1888 ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 112
gestão financeira, que ao tempo começavam a despontar noutros países e que estão na base dos métodos orçamentais desenvolvidos a partir de 1950. Tem-se, sobretudo, em mente a preocupação do conhecimento de custos e benefícios e o aumento da eficiência das despesas públicas, evidenciada pelo Decreto n.º 16 670.
A respeito da classificação das despesas, introduzidas por aquele decreto, escreveu-se no respectivo relatório « um orçamento nos moldes impostos não só dá uma imagem fiel do valor dos serviços e do seu custo, como vai permitir, pelas comparações que se tornam elementares, os aperfeiçoamentos, queremos dizer, as economias indispensáveis. Uma disciplina forte das despesas orçamentadas, dispostas com a clareza necessária a uma crítica sã, é de si um travão aos desperdícios, o que já era de apreciar, ainda que se não lograssem todas as outras vantagens que uma técnica mais perfeita deve produzir». Evidentemente que a classificação adoptada não permite o cálculo dos custos e benefícios que hoje interessam, mas o certo é ter-se reconhecido a existência de outros objectivos que, na altura, foi necessário sacrificar a fiscalização das despesas.
No mesmo relatório se exprime, ainda, com meridiana clareza, a aceitação da ideia base dos métodos mais avançados que se encontram nos sistemas orçamentais modernos: «no caminho da parcimoniosa aplicação dos dinheiros públicos, em que continua a ver-se uma das mais importantes soluções do problema financeiro, notar-se-á imediatamente que, suficientemente garantida nas nossas leis a correcção «jurídica» das despesas, faltam em absoluto princípios ou instituições que disciplinem ou fiscalizem a sua correcção «económica» ( ). Compreende-se que a contabilidade tem poderes - e é propriamente essa a sua função - para verificar que a classificação foi correcta, havia cabimento de verba, a despesa foi feita pela entidade competente e o pagamento realizado nos termos legais, mas isto, que é interessante na ordem jurídica, tem um secundaríssimo valor na ordem económica, porque, dentro da mais estrita e rigorosa legalidade, a despesa pode ser criticável, comparada com os resultados obtidos e com a utilidade para o serviço e para o público» Por estas razões se dispôs no artigo 16.º do decreto que «os directores e administradores dos serviços são obrigados a aplicar as verbas que fazem face às despesas dos seus serviços de modo a alcançarem um máximo de rendimento útil com o mínimo de dispêndio possível» e se incluiu, entre as funções da Intendência-Geral do Orçamento - serviço criado pelo artigo 21.º do mesmo diploma - «vigiar pela observância do artigo 16.º» e «estudar as fórmulas mais económicas do emprego dos dinheiros públicos, propondo as modificações na organização ou na técnica dos serviços que julgar necessários ou convenientes para que seja observada a maior economia dentro da maior eficiência».
Dado o estado de desenvolvimento das técnicas e métodos orçamentais, pouco se poderia ter acrescentado, então, para aumentar a eficiência das despesas públicas. Todavia, as mais avançadas concepções da reforma não chegaram a ser postas em execução, e por isso, hoje, muito há a fazer neste domínio, a Intendência-Geral do Orçamento teve apenas existência legal, o artigo 27.º do Decreto n.º 16 670 estabelecera que, enquanto não fosse instalada, seriam desempenhadas pela Direcção-Geral da Contabilidade Pública as funções que lhe competiam na preparação do orçamento, para desempenhar essas funções foi criado, por despacho do Ministro das Finanças de 31 de Dezembro de 1988, na Direcção-Geral da Contabilidade Pública, o Serviço de Intendência-Geral do Orçamento, com a aprovação do Regulamento da Direcção-Geral da Contabilidade Pública (Decreto
n.º 43 625, de 27 de Abril de 1961), foram atribuídas àquela Direcção-Geral algumas funções que pertenciam à Intendência- Geral do Orçamento - o Serviço da Intendência-Geral do Orçamento foi extinto, passando as suas funções para a Repartição do Orçamento -, mas não a correcção «económica» das despesas, com o sentido que lhe fora dado pelo Decreto n.º 16 670.
Passaram quarenta anos e o sistema orçamental português - que respondera cabalmente às conveniências da administração pública e se enquadrara nos princípios básicos da teoria orçamental - é hoje um sistema cuja estrutura carece de ser actualizada para poder servir adequadamente os interesses do País.
Actualmente exige-se de um sistema orçamental uma contribuição significativa para que os objectivos que o Governo se propõe, através do processo receita-despesa, sejam alcançados de forma eficiente, para tal, considera-se imprescindível que forneça as informações necessárias à tomada de decisões coerentes com os objectivos, que facilite a execução racional das decisões e que fiscalize e permita o exame crítico da execução.
Em virtude das implicações económicas das receitas e despesas governamentais e do volume de recursos cuja atribuição é feita através do sector público, onde a sinalização dos preços pouco orienta, a teoria orçamental tem vindo a atribuir uma importância crescente à questão da racionalidade das decisões públicas nos diferentes níveis da Administração. Dadas as diferenças de natureza das múltiplas decisões e de níveis a que são tomadas, o sistema orçamental adequado não pode orientar-se para uma única espécie de informações.
A utilização do orçamento com objectivos de estabilização e crescimento económico exige o conhecimento, tão exacto quanto possível, dos efeitos da política orçamental sobre a produção, o emprego, o consumo e o investimento privados, a distribuição do rendimento, a balança de pagamentos e os preços. E informações desta natureza requerem uma classificação económica das operações orçamentais.
As decisões das assembleias representativas e ao alto nível do Executivo, bem como os pareceres dos órgãos consultivos, relativamente aos serviços a prestar à colectividade com a produção nacional retirada pelo Estado a utilização privada, exigem que as despesas públicas sejam agrupadas segundo a natureza das funções que visam satisfazer.
A escolha racional entre programas alternativos que permitam alcançar determinado objectivo requer que o sistema orçamental revele os respectivos custos e utilidades. Este aspecto está na base das profundas alterações dos métodos orçamentais ocorridas a partir de 1950 e reveste-se de importância extraordinária nos países em vias de desenvolvimento, onde os problemas de eficiência na utilização dos limitados recursos financeiros disponíveis sobrelevam todos os outros.
As muitas experiências já realizadas em vários países e os resultados obtidos testemunham que o calculo económico, durante muito tempo julgado aplicável apenas a economia privada, pode e deve em muitos casos ser utilizado como orientador da afectação de recursos realizada pelo sector público. Trata-se do reconhecimento de que «o problema orçamental do Estado é semelhante ao de uma empresa privada, um e outro devem afectar recursos escassos em empregos concorrentes» 1 .
1 Edgard Andréam «Une révolution budgétaire? Le Planning-Programming Budgeting System», Revue de Science Financiére, avril-juin, 1968.