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10 DE DEZEMBRO DE 1940 105

tido da palavra, Botelho Neves era efectivamente, dentro da Assemblea, um combatente do bom combate, um seguro e leal servidor do Estado Novo, um convicto e devotado cooperador da política de Salazar.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Presidente: - Um dos traços dominantes da sua psicologia era a exuberância de pensamento e do acção. Vi-o algumas vezes no calor da discussão e no entusiasmo da refrega dar expansão aos seus sentimentos inflamados e viris; mas, mal eu esboçava uma palavra de ordem ou um gesto de disciplina, logo o alvorôço cedia e o tumulto se aplicava. É que em estruturalmente um combatente de boa-fé.
Apoiados.
Em nome da Assemblea Nacional inclino-me respeitosamente e com a mais sentida mágoa e saudade perante a sua memória.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Cancela de Abreu: - Sr. Presidente: sinto que o meu cérebro não é capaz de bem alinhavar as poucas palavras que desejaria proferir, adequadas aos sentimentos de dor e de saudade que, de facto, dominam o meu coração.
Seja, porém, como fôr, pretendo reagir dentro dessa comoção ou dêsse desalento.
Conheceu V. Ex.ª, Sr. Presidente, o engenheiro Botelho Neves desde o começo da primeira Legislatura da Assemblea Nacional, há meia dúzia de anos. E quási todos os membros desta Assemblea o conheceram de então para cá. Êsse curto período bastou, porém, para que o engenheiro Botelho Neves tivesse conquistado, como V. Ex.ª acaba de traduzir muito bem, a sua admiração, a sua simpatia e a sua estima, que direi eu, Sr. Presidente, que lidei com o engenheiro Botelho Neves durante quási trinta anos de vida os melhores anos da vida!
A camaradagem da escola, o convívio posterior nas lides do trabalho ou nas horas de despreocupação, a solidariedade das convicções políticas e dos princípios morais deram-mo bem a possibilidade de conhecer profundamente esse conjunto de virtudes e qualidades que V. Ex.ª já focou..
Pretendo apenas, de entre elas, destacar duas: a da sua lealdade sem reservas com amigos e com adversários e a da sua extraordinária coragem moral, coragem moral da proclamação desassombrada das suas opiniões claras. Coragem moral das atitudes arriscadas!
Apoiados.
Foi especialmente agitada a vida académica do nosso tempo. Uma série de reacções salutares movimentou nesses anos a Academia de todo o País. Em especial para nós, estudantes de engenharia, houve luta acesa para salvaguarda das justas prerogativas da escola que cursávamos.
Estivemos em foco e em risco. Pois o Pedro Botelho Neves foi dos mais ardorosos, foi dos que andavam na frente, foi dos mais combativos e dos mais ousados. A sua vivacidade arrastava os mais cépticos; a sua firmeza dava exemplo.
E nesses anos ou nessas ocasiões, em que só forma o carácter e se começa a ser homem, o carácter do nosso colega definiu-se como da têmpera mais rija; e a qualidade do homem que começava foi posta à prova, o logo se revelou como a mais digna e a mais nobre.
Uma forte solidariedade ficou ligando, desde então, pela vida fora, todos os que então mais convivemos, possuídos da mesma fé, vibrando nos mesmos entusiasmos, unidos nos mesmos impulsos. ¡Que mágoa e que saudade me faz o recordar agora o Pedro Botelho Neves daquele tempo!...
E fico-mo nessa recordação, Sr. Presidente. Não posso passar além. Limito-me à nota pessoal destas poucas palavras.

Vozes:- Muito bem, muito bem!

O Sr. Favila Vieira: - Peço a palavra.

O Sr. Presidente:- Tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Favila Vieira: - Mal pareceria a mim próprio que não me associasse expressamente às sentidas afirmações de saudade e de apreço com que V. Ex.ª Sr. Presidente, e o Sr. Deputado Cancela de Abreu acabam de evocar a memória do nosso querido colega Botelho Neves. O silêncio nas presentes circunstâncias, no ambiente criado por V. Ex.ªs, não se ajustaria à minha natural expressão afectiva, aos meus vivos sentimentos de pesar.
Assinalaram V. Ex.ªs, comovidamente, com aquela elevação que é timbre desta Assemblea, as qualidades pessoais e políticas, a excelente camaradagem do engenheiro Botelho Neves. Senti, por momentos, a sua presença nesta casa, o contacto do seu espírito simples, generoso, comunicativo. Êle era, de facto, assim: um temperamento de acção irradiante, que se exprimia com o desassombro de quem não obedece às conveniências pessoais, mas às suas convicções e ao seu modo de ser. Desprendido, espontâneo, combativo, a sua projecção na vida correspondia fielmente à sua personalidade.
Servimos como secretários da Mesa na última Legislatura. Nunca entre nós se abriu um conflito ou criou uma situação equívoca, a despeito da diferença marcada dos nossos temperamentos. As nossas relações eram dominadas por um espírito de perfeita camaradagem.
Aqui o conheci e me tornei um dos seus amigos; aqui presto à sua memória a minha afectuosa homenagem.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Proença Duarte: - Sr. Presidente: nada tenho a acrescentar às referências aqui feitas ao nosso saudoso colega engenheiro Pedro Botelho Neves. Há, no entanto, uma razão de ordem especial que não me deixa ficar calado neste momento.
Fui colega de Pedro Botelho Neves nesta mesma casa, no chamado Parlamento de Sidónio Pais, e quero relembrar aqui um episódio que bem acentua uma das facetas do seu carácter.
Num momento em que eu tive de fazer uso da palavra sobre qualquer assunto que então excitou as paixões políticas daqueles que enchiam as galerias e nos eram adversos, e as galerias pretendiam descer a esta sala para quaisquer fins agressivos, estabeleceu-se à minha volta uma clareira. Houve, no entanto, dois Deputados que de mim se aproximaram: Botelho Neves, que se chegou a mim, me animou e me disse que podia contar com ele para todas as emergências, e Domingos de Magalhãis, que ainda, está vivo. Relembro, nesta ocasião, esta sua lealdade, para confirmar aquilo já acentuado pelo nosso colega Sr. engenheiro Cancela de Abreu - essa sua energia, que não recuava perante nenhum perigo.
Atravessou este período agitado da nossa vida política sempre nas primeiras linhas, e conseguiu partir da vida com o nome Limpo e aureolado; conseguiu partir da vida sem que essas lutas, por vezes ferozes e agitadas, tivessem em alguma cousa deminuído o seu nome, o seu carácter, a sua honra e a sua dignidade.
Inclino-me perante a memória de Pedro Botelho Neves.
Tenho dito.