2 DE NOVEMBRO DE 1967 1257
dores, desarmados da confiança que normalmente poderiam depositar nas taxas gerais do incentivo a investir e colocados, em vez disso, entre uma situação anormal do mercado e o receio de alterações bruscas da política económica que visem eliminá-la.
Não parece, assim, precipitado concluir-se (como o parece ter feito a generalidade da política económica contemporânea na Europa Ocidental) que, móis do que alternativa do desenvolvimento, a estabilidade dos preços constitui condição da sua prossecução segura e equilibrada, sendo, por isso, objectivo a considerar atentamente no confronto com os demais, ao reflectir-se sobre os termos da sua compatibilidade. O que sucede é que, em certa medida, o debate sobre o comportamento dos preços no desenvolvimento económico é inquinado por um preconceito de antagonismo, derivado, provavelmente, da rigidez de certas posições ortodoxas, fundamentalmente em matéria de política monetária. Por outras palavras se são de aceitar as considerações acima expostas, a estabilidade afere-se dinamicamente e por critérios ligados, de modo essencial, ao processo complexo do desenvolvimento económico. Estabilidade não é rigidez ou estagnação, e exige, por isso, mais do que o cumprimento puro e quase automático das regras consignadas pela ortodoxia monetária tradicional, uma política, multiforme e flexível, que vai desde o campo monetário ao domínio fiscal, sempre de olhos postos na estabilidade que verdadeiramente interessa - mais do que por si própria, pelo que significa no processo da expansão económica do país
É precisamente com esse espírito que deve encarar-se o problema da estabilização de uma situação inflacionista efectiva, quando inserido numa política de desenvolvimento.
19. Sabe-se que uma política dessas tende a exercer, tanto mais fortemente quanto mais intenso for o ritmo de crescimento desejado, uma pressão sobre os preços, pelo menos através das penúrias que provoca na oferta de bens e factores em certos sectores da economia. Mas se isso nada tem a ver com a indispensabilidade ou conveniência da alta generalizada dos preços para o processo de desenvolvimento, não afecta, em si mesmo, o problema da política estabilizadora neste processo a estabilidade haverá de inscrever-se entre os objectivos a prosseguir, mas devem vigiar-se os efeitos que a sua prossecução tende a provocar sobre a marcha do desenvolvimento, para tentar reduzir ao mínimo a sua possível acção frenadora.
A primeira ideia a aclarar é que não pode esperar-se que os efeitos perniciosos da inflação sejam imediata ou rapidamente sustados pela remoção das tensões inflacionistas. Logo por isto dado que a estabilização não é apenas eliminação do excesso da procura, mas, como se viu, reajustamento de toda a economia a condições de funcionamento permanente, tidas como normais e, portanto, estáveis, a estabilização tende a provocar uma redução da procura de investimentos em sentido técnico. Na verdade, por razões várias, as decisões tomadas quanto a criação de capitais não se traduzem imediatamente em utilização de recursos na produção de capital. Além disso, o reajustamento estabilizador - fazendo regressar ao seu nível de não economicidade os empreendimentos cuja atractividade se deve apenas ao processo inflacionista - leva rapidamente ao abandono de investimentos que estavam a ser realizados. Este fenómeno, juntamente cora o desfasamento entre o aparecimento (ou reaparecimento) de processos estàvelmente atractivos e a utilização efectiva de recursos na sua consecução, pode levar (e é mesmo natural que leve) a um resultado líquido de menor emprego de recursos no investimento, pelo que a produção de bens capitais pode diminuir.
Deve, no entanto, observar-se que se trata de um efeito transitório, cuja duração e intensidade dependem não só do grau de distorção provocado (o que resulta, além do mais, da própria dimensão do processo inflacionista já efectivado), mas também do cuidado com que se elabore a política estabilizadora e da eficiência conseguida na sua execução. A este propósito, os autores concordam, por um lado, em que as medidas estabilizadoras, quando adequadas, inverterão com relativa rapidez os principais fenómenos resultantes da distorção inflacionista (quer a distorção de investimentos técnicos, quer a relativa aos stocks, quer a provocada sobre os bens de consumo duradouros - sobretudo na construção, onde o investimento em casas para alugar tende a ser substituído por investimentos em casas para habitação própria-, quer a respeitante ao modo, real ou financeiro, da detenção de valores). Também concordam, por outro lado, em que um «tratamento de choque» estabilizador é preferível a tentação de levar a cabo a política de um modo gradual e suave, a razão desta opinião (à primeira vista um pouco estranha) reside na própria natureza eminentemente psicológica da distorção inflacionista.
Com efeito, o reajustamento da economia distorcida só pode processar-se com êxito se se alterarem as expectativas do público, quer dos investidores potenciais e efectivos, quer dos consumidores, ora, a alteração (que muitas vezes terá de ser inversão) das expectativas requer mudança apreensível da situação e clima económicos, mas ela só será apreensível se a política estabilizadora não se processar com um ritmo excessivamente, vagaroso quando se pretende uma estabilização gradual e lenta, corre-se o risco de ter o encargo e não ter o benefício. Assim, por exemplo, uma estabilização tentada através da restrição do crédito tenderá a deprimir o investimento (pela afectação do volume efectuado por aquela via), mas poderá, muito provavelmente, deixai inalteradas as distorções originadas pela inflação, pois a timidez dos programas estabilizadores (mesmo que eles sejam apreensíveis pelo público em geral) arrisca-se a permitir a subsistência dúvidas sérias quanto ao seu êxito, ainda que essas dúvidas se mostrem objectivamente infundadas e injustas. Ora, se isso se der, podem recomeçar a ser atractivas as formas monetárias e financeiras da detenção de riqueza, que nem por isso o receio de uma nova queda do seu valor real será neutralizado por efeitos positivos sobre a normalidade do investimento, semelhantemente, os investidores continuarão a preferir os títulos estrangeiros aos nacionais. Daí defender-se que é condição fundamental a observar, para o êxito de uma política estabilizadora em desenvolvimento, a possibilidade de o governo convencer a colectividade de que o valor da moeda será mantido a todo o custo.
Este é um campo onde, repete-se, mais do que as simples condições de facto e os esquemas político-económico rígidos, impera a arte, o senso das realidades e da oportunidade dos responsáveis, que não podem menosprezar qualquer dos meios ao seu alcance, pois de todos necessitam para enfrentar «o problema-fantasma» do reajustamento (como já se lhe chamou). E é domínio em que não deve esquecei-se que a política monetária constitui apenas um (ainda que muito importante) dos instrumentos utilizáveis para promover uma razoável, mas necessária, estabilidade - tanto mais indispensável quanto mais vivo for o complexo de condições características do menor desenvolvimento (a combinação de altos