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18 DE ABRIL DE 1952 721

Resultado: é normal fazer-se a viagem Barreiro-Lisboa ou vice-versa em pé e, nos dias de mau tempo, mais de metade dos passageiros vêem-se obrigados a fazer aquela viagem fustigados pelo vento e pela chuva, porque é reduzidíssimo o espaço coberto e convenientemente defendido do tempo.
Note-se ainda que dos quatro barcos em serviço um data de 1900, dois de 1923 e mesmo o mais novo foi construído ë entrou em serviço em 1931, o que representa, mesmo para este, mais de vinte anos de aturado e constante serviço. Deus permita que deste estado de coisas não resulte grave ocorrência que muito tenhamos de vir a lamentar ...
Mas há ainda mais.
Não existe um barco de reserva. Quando algum dos que estão em permanente serviço se avaria - e ainda há poucos dias isto sucedeu - há que aguardar que um dos outros três se liberte do serviço a que está adstrito para vir fazer a carreira do barco adoente», o que provoca sempre graves e aborrecidos transtornos aos passageiros, aborrecimentos que são horríveis se a espera tem de se fazer na estação do Barreiro, onde existe uma sala única para todas as classes, sala aliás pequeníssima e sem quaisquer condições de comodidade.
Os números que atrás citei demonstram claramente se não se trata duma exploração deficitária. O número de passageiros tem vindo sempre a aumentar em ritmo seguro e certo. Em 1930,1.196:000; em 1940,1.417:000; em 1950, 2.286:000, e em 1951, 2.317:000.
Para as graves deficiências que se verificam nem sequer, suponho, se pode invocar o velho e estafado argumento da exploração deficitária!
Não é possível, Sr. Presidente, na realidade, transportar mais 1.121:000 passageiros conservando o mesmo número de barcos, com igual número de carreiras e a mesma lotação. Infelizmente posso, Sr. Presidente, testemunhar esta impossibilidade pelo conhecimento pessoal e directo que tenho dos factos.
Solicito, Sr. Presidente, enérgicas, prontas e urgentes providências do Governo no sentido de este serviço público passar a satisfazer, como lhe cabe, a comodidade e a segurança dos que se vêem obrigados a utilizá-lo.
Comigo, estou certo, solicitam essas providências os 2 milhões de passageiros que no último ano tiveram de fazer, no trato da sua vida, o trajecto que liga, por via fluvial, o Barreiro a Lisboa.

Vozes: - Muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Vai entrar em discussão, na generalidade, a proposta de lei relativa às normas a observar na atribuirão e utilização de viaturas ligeiras e automóveis oficiais.
Tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Cancela de Abreu.

O Sr. Paulo Cancela de Abreu: - Proponha-me ocupar-me com certo desenvolvimento desta proposta do ilustre Ministro das Finanças sobre a atribuição e utilização dos automóveis do Estado, das autarquias locais e dos organismos corporativos e de coordenação económica. O problema é mais vasto e sério do que a muitos pode afigurar-se, dadas a sua gravidade e larga projecção na opinião pública; e a sua história vem de longe. Seria interessante e proveitoso desenvolvê-la nos seus pormenores, a partir do regime político anterior ao 28 de Maio, pois os usos e abusos vêm desde então, e progrediram na razão directa do aperfeiçoamento e desenvolvimento dos transportes mecânicos e da multiplicação e evolução dos serviços públicos.
Não me é fácil, porém, realizar o meu intento porque o tempo escasseia-nos, e é preferível abreviar a discussão do que adiar para outra sessão legislativa, isto é, por cerca de oito meses, uma lei moralizadora, cuja urgência votámos por unanimidade.
Também, como é compreensível, o Ministério das Finanças não pôde enviar a tempo as minuciosas e importantes informações que solicitei quando a proposta foi apresentada, e muito serviriam para esclarecer a Assembleia e o País sobre o que se passa em relação ao número e modo de utilização dos automóveis oficiais e seus encargos.
Nestas condições, não estou suficientemente documentado para apontar e acusar os responsáveis, sejam eles quem forem, doesse a quem doesse. Não desejo ser precipitado e receio ser injusto; mas não perdem com a demora. Voltarei ao assunto mais tarde. Será uma justificação póstuma desta lei e do correspondente decreto regulamentar, que esperamos seja publicado brevemente, dadas as razões que o digno Ministro das Finanças alega no seu lúcido relatório.
Esta proposta, que revela os bons propósitos do Governo, seria, porventura, desnecessária, porque na legislação vigente, e nomeadamente no Decreto n.º 26:526, de 17 de Abril de 1936 - faz hoje precisamente dezasseis anos -, existem disposições sobre o assunto, que bastaria actualizar e completar. Mas o relatório da proposta aponta motivos dignos de ponderação e leva-nos, infelizmente, à lamentável conclusão de que a lei não se cumpre e ao seu cumprimento se opõem resistências ou obstáculos que ficam fora da jurisdição daquele Ministério e, portanto, tornam irrelevante qualquer actuação.
Mas, já que a Assembleia Nacional é chamada a tomar posição, esta, a meu ver, devo ser no sentido de aconselhar, de incitar o Governo a legislar em ordem a evitar de vez os maus exemplos e a tornar-se cada vez mais implacável na exigência do cumprimento da lei e na repressão dos abusos de que a imprensa há muito vem fazendo-se eco, punindo disciplinarmente os responsáveis e sem prejuízo do decreto a publicar- anulando desde já a atribuição de automóveis às pessoas ou entidades a que lhes não conferem direito aquele Decreto n.º 26:526 e a legislação complementar.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Porque assim não se fez até agora, os abusos aumentaram. Devemos reconhecê-lo a bem da verdade; e temos de lamentá-lo.
Sem embargo, os últimos abencerragens do regime democrático ou os que ainda sonham com a renovação da dolorosa experiência demagógica não têm autoridade; para sentir engulhos com o que se está passando, pois nisto de transportes bastam para impor-lhes silêncio os marítimos do Estado de triste memória, para não falar noutros escândalos por motivo dos quais o seu antigo Presidente do Ministério engenheiro António Maria da Silva a cuja memória presto homenagem- proclamou em plena Câmara dos Deputados que o País estava a saque.
E o mais grave é que, nesse tempo, tudo culminava quase sempre num escândalo ainda maior e de mais larga repercussão, pois afectou os governos e, com eles, o regime. Quero referir-me à impunidade.

Vozes: - Muito bem!