104-(2) DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 62
eram já de si muito complexas e de uma natureza completam ente diferente para que pudessem ser desempenhadas com tempo e aptidão pelo mesmo indivíduo»;
d) Ainda que àqueles presidentes assista a faculdade de delegação, nos vice-presidentes, dos poderes de sua competência como magistrados administrativos e autoridades policiais, tal substituição «não se tem mostrado muito compatível com os princípios de independência e de autoridade dentro da boa disciplina administrativa»;
e) A crescente importância das funções policiais concelhias é um facto que já determinou a criação em cada concelho -pelo decreto n.º 4:166, de 27 de Abril de 1918, não regulamentado- de um lugar de comissário de polícia municipal;
f) Sendo indispensável ensinar os princípios da organização corporativa autodirigida, «mais se torna necessário que não se quebre a tradição de força e de protecção que andou sempre ligada ao nome dos administradores de concelho;
g) «A bom das normas administrativas», e visto que o presidente da câmara municipal não pode « fiscal fixar-se II si próprio», voltará a criar-se o lugar do administrador de concelho, ainda para o efeito de cumprindo-lhe assistir sempre às sessões municipais, promover o cumprimento de todas as obrigações camarárias e informar o governador civil de todas as deliberações contrárias à lei ou ao interesse público;
h) A recriação do cargo de administrador de concelho ainda se justifica «dado que a experiência dos últimos anos tem demonstrado que não se obtiveram os resultados esperados da supressão dos lugares de administradores de concelho ou, melhor, da forma da sua substituição».
Ainda no preâmbulo do projecto em referência o digno Deputado, seu autor, apoia a remuneração das funções e o encargo do respectivo pagamento, previstos no artigo 3.º, com as considerações de que, a exigindo-se graves e pesadas responsabilidades aos administradores de concelho, que por vezes têm de expor o seu sossego e até a própria vida para bem cumprir, é de justiça que se lhes concedam os meios necessários à sua categoria funcional e aos serviços prestados, o que ficará a cargo das câmaras municipais, como sempre esteve».
Finalmente, vê-se do relatório que o ilustre apresentante do projecto, desejando o restabelecimento do cargo de administrador de concelho, visa uma solução de o inergência «enquanto não se procede à revisão do Código Administrativo».
3. Posto isto, passemos agora à apreciação do projecto.
No parecer da Câmara Corporativa sobre a proposta de lei n.º 73, ou seja a proposta-base do Código Administrativo de 1936, o problema da supressão do lugar de administrador de concelho foi discutido e resolvido com a clarividência, a penetração e o saber peculiares ao eminente relator.
Ganha-se transcrevendo alguns passos do citado parecer. Neste, em comentário à base VITI da referida proposta de lei, manifestava-se de começo o convencimento de que levantaria oposição «a morte dos administradores de concelho», isto é, «o facto de na mesma pessoa acumularem duas situações: a de presidente da câmara e a de magistrado administrativo», ou ainda, se se quiser, «o facto de o presidente da câmara ser, no concelho, o representante do Poder central».
Como explicação da oposição prevista, acrescentava-se:
E não admira.
Nasceu a dualidade das magistraturas, sendo, portanto, velha de um século.
Todos os nossos Códigos Administrativos a sancionaram, falando no administrador de concelho, como o decreto n.º 23 de 16 de Maio de 1832 a havia sancionado, falando no provedor.
E logo o mencionado parecer esclarecia, a todas as luzes de um profundo conhecimento do direito administrativo português e do direito comparado, que:
Não inovava quem propugnava uma organização monista, pois esta era o regime em vigor quando da revolução de 1830;
Nem todos os defensores do liberalismo se mantiveram fiéis ao sistema dualista, e para o comprova: invocavam-se os nomes de Fernandes Coelho, Almeida Garrett, Anselmo Braamcamp e Jacinto Nunes;
Mesmo dentro dos quadros republicanos não só estava em face de uma novidade, porquanto logo no projecto de Código Administrativo elaborado pela comissão nomeada por decreto de) de Outubro eram abolidos os administradores de concelho) e transferidas as suas atribuições, nos concelhos não capitais de distrito, para as comissões executivas das câmaras e seus presidentes, aos quais o projecto chamava «representantes do Poder Central», competindo as funções policiais, nos concelhos capitais de distrito, aos governadores civis e, nos outros concelhos, às comissões executivas e seus presidentes;
Não obstante a lei n.º 621, de 23 de Junho de 1916, no artigo 26.ª, não fazer do presidente das comissões executivas um magistrado administrativo, não deixa, contudo, de lhe dar competência para «substituir os administradores dos concelhos», podendo assim acumular, ainda que transitoriamente, o exercício de ambas as funções;
Nos «figurinos estrangeiros», ou sejam certas autoridades referidas no parecer, com exercício de funções similares em Espanha, França, Itália, Bélgica, Holanda e Dinamarca, encontrava a proposta governamental modelos aproximados.
Depois de no aludido parecer se notar que Lobo de Ávila, apologista do sistema da dualidade, em oposição a Garrett, reconhecia, todavia, o desacordo da legislação do País com a geralmente emitida nos outros povos, surgia naturalmente a pergunta sobre se era de aplaudir a doutrina da base em apreciação.
A defesa, feita brilhantemente, encontra-se a p. 446-Q do Diário tias Sessões, suplemento ao n.º 75, de 8 de Fevereiro de 1936, e, dada a sua oportunidade, muito convém trasladar para aqui alguns excertos.
A acumulação das funções municipais e administrativas em um único funcionário, escrevia Fernandes Coelho, não é só conforme aos nossos antigos usos e ao que se acha estabelecido nos demais países constitucionais, mas facilita o expediente dos negócios; toma mais compacta a administração pública pela ligação e unidade que lhes dá, e põe termo aos conflitos de autoridade e jurisdição que constantemente aparecem entre as câmaras e os administradores de concelho.
Não se vê razão decisiva que legitime a existência de duas autoridades: o presidente da câmara e o administrador.
A unificação, neste caso, só pode contribuir para fortalecer o prestígio do presidente, que no concelho deverá apresentar-se como o mais incontroverso depositário da autoridade.
Em seguida à demonstração da necessidade de serem exceptuados os concelhos de Lisboa e Porto quanto ao