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1758 ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 92

A par das circunstâncias modificativas agravantes comuns, há, como se sabe, na parte especial do Código Penal ou em leis extravagantes, várias circunstâncias modificativas agravantes especiais descritas a propósito de certos crimes49
Estas circunstâncias modificativas agravantes, na medida em que se projectam na medida legal da pena, devem ser excluídas da proibição da reformatio in pejus.
E, pela mesma razão, também interessam ao nosso caso e devem ter o mesmo tratamento as circunstâncias modificativas atenuantes50
Assim, o tribunal de recurso não só pode julgar existente uma agravante modificativa não considerada na decisão recorrida, como também julgar inexistente uma atenuante modificativa aceita naquela decisão.

22. c) Referência especial merece ser feita a atenuação extraordinária da pena, mencionada no artigo 94.º do Código Penal.
Também ela se projecta na medida legal da pena e, por isso, poderia pensar-se que estaria fora da proibição da reformatio.
A verdade, porém, é que ela se situa dentro da atenuação judicial51, e, deste modo, depende do poder discricionáuo do tubunal para atribuir especial valor às circunstâncias atenuantes (ou só a uma delas), quando diminuam por forma essencial o grau de ilicitude do facto ou de culpa do agente.
Entende-se, por isso, que os benefícios - e podem ser em grau muito elevado52 - que tenham sido concedidos ao réu mediante a atenuação extraordinária prevista no artigo 94.º não podem ser retirados pelo tribunal de recurso, sob pena de se frustrar em larga medida a finalidade da proibição da reformatio.

23. De acordo com o que acaba de ser exposto (n.ºs 21 e 22), a Câmara propõe que o § único e o seu n.º 1.º do articulado do projecto de lei sejam substituídos pela forma seguinte
§ 1.º A proibição constante deste artigo não tem aplicação
1.º Quando o tribunal superior qualificar diversamente os factos, nos termos dos artigos 447.º e 448.º, quer a qualificação respeito à incriminação, quer a circunstâncias modificativas da pena.

2) Recurso do Ministério Publico

24. Para que funcione a proibição é indispensável, como vimos, o recurso do réu. Este é, digamos, um pressuposto positivo.
Mas não basta. A proibição pressupõe ainda a inexistência de recurso do Ministério Público ou do assistente, quando o haja no processo - o que constitui um pressuposto ou requisito negativo.
O projecto de lei admite, paia afastar a proibição, um recurso subordinado da acusação (n.º 3 do § único) Não nos diz, porém, as razões de tal orientação. Mas não pode duvidar-se de que se inspirou no processo penal italiano, que consagra o recurso "incidental" do Ministério Público (artigo 515.º, n.º 3, do Código de Processo Penal). Isto mesmo resulta da fundamentação do projecto (parte final do n.º 7.º).
Ora, a razão por que em Itália se admite o recurso "incidental" do Ministério Público é a necessidade de pôr um travão aos recursos temerários do réu, os quais, sem ele, seriam favorecidos e estimulados pela circunstância de só poderem trazer vantagens e nenhuns riscos para o recorrente, com inconvenientes vários protelar a execução da sentença (meio dilatório), provocar inflações de processos nos tribunais, etc.53

25. Justificar-se-á este meio técnico do chamado "recurso subordinado" preferido pelo projecto de lei?
Crê-se que não. E por duas ordens de razões.
Por um lado, não se compreende bem a figura do recurso subordinado em processo penal.
Com efeito, tal espécie de recurso filia-se numa atitude subjectiva das partes, que é a de uma delas recorrer só porque a porte contrária interpôs recurso, pois que, no fundo, preferiria não recorrer, conformando-se, pura e simplesmente, com a decisão. A sua atitude é calculista e de resposta a um recurso (recurso principal), que não desejaria.
Ora esta posição não se harmoniza perfeitamente com a índole do processo penal, sobretudo quanto a actuação do Ministério Público, que deve ser sempre objectiva, ditada pela preocupação da exacta aplicação do direito, e não por razões de oportunidade.
O recurso subordinado parece ser, assim, próprio do processo civil, onde se debatem interesses de carácter meramente privado54
Há, todavia, uma outra razão que desaconselha a solução do recurso subordinado. É que, pelas considerações que a seguir vão ser feitas acerca da eficiência da actuação da magistratura do Ministério Público na 1.ª instância, as instancias superiores. Ver-se-iam na necessidade de determinar aos agentes do Ministério Público que interpusessem recurso subordinado, sempre que o réu recorresse, o que equivaleria pràticamente a destruir toda a proibição da reformatio. E assim se regressaria ao sis-

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49 A premeditação no crime de homicídio (artigo 351.º); o parentesco nos crimes sexuais (artigo 398.º); qualidade de pai ou mãe no parricídio (artigo 355.º), várias circunstâncias nos crimes do furto e roubo (furto qualificado, furto doméstico, roubo qualificado - artigos 425.º, 426.º, 427.º, 428.º, 435.º, etc ) , etc.
50 Entre elas encontram-se a menoridade (artigos 107.º e 108.º), a provocação (artigo 370.º), a revogação do mandato (§ único do artigo 20.º), devendo incluir-se também, segundo alguns autores, a tentativa e a frustração, a cumplicidade, a negligencia e a imputabilidade diminuída. Paralelamente ao que sucede com as agravantes modificativas, também existem vários atenuantes modificativas especiais.
51 Cf Prof. Cavaleiro de Ferreira, ob cit., p. 302
52 A atenuação extraordinária pode levar à aplicação da pena de 2 anos de prisão maior a quem cometer um crime a que corresponda, normalmente, prisão maior de 20 a 24 anos (n.º 1.º do artigo 94.º) ou à aplicação da pena de 1 dia de multa ao autor de um crime a que caiba, ordinariamente, pena de prisão maior até 8 anos (n.ºs 2.º e 4.º do artigo 94.º e Assento do Supremo Tribunal de Justiça de 28 de Julho de 1957).
Só mediante a atenuação extraordinária é possível substituir a pena de prisão superior a seis meses pela pena de multa (n.º 4 do artigo 94.º e artigo 86.º).
Todos estes benefícios e outros resultantes da atenuação extraordinariamente no âmbito da proibição.
53 Cf Pisani, ob cit , pp. 180 e seguintes.
Há nas legislações dos vários países meios diversos de reagir contra estes recursos temerários. Segundo este autor, em França os recorrentes detidos ficam sujeitos, desde logo, ao regime carcerário dos condenados, e não ao regime mais brando dos acusados, na Inglaterra não há desconto obrigatório do período de detenção no cumprimento da pena, noutros países há lugar a condenação em sanção pecuniária no caso de inadmissibilidade ou rejeição do recurso.
54 A jurisprudência dos nossos tribunais superiores não é unânime quanto à admissibilidade do recurso subordinado em processo penal (cf Boletim do Ministério da Justiça n.º 75, p. 503, e Jurisprudência das Relações, ano X, p. 136, e ano XIII, p. 91).
Se no processo penal se enxertar um pedido cível (vide o artigo 67.º do Código da Estrada), então já se compreende a figura do recurso subordinado.