2 DE MARÇO DE 1944 179
E, a propósito, lamento que circunstâncias de fôrça maior não me tivessem permitido comparecer à sessão de ontem, pois do coração me teria associado às palavras aqui tam oportuna e merecidamente pronunciadas sôbre o deplorável incidente ocorrido num pôsto fiscal do Pôrto com o nosso simpático e ilustre colega Dr. Albano de Magalhãis, justamente quando êle tratava do despacho de uma remessa de vinho destinado à Legião Portuguesa, isto é, a essa magnifica instituição da defesa civil, que, simultâneamente, é a providência da pobreza do grande burgo portuense, à qual distribuo diàriamente muitos milhares de refeições.
Sr. Presidente: não bastavam as guias que acompanhavam o vinho, rio abaixo, e num pitoresco barco rabelo, desde as longínquas terras de Resende. Fôrça era que o barco parasse em determinado pôsto fiscal ribeirinho, para obter novas guias, e não sei que mais...
E como parece que a formalidade, possìvelmente por desconhecimento de tal exigência, não fôra cumprida, teria o barco de regressar ao referido pôsto, não se tendo em conta os transtornos, demoras e despesas assim criadas.
Sr. Presidente: não será tempo de reduzir ao estritamente indispensável a série interminável de pelas que entorpecem o trabalho nacional?
E não será tempo, também, de cercar os Deputados, que representam toda a Nação Portuguesa, do prestígio devido às altíssimas funções do exercício da soberania nacional em que estão investidos?
Sr. Presidente: impõe-se que o Deputado, ao revelar o seu mandato, seja perante quem fôr, tenha a certeza de que as funções que exerce serão imediatamente cercadas do acatamento devido à Nação, que representam.
Registo com todo o aplauso e reconhecimento o que o Sr. Presidente nos disse sôbre a nobre atitude do Sr. Ministro das Finanças no incidente deplorável com o Sr. Dr. Albano de Magalhãis.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Vinha eu dizendo que em 1935, ao discutir os referidos preceitos restritivos sôbre plantio de videiras, eu contestara a existência de sobreprodução, chamara a atenção do Govêrno para a defesa do vinho - cultura que tanta mão de obra ocupa e bebida que a todas sobreleva pelas suas indiscutíveis vantagens para a saúde da população -, contra a concorrência de outras bebidas que, não tendo as vantagens apontadas, são por vezes nocivas.
Pus em evidência que em certas regiões, especialmente na parte norte do País, não seriam viáveis os novos arroteamentos que o aumento da população exige, se fôsse ali defesa a plantação de videiras.
Defendi todas as providências tendentes a melhorar a qualidade, mas mostrei a justiça de se permitir que o vinho americano produzido em áreas muito restritas, junto dos casais e devidamente demarcadas, fôsse consumido exclusivamente nas respectivas casas de lavoura.
Outras considerações fiz, que seria longo repetir, terminando por afirmar que considerava a referida proposta sôbre restrições de plantio como remédio de urgência e de carácter transitório.
O Govêrno foi sucessivamente suavizando á violência das medidas então ordenadas e, volvidos cêrca de oito anos de limitação da cultura vitivinícola, a que o nosso clima é tam propício e que na terra portuguesa encontra as melhores condições de viabilidade, surge agora o citado decreto-lei a remover algumas daquelas restrições, reconhecendo finalmente que a população tem aumentado, e concomitantemente a capacidade de consumo de vinho, que as possibilidades de exportação são favoráveis, e ali se disse, infelizmente com verdade, «que se verificara terem desaparecido os povoamentos regulares da vinha, apesar de a lei permitir a sua reconstituição».
Permitia sim, mas com tais restrições e tantos embaraços burocráticos e tantas e escusadas delongas, que não só era de prever, mas aos conhecedores da vida agrícola não restava a menor dúvida de que os citados povoamentos regulares sofreriam notòriamente, resultando daí o declínio dum precioso e tradicional campo de actividade e grande fonte de riqueza, em que Portugal, pelas suas excepcionais condições, deveria manter sempre o primeiro lugar na concorrência internacional.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Quanto tempo se perdeu!
Sr. Presidente: num boletim económico publicado há cêrca de duas semanas li que «os esforços realizados na Europa com o objectivo de aumentar a economia vinícola são muito numerosos e vastos, nomeadamente no sudeste, e conduziram a uma perfeita reorganização de toda a cultura da vinha, cujos efeitos já hoje são visíveis em todo o mercado europeu».
Entre outros, cita-se a Hungria, onde a vinicultura tem sido sistemàticamente protegida pelo govêrno com garantias de financiamento e outros apoios; a Bulgária, onde a área de plantio subira e cujo govêrno dispõe de campos experimentais para melhoria da cultura da vinha com a área de 160 hectares; a Grécia, onde se verifica a política de expansão da cultura da vinha, com apoio às corporações de viticultores; a Roménia, onde a regeneração dos vinhedos é cercada da concessão de créditos, estando o Ministério da Agricultura autorizado, a mandar proceder àqueles trabalhos por conta do lavrador se a referida regeneração não tiver o êxito necessário; a Espanha, onde se verifica um forte aumento da cultura vinícola, etc.
Quere dizer, Sr. Presidente: emquanto a cultura da vinha progredia por quási toda a Europa, em Portugal verificava-se, infelizmente, que iam declinando os povoamentos regulares das nossas vinhas, isto é, das melhores vinhas do mundo!
Apoiados.
Felizmente - mais vale tarde que nunca - surge agora, e em boa hora, o diploma que venho glosando sôbre plantio de videiras.
Lamento que a Assemblea Nacional não tenha de intervir na sua discussão, pois proporcionar-nos-ia ensejo para o seu estudo pormenorizado, a fim de bem colaborarmos com o Govêrno na execução das nossas funções legislativas.
Contudo, da leitura rápida daquele diploma registei que o Govêrno afirma que a deminuição das restrições de plantio de videiras poderia comprometer outras culturas de géneros indispensáveis. Se tal receio pode alimentar-se no que respeita a certas regiões, posso afirmar que na parte que interessa a quási todo o norte do País, especialmente no Entre-Douro e Minho, as restrições e, sobretudo, as formalidades e demoras verificadas na concessão de licenças determinaram grande atraso nos arroteamentos, a que ali ninguém se lançaria sem ter a certeza de, simultâneamente com a cultura de cereais, poder cultivar videiras.
Ora aquela importuna política de restrições, agora felizmente muito atenuada, privou toda aquela vasta região de novos casais ou do conveniente aumento de outros, que muito concorreriam neste momento para deminuir as dificuldades de abastecimento com que a população se debate.
Apoiados.
Sr. Presidente: na rápida leitura feita verifiquei que no artigo 1.º são multados draconianamente os proprietários de produtores directos, com excepção das ramadas