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12 ANNAES DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

Quando apresentei este projecto em 1906 tinha as minhas ideias perfeitamente esclarecidas, firmes e definidas, hoje ainda as tenho mais, porque vejo que não ha ninguem, neste Pais ou noutro qualquer, que consiga reprimir o jogo.

E' um vicio, Sr. Presidente, inherente á humanidade, como muitos outros que são impossiveis de evitar.

As mais altas individualidades da Europa civilizada teem empregado todos os meios ao seu alcance para evitar e reprimir o vicio do jogo e não o teem conseguido. Como havemos nós ter essa pretensão ?

Napoleão I, S. Luis Rei de França e Carlos Magno tentaram reprimir o jogo perseguindo os jogadores e enchendo as cadeias com alguns dos vultos mais prestimosos, mas nada conseguiram.

Quando eu em 21 de agosto de 1906 apresentei aqui o meu projecto,, recebi varios jornaes franceses com artigos referentes ao caso e entre elles O Matin de 1 de fevereiro de 1907.

Este jornal traz um bello artigo sobre o jogo de azar epigraphado — Napoleão I é Clemenceau — « Ambos quiseram regular a questão do jogo em Franga— O Imperador não o conseguiu; o primeiro Ministro consegui-lo-ha?»

Neste bello artigo diz-se que Napoleão em 1806 quis saber se não seria possivel sair da situação equivoca, em que a França se encontrava relativamente ás casas do jogo, quer autorizando-as formalmente em certas localidades, quer prohibindo-as por toda a parte conforme as leis.

O Conselho do Estado foi chamado a resolver este difficil problema.

Napoleão propôs duas questões:

Primeira questão: «é necessario publicar uma nova lei para prohibir formalmente o jogo?»

As secções correspondentes do Conselho do Estado reportaram-se a Carlos Magno, a S. Luis, a Francisco I e concluiram pela manutenção pura e simples da lei de 1791, terminando os seus trabalhos pelas seguintes melancolicas reflexões :

«A municipalidade de Paris tinha ardentemente perseguido os jogadores, os tribunaes os tinham condemnado, as prisões de Bicêtre e da Salpêtrière estavam cheias de muitos personagens notaveis; o furor do jogo não perdeu nada da sua intensidade e encontrava-se sempre local para se jogar.

Tal seria a sorte de uma nova lei».

Segunda questão: é necessaria uma lei que permitta a tolerancia dos jogos?

As secções responderam negativamente :

«Podia-se admittir que a administração transigisse em certos casos com os costumes dos homens, com as suas fraquezas e com os seus vicios, mas uma tal disposição não era permittida na lei; ella não podia consagrar esta tolerancia, nem manter o menor vestigio».

De repente o Imperador se encolerizou e fez apresentar ao Conselho de Estado um projecto que renovava a prohibição geral do jogo, mas abria excepções para Paris e para os estabelecimentos de aguas thermaes.

Em 14 de maio de 1806, Napoleão dirigiu se ao Conselho de Estado e na sua posição habitual, de pé, ao canto do seu gabinete, eloquente, nervoso e familiar, declarou: «É necessario de clarar positivamente a tolerancia do jogo ou a sua prohibição; o ultimo partido é mais conforme á moral, é necessario pois adoptá-lo e não exceptuar senão Paris».

É impossivel ficar no indefinido em que se está; á justiça não tem acção neste momento contra as casas de jogo; ella não pode proceder senão quando a policia o permittir; este estado passivo dos tribunaes não é conveniente. Ouço falar constantemente dos juizes e da justiça porque é necessario em cada negocio imprimir-lhe o movimento.

Esta machina devia por si andar mesmo que o Governo dormisse».

Sobre isto, o excellente Sodré tomou nota, os conselheiros approvaram e os ouvintes sorriram.

O projecto do decrete não teve nenhum seguimento e o Governo dormiu».

Sr. Presidente: deve estar tirada a illusão áquelles que suppõem que teem força para reprimir este vicio, que pode dizer-se que é inherente á humanidade. É indispensavel que se convençam que não se pode reprimir este vicio, e que de maneira alguma se não deixe de regulamentar, tirando o correspondente proveito para o Estado e para as localidades onde o jogo for permittido.

Tenho aqui mais alguns jornaes franceses que teem tratado do assunto e nelles me tenho inspirado em conhecimentos práticos do que se passa naquelle país e por elles comprehendo que era conveniente e da maior vantagem regulamentar o jogo, principalmente nas praias e thermas em que o Governo visse que era conveniente consenti-lo.

Ha poucos dias entrei numa casa de jogo fora de Lisboa, unicamente por curiosidade, que não direi onde é porque não quero que me chamem delator, e fiquei convencido que é indispensavel adoptar esta medida em beneficio do Pais.

Ha uma referencia notavel num jornal francês — Le Journal — de 9 de julho de 1906, em que publica o dis curso do Sr. Goudin de Villaine, senador da Mancha, que diz entre outras cousas, o seguinte:

«Joga-se per toda a parte e por todas as formas em França, e não sendo fiscalizado nem regulamentado o jogo, os jogadores estão expostos a todas as escroqueries e imaginarias e isto sem proveito para ninguem, senão para os escroques e os ladrões de profissão. Com o monopolio do jogo regulamentado elle torna-se pelo menos honesto em sua execução e este vicio incuravel em todas as sociedades serra para o futuro util para alguma cousa; purificado ficaria quasi, em seu methodo e em seu fim: alimentar o orçamento, desagravando-o de tantos encargos que pesam sobre e trabalho.

Ora o trabalho é a virtude, o jogo é o vicio e não é justo, porque o imposto é necessario, isentá-lo sobre o vicio e não sobre esta virtude social que é o trabalho».

Não ha nada mais sensato nada mais justo.

Então tributa-se o trabalho, que é a honra nacional, e não se ha de tributar o vicio!

As classes pobres que necessitam de auxilio e protecção vêem-se afflictas com o pagamento dos direitos sobre es generos alimenticios, tornando a vida nacional talvez a mais cara de toda a Europa.

Então tributam-se os generos de primeira necessidade, tributam-se todos, os actos da vida nacional a criança mal solta o primeiro vagido concorre logo para as despesas do Estado no fato que veste, no leite que bebe, porque a mãe necessita ser melhor alimentada, e tudo isto paga impostos e só não se ha de obrigar aos individuos que gastam o seu dinheiro para gozar e divertir se?

Pois não é justo que os jogadores e os que tiram fabulosos lucros do jogo, como são os banqueiros, sejam obrigados a pagar alguma cousa para beneficiar os pobres em a correspondente diminuição do imposto do consumo? Eu não comprehendo, Sr. Presidente, o motivo da hesitação que possa haver em regulamentar o jogo e tirar d'este vicio uma importante receita.

Renovo portanto a iniciativa do projecto e mando para a mesa essa renovação de iniciativa.

Peço á illustre commissão que ao menos dê o seu parecer e diga os motivos em que fundamenta a sua recusa.

Se o projecto não presta, digam isso abertamente, mas se é bom queiram estudá-lo a ver se precisa de emendas e sendo estas necessarias façamo-las, pois não deve haver senão o desejo de realizarmos uma obra patriotica em beneficio da sociedade portuguesa.

Já aqui disse um illustre collega meu que eu parecia um grande jogador pelo