O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

SESSÃO N.° 35 DE 5 DE AGOSTO DE 1908 9

o artigo 5.° do projecto que está em discussão.

Mas para fazer desde já confissão completa das minhas responsabilidades no capitulo dos adeantamentos, devo declarar á Camara que tambem autorizei dois em janeiro e fevereiro de 1891 á Casa de Sua Majestade a Rainha Senhora D. Maria Pia, na importancia total de 95 contos de réis, por conta da sua dotação.

Sr. Presidente: não pretendo attenuar as minhas responsabilidades, dizendo que alguns dos adeantamentos que mencionei estão liquidados já. Liquidados ou não, as autorizações dos adeantamentos são actos illegaes, illegaes e deploraveis por qualquer lado por que se considerem e as responsabilidades gravissimas. A guarda e applicação dos dinheiros publicos está confiada ao Ministro da Fazenda, que não tem autoridade para desviá-los dos fins a que designadamente por lei são destinados

Comprehende se e admitte-se que, para acudir a uma necessidade imprevista e urgente, que ponha em risco interesses do Estado, o Ministro da Fazenda disponha dos cofres publicos, embora não esteja para essa despesa autorizado pela lei do orçamento. Mas neste caso corre-lhe o rigoroso dever de vir ao Parlamento dar conhecimento do acto illegal que praticou e das circunstancias que o podem justificar, e pedir o respectivo bill de indemnidade. Mas desviar dos cofres publicos os dinheiros pagos pelo contribuinte, ás vezes sabe Deus com que sacrificio, para emprestar, ou dar, seja a quem for, é um acto que nenhum Ministro da Fazenda pode praticar, é uma grande falta, é uma grande culpa.

E eu, Sr. Presidente, sou réu confesso d'esta culpa.

Mas para que eram estes adeantamentos? Com que fins se pediam? Allegava-se que eram para pagar despesas justificadas e legitimas; que a Casa Real não podia viver com o decoro, que devia manter, com a lista civil que as Côrtes tinham votado no principio do reinado 5 que era indispensavel conservar illeso o prestigio que deve cercar o Chefe do Estado. Ora, Sr. Presidente, falando em geral na questão, não é fazendo despesas excessivas, e que vão alem das receitas, não é contrahindo dividas e pagando-as á custa alheia, não é com mais ou menos automóveis, com mais ou menos criados de fardas agaloadas, com mais ou menos sumptuosidade, que cada um adquire e sustenta a autoridade, o respeito e a estima dos outros, e falando em especial dos Reis, direi que o Rei de um país pequeno e pobre que tem a instruccão, o exercito, a armada, quasi todos os serviços publicos insufficientemente dotados, não pode competir em pompa e fausto com os Reis de países ricos e poderosos. O prestigio do Chefe do Estado não vem da summptuosidade com que vive, vem do prestigio da nação a que preside, e o prestigio da nação vem da sabedoria com que é governada. (Repetidos apoiados do Digno Par Sr. Sebastião Bar acho).

O Chefe da Confederação Helvetica tem de vencimento annual 040 libras, e a Suissa é respeitada e admirada por todas as nações do mundo.

Mas dir-me-hão, Sr. Presidente, pensando eu d'este modo, porque autorizei adeantamentos ? Porque não vim ás Côrtes dar conhecimento das illegalidades que pratiquei, pedir o respectivo bill de indemnidade?

Tem-se dito por ahi, e é uma grande injustiça, que estes adeantamentos eram feitos para conciliar as boas graças do Paço, e conservar assim a pasta, as honras, as prerogativas, os commodos de Ministro de Estado. Não, não foi essa a razão.

Eu sei por mim, e avalio pelos outros homens publicos, quanto haviam de sentir terem de saltar por cima da lei para satisfazerem estas solicitações.

Peço licença para occupar a attenção da Camara durante alguns momentos e apresentar lhe alguns factos dos quaes se poderá presumir que nunca fui seduzido pelo poder nem por glorias. Nunca fiz o menor esforço, nunca dei um passo para ser Ministro. Fui Ministro pela primeira vez em novembro de 1889. Aqui vejo o meu illustre amigo e Digno Par Ressano Garcia, uma das mais vigorosas intelligencias que todos admiramos; alem vejo tambem o honrado estadista, uma das glorias mais brilhantes do partido progressista, (Apoiados) o Digno Par e meu amigo Veiga Beirão, e tambem ali está o Sr. Eduardo José Coelho, todos tres meus collegas e que foram testemunhas e para elles appello da resistencia que oppus ás instancias que me foram feitas para acceitar uma pasta no Governo, que então se achava em crise parcial. Appello para o testemunho de S. Exas. (Apoiados). Agradeço a S. Exas. E se, depois de uma luta de vinte e quatro horas, cedi, foi porque dois Ministros d'aquelle Gabinete, o meu amigo Ressano e outro meu amigo, que infelizmente a morte arrebatou, Barros Gomes, foram a minha casa declarar-me que o Governo tinha esgotado todas as combinações para resolver a crise, e que se eu insistisse na recusa, o Governo iria depor a sua exoneração nas mãos do Rei.

Cedi então, porque não quis ficar com a responsabilidade de ser causa unica da demissão do Governo, em cujo partido eu militava como soldado.

Da segunda vez que fui Ministro, em novembro de 1890, tambem lutei e fui vencido. Era convidado para substituir Mello Gouveia na pasta da Fazenda.

Resisti ás instancias dos Ministros, quatro dos quaes dormem o somno da eternidade, e dois, felizmente vivos, não estão presentes.

Mas cedi a uma carta do Rei, que me dizia que era um favor pessoal. E, se faço allusão a este documento, é porque creio não fazer o menor aggravo á memoria do Rei D. Carlos. Bem cara me foi essa condescendencia.

Finalmente, da terceira vez que fui convidado para Ministro acceitei sem resistencia a pasta das Obras Publicas, porque sabia que o chefe do meu partido desejava resolver prontamente a crise, e as suas duvidas criariam difficuldades, que a minha lealdade e dedicação deviam evitar para não ser retardada a solução da crise.

Sr. Presidente: peço desculpa á Camara de occupar a sua attenção com estes factos, que só teem importancia para mim; se os referi, foi para significar que nunca me seduziu o desejo do poder nem a gloria das grandezas, e que nunca tive em vista attrahir as boas graças da Coroa.

Bem sei que não se prende ninguem para Ministro, mas o que é verdade é que muitas vezes se obedece com repugnancia ás exigencias da disciplina partidaria.

Mas, se não foi com o fim de conservar a pasta de Ministro, ou de captar as boas graças da Coroa, para que autorizei eu os adeantamentos que a Casa Real me pedia, e porque não vim, á Camara dar conhecimento d'esses actos illegaes, e solicitar o respectivo bill de indemnidade?

Foi porque não soube subtrahir-me á influencia do meio que me cercava, e porque ha dezoito annos eu pensava de modo differente do que penso hoje.

Nas monarchias absolutas julgava-se, e ainda alguem julga, que o poder dos réis vem de Deus -omnis potestas a Deo— que o Rei é o senhor absoluto do territorio e dos -homens.

O Sr. Sousa Costa Lobo: — É a primeira vez que ouço dizer isso!

O Orador:— Pois V. Exa. não conhece a historia? V. Exa. não se recorda da frase de Luiz XIV?

(Nova interrupção do Digno Par Sr. Costa Lobo, que não se ouviu).

Se V. Exa. comprehende as cousas de outra forma, muito me obsequeia, elucidando-me ou desfazendo esta cegueira em que vivo.

O Sr. Sousa Costa Lobo : — Depois responderei a V. Exa.

O Orador:— Que foram, Nero, Ti-