886 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO
geral, pretende se fazer uma deducção nos rendimentos d'esses titulos.
Entendo que o estado para seu credito não devia lançar este imposto sobre os rendimentos dos seus titulos de divida, que uma lei isenta de toda e qualquer contribuição ou encargo; porque de outro modo haverá quebra de contrato, faltará o estado a um compromisso solemne para com os seus credores.
Supponhamos que certo proprietario, n'um contrato de arrendamento, estipula que incumbe ao rendeiro a obrigação de pagar as contribuições do estado, e chegada a epocha de satisfazer a esse encargo o rendeiro falta a elle. O proprietario exige o cumprimento d'esta clausula, mas o rendeiro não quer pagar, allegando que a obrigação de pagar as contribuições pertence ao senhorio em nome de quem está o conhecimento; havia aqui uma quebra de contrato, e de certo se o proprietario appellasse para os tribunaes a posição do rendeiro não seria boa.
Ora, n'esta questão que se debate, temos um caso analogo, porque ha quebra de contrato, evidentemente no modo de proceder com relação aos credores do estado, aos quaes este dicta a lei.
O imposto sobre o vencimento dos empregados publicos tambem não me parece acceitavel.
Todos sabemos quanto são escassos esses vencimentos e não permittem quaesquer deducções, ainda mesmo em nome das urgencias do estado.
Pelo contrario a carestia da vida está aconselhando que os mesmos funccionarios sejam mais bem remunerados, embora reduzamos o numero d'elles, se é excessivo.
No que toca á propriedade este imposto é altamente injusto, e vae aggravar as desigualdades e injustiças que já existem com o imposto predial.
Tenho presente uma certidão que encerra indicações muito interessantes com referencia a uma freguezia do Alemtejo, onde aliás não tenho propriedade alguma.
Duas herdades tinham ha quatorze annos rendimento collectavel igual; uma d'ellas está collectada hoje sobre um rendimento de mais 260 por cento, emquanto que outra augmentou só mais 10 por cento.
A rasão d'esta desproporção explica-se, porque o dono da herdade que paga mais 260 por cento está ausente da localidade, e o outro reside ali.
Ora, desde o momento, em que se fazem d'estas injustiças na distribuição dos impostos, eu não quero concorrer para aggraval-os votando o addicional que se propõe n'este projecto com relação á propriedade, embora se diga que este novo imposto é compensador; mas a verdade é que nada vae compensar, antes torna mais flagrantes as injustiças e desigualdades.
O mesmo se póde dizer com respeito á industria. Appello para a memoria do sr. ministro da fazenda, e recordo-lhe que, quando s. exa. estava na camara municipal de Lisboa, de que tive a honra de fazer parte, sendo então esta corporação tribunal de recurso para as reclamações sobre a contribuição industrial, s. exa. o sr. Barros Gomes teve occasião de ver quaes as injustiças que se praticavam na distribuição d'aquelle imposto.
Todos reconhecemos a conveniencia da instituição aos gremios, e quanto é liberal este modo de fazer a repartição do imposto, mas é innegavel que se commettem grandes abusos na maneira de fazer essa repartição por parte dos que d'ella são encarregados.
Portanto, e pelo mesmo principio que não approvo o addicional sobre a decima predial, não posso approvar este sobre a contribuição industrial, porque não quero da mesma fórma concorrer com o meu voto para que as injustiças se aggravem.
O imposto que recáe sobre a classe E acho que é muito pouco politico, e que será prejudicial aos interesses geraes do paiz, porque vae recaír sobre as pessoas que vem aqui disfructar dos seus rendimentos provenientes de paizes estrangeiros, e que fazem consumo aos nossos generos, concorrem para o augmento da receita das alfandegas, etc.
E o novo imposto, se for possivel cobral-o, póde afastar da paiz muitas d'essas pessoas.
Parece-me que o sr. ministro da fazenda tinha outras fontes de receita muito importantes a explorar para obter mais recursos, que todos nós reconhecemos que são deficientes e que é necessario augmentar.
E não cuide a camara que eu entendo que os rendimentos publicos não podem e não devem ser augmentados; eu creio que os rendimentos publicos podem ser rasoavelmente elevados se houver mais igualdade no lançamento da contribuição á propriedade, e que ella póde mesmo pagar uma contribuição superior á que paga actualmente.
Dá-se uma outra circumstancia para a qual chamo a attenção do sr. ministro: refiro-me ao modo por que é lançada a contribuição sumptuaria.
Ha pessoas que vivem era Lisboa e que, tendo residencias em concelhos limitrophes, pagam n'esses concelhos a contribuição pelos seus cavallos. Ao mesmo tempo que o industrial que exerce diversas industrias paga pela mais collectada, a lei da contribuição sumptuaria não impede que se pague esta contribuição especial no concelho mais favorecido.
Tenha o sr. ministro da fazenda a certeza de que o estado ha de perder com este modo de cobrar o imposto sumptuario.
Eu não quero cansar mais a camara; o meu fim era unicamente consignar o meu voto ácerca d'este projecto, e dizer que entendo que os rendimentos publicos se podem augmentar, e, sobretudo, manifestar a minha opinião de que entendo que o estado não deve faltar á fé dos contratos, nem lançar impostos que, sem melhorarem notavelmente as condições financeiras do thesouro, aggravam as injustiças da distribuição.
O sr. Presidente: - Acabou a inscripção. Vae votar-se a generalidade do projecto.
Foi approvada a generalidade do projecto de lei n.° 107.
O sr. Presidente: - A primeira sessão será ámanhã (3 do corrente), e a ordem do dia será a discussão da especialidade do projecto que acaba de votar se na generalidade, e os demais que já estavam dados para ordem do dia de hoje.
Está levantada a sessão.
Eram pouco mais de cinco horas da tarde.
Dignos pares presentes na sessão de 2 de junho de 1880
Exmos. srs.: Duque d'Avila e de Bolama; Duque de Loulé; Marquezes, de Alvito, de Ficalho, de Fronteira, de Monfalim, de Sabugosa, de Vallada; Arcebispo de Evora; Condes, de Avilez, de Bomfim, de Cabral, de Castro, de Gouveia, de Linhares, da Louzã, de Podentes, de Rio Maior, da Torre, de Valbom, de Paraty, da Fonte Nova; Bispo eleito do Algarve; Viscondes, de Almeidinha, de Alves de Sá, de Asseca, de Bivar, de Borges de Castro, de S. Januario, de Ovar, de Portocarrero, da Praia, da Praia Grande, do Seisal, de Soares Franco, de Valmor, de Villa Maior; Barão de Ancede; Mello e Carvalho, Quaresma, Sousa Pinto, Barros e Sá, D. Antonio de Mello, Couto Monteiro, Fontes Pereira de Mello, Rodrigues Sampaio, Costa Lobo, Coutinho de Macedo, Barjona de Freitas, Cau da Costa, Xavier da Silva, Palmeirim, Carlos Bento, Sequeira Pinto, Montufar Barreiros, Fortunato Barreiros, Margiochi, Andrade Corvo, Mendonça Cortez Mamede, Braamcamp, Pinto Bastos, Castro, Reis e Vasconcellos, Mello Gouveia, Costa Cardoso, Camara Leme, Daun e Lorena, Seixas, Vaz Preto, Franzini, Mathias de Carvalho, Placido de Abreu, Calheiros, Thomás de Carvalho, Ferreira Novaes, Vicente Ferrer, Seiça e Almeida, Ornellas, Mexia Salema, Canto e Castro, Luiz de Campos, Serpa Pimentel.