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19 DE JUNHO DE 1951 1019

As palavras que tive a honra de proferir nesta tribuna em justificação da alteração apresentada e unanimemente votada constam do Diário das Sessões a fl. 393 e parecem-me, ao relê-las ainda agora, inteiramente claras.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Estávamos em face de um falso paralelismo que arrastara o legislador a equiparar os sessenta dias que vão além da eleição realizada no termo normal de um mandato, até à tomada de posse, com um prazo de sessenta dias, considerado como o máximo, dentro do qual teria de fazer-se em todas as hipóteses de interrupção a eleição de um novo Presidente.
Para valer à insuficiência deste prazo, três soluções poderiam encarar-se:

a) A simples fixação de um prazo mais largo, de noventa ou cento e sessenta dias, por exemplo;
b) A manutenção do prazo que existia, permitindo-se, porém, quando os interesses do País o aconselhassem, o seu alargamento até determinado limite, à semelhança do que no § único do artigo 87.º da Constituição se estabelece para a eleição da nova Assembleia Nacional no caso de dissolução da anterior;
c) Finalmente, a solução que veio a ser adoptada, de confiar à Assembleia Nacional, em cada caso, a faculdade de deliberar sobre u nova eleição presidencial.
Mostrei nesta tribuna que a adopção de qualquer prazo fixo para a realização obrigatória da nova eleição presidencial, na hipótese de interrupção do mandato, não podia resolver satisfatoriamente o problema, porque, consoante a variedade das situações e a gravidade dos problemas que uma interrupção inesperada pode suscitar, qualquer prazo fixo poderia sempre vir a revelar-se insuficiente ou excessivo.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - E como em decisão tão grave e de tamanho interesse para os destinos nacionais, nem a insuficiência nem o excesso seriam de admitir, mais conveniente se afigurava confiar à Assembleia Nacional o ponderar e deliberar em cada caso de harmonia com as circunstâncias.
Esta era, aliás, a solução adoptada para casos semelhantes por outras constituições, como a de Weimar e a da Argentina, aprovada em Março de 1949, e esta mesma solução parecia - disse aqui em 24 de Abril - a mais lógica à face dos princípios e a de mais natural e legítimo enquadramento na nossa orgânica constitucional. Vê-te agora que nem todos assim o entenderam.
Mas que razões graves se opuseram para fundamentei r as discordâncias?
Segundo podemos colher da nota da Presidência do Conselho:
a) Julgariam alguns preferível a marcação de um prazo limite, à semelhança do previsto no § único do artigo 87.º Mas creio que do texto votado não resulta uma ilimitação de prazo, porque, sendo de sete anos a duração constitucional de cada período presidencial, a sua interrupção inesperada fixa desde logo um prazo que vai até ao termo normal do mandato interrompido e é dentro deste que a Assembleia poderá deliberar de harmonia com os interesses superiores da Nação. Do texto votado não resulta, portanto, uma ilimitação de prazo;
b) Duvidam outros porém, ao que parece, da competência da Assembleia, ou da sua prudência política para usar, na justa medida dos interesses nacionais, da faculdade que o novo texto lhe concede.

O Sr. Botelho Moniz: - Isso é o que dizem os manifestos comunistas.

O Orador: - Terá esta dúvida sério fundamento?
Uma interrupção inesperada do período presidencial faz surgir imediatamente um problema de continuidade, mas esta, como tive ocasião de dizer nesta tribuna, parece-me mais perfeitamente assegurada pelo sistema da nossa constituição, que atribui desde logo ao Presidente do Conselho as funções de Chefe do Estado, do que pelo recurso a um vice-presidente, adoptado pelas constituições presidencialistas americanas. Mas é preciso, por outro lado, evitar que a concentração de funções possa perdurar além do tempo conveniente ou contra o sentir geral da Nação. Mas creio ainda que nenhum outro órgão mais competente e adequado para impedir estes possíveis abusos do que um órgão da soberania que tem a mesma origem electiva do mandato presidencial e é, no jogo político da nossa constituição, independente do órgão do Governo.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - À face da lição que nos fornece a história política, não há que ter receio de que uma assembleia electiva, em que mais facilmente se reflectem as correntes da opinião pública, possa tender a apoiar um excesso de concentração do Executivo contra o sentir geral da Nação. O contrário é que seria de recear e mais acomodado porventura à nossa pior tradição política.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Informa-nos finalmente a nota da Presidência ter havido quem descortinasse no novo texto do artigo 80.º interpretações que poderiam permitir à Assembleia, além do alargamento do prazo, substituir a própria forma da eleição, ou votar leis de sucessão presidencial.
Tais audácias jurídicas não tiveram, porém, nem podiam ter expressão nem sentido dentro desta Assembleia. Investida de poderes constituintes, tinha acabado de votar o artigo 72.º em que se estabelece a norma geral do Chefe do Estado eleito pela Nação, por sufrágio directo e para um período de sete anos.
Como poderia, pois, ao falar-se no artigo 80.º em deliberar sobre uma nova eleição presidencial, supor-se ou entender-se uma eleição presidencial que se afastasse da forma prevista e sancionada no artigo 72.º?
As palavras que em 24 de Abril proferi nesta tribuna tornavam aliás este sentido impossível, pois aqui afirmei que nas deliberações a tomar nesta matéria a Assembleia usaria dos seus poderes representativos e fiscalizadores, excluindo assim os legislativos.
O sentido da votação desta Assembleia foi, portanto, claro e isento de dúvidas. E também as não poderia suscitar a aplicação que viesse a fazer-se à hipótese já conhecida e presente ao fazer-se a votação. Tudo dependeria das circunstâncias que pudessem verificar-se. O sentimento nacional claramente exprimia, por então, consoante reconhece a nota da Presidência, duas correntes:
a) Uma, e a maior de todas, aspirava a ver como indiscutível candidato à Presidência da República S. Ex.ª o Presidente do Conselho. Esta solução era julgada, como reconhece a mesma nota, a mais lógica, simples e segura.

Vozes: - Muito bem!