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e enfeitada demonstração destas qualidades, porque além da confiança que eu tenho e devo ter na illustração da Camara, accresce-me a convicção de que essa demonstração resulta, á primeira vista, da simples e rapida leitura das provisões do Projecto, e d'uma pouca de reflexão sobre o estado financeiro do Paiz.

Não quero porém occultar-vos a causa immediata da confecção do Projecto. Promettera-nos o Governo no discurso da Corôa, e pouco depois, o Sr. Ministro da Fazenda, no relatorio do Ministerio a seu cargo, apresentar differentes medidas, pelas quaes se podesse conseguir a extincção do deficit, e o arranjo definitivo das nossas finanças.

Foram com effeito apresentados muitos e variados Projectos, que tenho lido com a reflectida meditação, que demanda um objecto de tanta transcendencia: e sem querer agora avaliar em detalhe a sua utilidade, não posso deixar de dizer (sem que nisto entre intenção, ou espirito de opposição, ou offença) que todos elles me parecem, uns de curto alcance, outros oppostos ao fim, que se pertende alcançar, e nenhum de interesse vital, e decisivo para a extincção do deficit, para o cumprimento de obrigações solemnemente contrahidas, e para o arranjamento definitivo das finanças.

Sobre tudo me surprehenderam as propostas relativas á Junta do Credito Publico, as quaes em vez de sustentarem, e augmentarem por novas garantias o credito daquelle importantissimo Estabelecimento, tem produzido maior desconfiança, e descredito. E como não havia de assim accontecer, quando ao mesmo tempo que se reconhece que a Junta não póde com tamanho encargo, se pretende onera-la com outros novos?

Que outra cousa se poderia esperar das providencias apresentadas, quando todas ellas sacrificam a mais sagrada de todas as propriedades, impondo um desigual e pesadissimo encargo aos possuidores de titulos de divida fundada, sem os compensar com uma garantia, ou com uma esperança conhecidamente realisavel?

É comtudo, por mais desgraçado que seja o nosso estado, a occasião é a mais adquada para salvar aquelle Estabelecimento, decretando desde já uma amortisação quantiosa — constante — successiva, e de modo algum onerosa.

O seu decretamento fará procurar com empenho o emprego dos titulos: com esta procura o seu valor cresce; o que habilitará o Governo a mandar vender por sua conta e a troco de Notas (que deve amortisar) os milhares de contos de Inscripções que tem no Banco como penhor.

A estes titulos proporciona-se-lhes um emprego solido; e sómente os fóros, que vem no orçamento no valor de 180 contos de rendimento, e que por isso representam um capital de 3:600 contos, hão de fazer amortisar 7:200 a 8:000 contos de titulos, o que importa nos encargos da Junta uma diminuição de 400 contos de juros. — Ajuizai do resto.

Tal é o fim unico do projecto que tenho a honra de apresentar-vos. — O remedio do mal ha de sahir do mesmo mal. O descredito, e a desconfiança são um grande mal, e eu pertendo converte-los em grande bem.

O projecto é pois de occasião. — É necessario e util, porque ha de diminuir em grande escala, como já indiquei, os encargos da Junta do Credito, e preencher o vacuo produzido pela amortisação, e depreciamento das Notas do Banco, com uma moeda de nova especie. — É justo, porque se por uma parte os possuidores dos titulos soffrem com a já proposta reducção do rendimento, recebem uma indemnisação no augmento do valor do seu capital, consequencia natural do projecto. — Tem finalmente o cunho da moralidade, porque a Nação paga de real a real por meio de troca, uma divida sagrada.

D'ante-mão ouso contar com o apoio da Camara em objecto tão vital; não para que o subscreva, mas para que o medite — corrija — reforme — ou addite, como entender, na sua alta sabedoria, que seja mais util ao Paiz.

PROJECTO DE LEI.

Artigo 1.º Todos os fóros, censos, e pensões pertencentes á Fazenda Nacional serão vendidos em hasta publica por titulos de divida fundada interna ou externa, os quaes serão recebidos pelo seu valor nominal.

§. 1.º É permittida a remissão dos fóros, censos, e pensões pelos mesmos titulos e valor; porém aos foreiros, censoarios, e pensionarios sómente é permittida a remissão sendo effectuada em acto de praça, como direito de opção.

Art. 2.º O preço pelo qual se ha de abrir a praça será a importancia de vinte annos de foro, censo, ou pensão; e quando sejam em generos, liquidar-se-ha a sua importancia pela tarifa das Camaras das localidades.

Art. 3.° É permittida a denuncia de todos os foros, censos, e pensões sonegados á Fazenda Nacional para todos os effeitos que as Leis do Reino o concedem ás denuncias dos bens vinculados com as seguintes modificações:

§. 1.º Os foros, censos, e pensões denunciados serão vendidos em praça nos termos do artigo 1.º

§. 2.° Os foreiros denunciados poderão remir apesar da denuncia, no tempo, e pelo modo designado no §. unico do artigo 1.°, excepto quanto ao valor dos titulos, que sómente lhes serão recebidos no valor de 80 por cento.

§. 3.º Os titulos recebidos pela compra ou remissão serão averbados vitaliciamente aos denunciantes.

Art. 4.º Os bens doados a donatarios vitalicios de qualquer natureza serão vendidos pelos mesmos titulos mencionados no artigo 1.º

§. 1.° Os donatarios serão preferidos, tanto por tanto, na compra dos bens, e fazendo a necessaria declaração no acto da entrega do ramo.

§. 2.º Dos titulos recebidos como preço destas vendas serão averbados vitaliciamente ao donatario tantos quantos sejam necessarios para produzir um rendimento igual áquelle que o donatario recebia dos bens doados, liquidando-se a sua importancia pelo 5.º que elle pagava á Fazenda Nacional.

Art. 5.º Serão immediatamente vendidos os bens de raiz pertencentes ás Communidades Religiosas de qualquer denominação, pelo modo determinado no artigo 1.°

§. 1.º Dos titulos recebidos pela compra destes bens, serão averbados a favor das Preladas dos respectivos Conventos tantos quantos sejam necessarios para dar a cada Religiosa 480 réis por dia, e produzir um rendimento sufficiente para conservação do Convento, fabrica da Igreja, decencia do culto, e ordenado do Capellão Confessor.

§. 2.º Os Conventos que não tiverem bens de raiz, ou que tendo-os, não chegarem os titulos por elles recebidos a produzir o rendimento necessario aos fins designados no §. antecedente, ser-lhes-ha inteirado esse rendimento com os titulos recebidos pela venda dos bens de outros Conventos.

§. 3.º A morte de qualquer Religiosa faz cessar a recepção do juro correspondente á prestação, e os titulos respectivos serão remettidos á Junta do Credito.

Art. 6.º São admittidas na compra dos bens mencionados nesta Lei as acções sobre o fundo de amortisação creado pelo Decreto de 19 de Novembro de 1846.

§. 4.º As acções que vencem juro serão admittidas na totalidade do preço: as que o não vencem em a metade.

Art. 7.º Se o preço das arrematações não chegar a cem mil réis, e os arrematantes ou foreiros que pertenderem remir, quizerem entregar um titulo daquelle valor, ser-lhe-ha admittido, uma vez que os arrematantes cedam a favor da Fazenda Nacional o excesso do titulo sobre o preço.

Art. 8.º Os juros que tiverem vencido os titulos entregues pelas pessoas que comprarem, ou remirem, cedem em beneficio da Fazenda Nacional.

Art. 9.º As vendas e remissões feitas em consequencia desta Lei, ficam isentas de qualquer imposto, ou emolumento.

Art. 10.° As disposições da presente Lei são applicaveis ás vendas de bens por virtude de execução fiscal, excepto quanto á isenção da siza, a qual será paga, quando o possa ser, nos mesmos titulos.

Art. 11.º Os titulos recebidos pelas compras, e remissões, e que excederem aquelles que por esta Lei ficam tendo uma applicação especial e temporaria, serão amortisados por meio da queima pela Junta do Credito.

Art. 12.º É authorisado o Governo para de accordo com a respectiva Authoridade Ecclesiastica proceder á commutação dos encargos pios de todos os vinculos, e Capellas do Reino e Ilhas, e pelo modo seguinte:

§ 1.º Em cada um dos referidos vinculos e Capellas ficará reduzido o encargo pio a uma missa annual de esmola de 480 réis.

§. 2.º Os Administradores dos vinculos e Capellas entrarão nos Cofres da Junta do Credito com a importancia dos demais encargos, a qual será empregada pela referida Junta na compra e amortisação da divida a seu cargo.

§. 3.º Desta importancia tirará a Junta 10 por cento, os quaes serão applicados para o Hospital de S. José, ficando por este modo substituido por um rendimento certo, o eventual que lhe pertence pelo não cumprimento dos encargos não cumpridos.

Art. 13.° Aos Juizes de Direito ficará competindo a tomada das contas annuaes aos administradores dos Vinculos e Capellas, competindo-lhe por este trabalho os emolumentos dos antigos Provedores.

Art. 14.° Logo que fôr amortisada metade da divida interna, será religiosamente cumprida a letra dos titulos existentes em todas as suas disposições.

Art. 15.° As fianças, que devem prestar os Thesoureiros, Recebedores, e outros quaesquer gerentes de dinheiros publicos, serão em titulos de divida fundada interna ou externa, na seguinte proporção.

§. 1.° Se a responsabilidade do gerente fôr de 3:000$000 réis, a fiança será de 6:000$000 réis em titulos.

§. 2.° Estes titulos serão depositados nos cofres da Junta.

§. 3.° O gerente não poderá receber os juros do segundo semestre de qualquer anno, sem que tenha prestado contas da gerencia desse anno, e se mostrar quite com a Fazenda Nacional.

§. 4.° Quando se verifique alcance, o qual deve ser participado á Junta, procederá esta á amortisação de tantos titulos dos depositados, quantos sejam necessarios para pagamento do alcance.

§. 5.° Os titulos que se amortisarem serão recebidos no valor de 50 por cento.

Art. 16.° Todas as pessoas encarregadas por Lei de entregar, ou pagar á Junta do Credito as quantias votadas, para a sua dotação, ficam sujeitas, no caso de falta, á queréla de furto, nos termos da Ord. L. 5.° T. 60 §. 8.º

§. 1.° A queréla poderá ser dada por qualquer possuidor de titulos de divida fundada.

§. 2.° A Junta publicará no Diario do Governo a falta de entrega ou pagamento no dia immediato áquelle em que se tiver verificado. — O Diario - só por si constitue o corpo de delicto.

Art. 17.° A pronuncia suspenderá os vencimentos ao Empregado, de que fôr querelado, e a sentença condemnatoria lhe imporá necessariamente a pena de demissão, e de incapacidade perpetua para servir emprego de qualquer natureza, isto sem prejuizo das mais penas crimes determinadas por Lei.

§. 1.° Estas mesmas penas, excepto a de demissão, serão applicadas aos accusados, que não forem Empregados Publicos.

§. 2.° As sentenças de absolvição ou condemnação serão publicadas no Diario do Governo.

Art. 18.º O Governo fará immediatamente os regulamentos necessarios para a execução desta Lei, e dará annualmente ás Côrtes conta detalhada do seu resultado.

Art. 19.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Sala da Camara, 11 de Maio de 1848. = José da Silva Carvalho.