis.

Por isso, Sr. Presidente, vou mandar para a mesa mais alguns requerimentos pedindo documentos, e solicito de V. Exa. a distincta fineza de instar para que me sejam remettidos com possivel brevidade, porque quando se tratar do orçamento quero occupar-me d'este e outros assuntos graves.

E para provar ao meu amigo o Sr. Baracho que não é só agora que estou alarmado com os factos a que me tenho referido, vou ler a passagem de um discurso meu de 1904 que por acaso tenho presente.

Em todas as sessões, e principalmente na de 1901, 1902, 1903 e 1904 mostrei com a maior clareza e razão, sem. que fosse contestado, que os esbanjamentos eram enormes, que a administração publica era perdularia. Pedi remedio que nunca chegou, e parece que cada vez refinavam mais nos seus perniciosos processos.

O Sr. Sebastião Baracho: — Eu devo dizer que é espontaneo, nós não combinámos nada.

O Orador: — Disse numa das passagens do seu discurso pronunciado na sessão de 9 de abril de 1904, o seguinte:

Alem do que nós pudemos apurar pelo estudo dos documentos officiaes, alguma cousa mais chega ao nosso conhecimento.

Um Ministro da Fazenda dá actual situação, amigo portanto do Sr. Hintze Ribeiro, ao tomar conta da pasta da Fazenda, quis saber, entre outras cousas, quanto tinha gasto o seu antecessor pelas mãos dos porteiros. Soube que por intervenção do porteiro do Ministerio da Fazenda se tinham gasto 200 e tantos contos. O que elle não conseguiu foi saber em que se gastou uma verba tão importante. Gastou-se em cousas confessaveis e inconfessaveis.

Diz o Sr. Presidente do Conselho que tem ouvido accusar, mas não tem ouvido citar factos.

Então isto não são factos claros, precisos e categoricos ? Desminta-me o Sr. Presidente do Conselho, se é capaz, ou algum dos seus amigos!

Pois então passam pelas mãos de um porteiro 200 e tantos contos réis, e quando um Ministro quer saber onde se tinham gasto, responderam-lhe que são despesas secretas!

E se fossem só os 200 contos de réis... mas quantos milhares de contos se terão gasto sem o Pais saber qual a sua applicação.

Já vê o meu illustre amigo e Sr. Baracho que não é só agora que protesto contra a má applicação dos dinheiros publicos.

Eu não quero irritar o debate, nem indispor-me com pessoa nenhuma, e o que digo é que precisamos de congregar elementos para fazermos entrar a administração publica em normas differentes.

Se nós tivessemos a certeza de que ia-mos entrar em vida nova, eu ainda passaria uma esponja por cima de tudo isto, mas receio que não haja emenda.

Eu não acho merecimento nenhum em um Ministro da Fazenda que equilibre o orçamento; basta que elle pague unicamente aquillo que as leis mandam pagar, e que receba tudo quanto as leis mandam receber, e eu tenho a convicção de que as nossas receitas chegam para as despesas; o caso é não dar senão o que as leis mandam dar a cada um, e obrigar a entrar nos cofres publicos, e portanto a pagar o que cada um deve pagar.

Por este processo, que é facilimo, o orçamento fica equilibrado.

Estou informado, por . um relatorio que me consta estar inedito, que de contribuição de registo por titulo gratuito se devem perto de 5:000 contos de réis, e por direitos de mercê, por concessão de titulos e condecorações se devem centenas de contos.

Do mesmo modo a contribuição industrial não rende o que deve render.

Não quero indispor-me com pessoa alguma, como disse. O meu fim é procurar congregar elementos para que a nação não continue como até agora.

Disse o Digno Par Sr. Arroyo, e muito bem, que a situação financeira é mais grave do que em 1891.

Não ha duvida nenhuma que é muitissimo mais grave; nesse tempo a divida fluctuante era de 36:000 contos de réis e hoje é de perto de 80:000 contos de réis.

Pergunto: como pode o Pais pagar isto tudo, e como é que os individuos que teem o seu dinheiro empregado na divida fluctuante podem estar tranquillos e socegados?

Tudo isto reclama a nossa attenção.

Dizia eu, depois, no meu discurso de 1904, que pela mão do porteiro do Ministerio da Fazenda tinham passado em certo periodo 200 e tantos contos de réis sem que houvesse meio de se saber em que foram gastos.

Fiz varias considerações, intimei os Ministros que se sentavam nas cadeiras do poder, para que desmentissem se os factos eram ou não verdadeiros, e adquiri a confirmação do que dizia pelo silencio que se fez em torno das minhas palavras, porque ninguem me respondeu.

Isto pode ser?

Se eu fosse contar á Camara cousas que chegaram ao meu conhecimento, de despesas feitas pela verba chamada de «porteiro do Ministerio da Fazenda» haviam de julgar que isso era impossivel.

Digo, Sr. Presidente, que eram verdadeiros crimes que se praticavam.

Nessa occasião não pedi os documentos que hoje vou requerer, porque tinha a certeza de que não m'os davam, não vendo realizada a minha aspiração de apurar a verdade do que particularmente chegou ao meu conhecimento.

Não as requeri então por essa circunstancia e vou pedi-los agora.

São as seguintes:

Requeiro que, pelo Ministerio da Fazenda, me seja enviada nota de todas as verbas gastas por intermedio do porteiro d'aquelle Ministerio, desde 1890 até 31 de dezembro de 1907, indicando onde se gastaram essas verbas, por ordem de quem e as pessoas que as receberam.

Sala das sessões, em 13 de julho de 1908.= F. J. Machado.

Tambem tenho que requerer mais alguns documentos, porque, alem dos adeantamentos feitos ao Rei e pessoas de sua familia, consta-me que tambem ha muitos particulares bem governados e alguns — segundo se diz — teem taes adeantamentos que se viverem cem annos não os poderão pagar.

Eu não garanto o que acabo de expor á Camara, porque não tenho ainda em meu poder os documentos competentes, mas todos sabem que prodigios se tem feito pela campanha do «diz-se».