364 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 182
e nunca um benefício extensivo a todos. Isto no campo do egoísmo e da prosápia.
Mas no campo do temor pela instrução colectiva já aqui o referiu brilhantemente o Sr. Deputado Melo e Castro.
Quem, como eu, tenha vivido num meio estruturalmente rural sabe qual a força negativa desse egoísmo e desse temor.
Têm sido estes dois factores sério obstáculo à difusão da instrução pública nos meios rurais.
É lugar comum afirmar-se quê a instrução é espada do dois gumes.
É missão indeclinável da escola - portanto do educador - utilizar o melhor gume dessa espada no desbaste cerce da mentira e no desnudar da verdade deslumbrante.
Por outro lado, estou sinceramente convencido de que é mais permeável ao erro e ao mito aliciante e deletério o cérebro mergulhado na ignorância do que o espírito esclarecido e orientado por um bom educador.
É certo que há muitos obstáculos a transpor e vencer. Mas os obstáculos foram sempre um estímulo para a acção. Tudo depende, pois, da acção do Governo,
que, como em outros sectores tem demonstrado, não afrouxará; mas tudo dependerá, e em grande escala, também da acção colectiva, que é lógica consequência do uma posição de espírito nacional, que urge preparar e fomentar.
A acção do Governo na expansão do ensino primário tem vindo a desenvolver-se principalmente a partir de 1940, com o Plano dos Centenários, plano que se encontra em franca execução.
Basta relembrar o que se consubstancia na construção em larga escala de edifícios escolares e aumento substancial de agentes de ensino. Propunha-se o Governo aumentar o quadro - então do cerca de 10 000 professores - para 14 000.
Em agentes de ensino este número está ultrapassado, pois pêlos dados de Março e Junho do ano corrente atingiu-se o total de 15 631.
K de reconhecer que dentro desta soma há que destrinçar professores diplomados e regentes escolares. Assim, verifica-se que os diplomados totalizavam em Junho passado 12 041 e os regentes 3 590 - total, repito, 15 631. Apenas por curiosidade, se me permitem, informarei que, dos 12 041 professores diplomados, 9 564 são mulheres e apenas 2 477 são homens; dos 3 590 regentes escolares, 3 458 são mulheres e somente 132 são homens.
A anomalia destes números, ou seja a acentuada escassez de professores masculinos, confirma e realça o que atrás disse sobre a situação económica do professorado primário.
Mas deixemos este aspecto desagradável da questão, aliás já versado, para encararmos apenas os números, por si bastante elucidativos.
Pelo bem elaborado e sugestivo relatório que antecede o decreto-lei sobre a obrigatoriedade do ensino se colhe o número de crianças em idade escolar -entre os 7 e os 11 anos - no ano de 1950: 768 271 crianças de ambos os sexos.
Ora, tomando por divisor 40, que é o número mínimo de alunos, assaz excessivo, para cada professor, conclui-se que eram em 1950 necessários 19 206 professores.
Se a população cresce no ritmo de 70 000 indivíduos por ano, temos de adicionar àquele número de crianças corça de 140000 indivíduos que alcançaram a idade escolar, o que significa um aumento de necessidade de professores de cerca de 3 000.
Se a população matriculada nas escolas do País orçava no ano transacto por 650 000, e admitindo uma distribuição simétrica, caberia a cada professor 42 alunos.
Se, como é na realidade, os postos escolares funcionam muitos com 15 a 25 alunos, temos que a média de alunos nas escolas regulares teve de ultrapassar, e muito, a média de 40 por cada professor.
Foi sem dúvida por isso que o ilustre Subsecretário de Estado da Educação Nacional teve de ir, corajosa e abertamente, para a criação de lugares de professores e de novas escolas e postos escolares em quantidades substanciais em quase todos os distritos e para uma redistribuição de alunos das mesmas escolas por vários lugares existentes ou a criar ou ainda pelas escolas mais próximas dentro de cidades e vilas.
Que nesta ingrata missão de melhor arrumo e aumento de lugares não faltem a Sua Excelência os favores do orçamento, nem as possibilidades locais para tão grande e útil cometimento.
Do que sinteticamente expus julgo que se depreende facilmente o grau de acuidade da obrigatoriedade efectiva da frequência à escola, quando escasseiam ainda, infelizmente, agentes para ensinar e locais onde ensinar, em face da elevada população escolar sobrante das escolas e professores.
Portanto, a obrigatoriedade escolar tem fatalmente de ser posta em execução com prudência, embora sem desânimo, na medida em que se forem debelando os factores que a limitam, e que desgraçadamente são muitos, além dos dois atrás citados.
As cantinas serão um grande elemento de atracção à escola dos economicamente débeis. O encurtamento de distâncias e facilidades de transporte e até - parece ridículo dizê-lo! - a construção de passadiços de madeira sobre ribeiras, que em muitos dias do ano cortam a possibilidade de ir à escola, ajudarão a solução do problema.
Enfim, da soma dos esforços e actuação de todos, Estado e particulares, resultará seguramente o êxito desta abençoada campanha contra a negra lepra nacional: a ignorância aviltante de um grande sector da população portuguesa.
Sr. Presidente: para finalizar estas já longas, desataviadas e, porventura, fastidiosas considerações, quero ainda referir-mo ligeiramente a alguns sectores onde o Orçamento Geral do Estado terá de estender a sua acção.
Não previu o Plano de Fomento qualquer actuação especial no sector do turismo. Seguir-se-á, pois, neste campo o caminho lento das verbas moderadas, das verbas orçamentais ordinárias. É lamentável que não possa montar-se uma organização eficiente num ramo tão lucrativo, que, mesmo com as falhas actuais. Rendeu num ano mais de 400:000 contos, como afirmou aqui o Sr. Deputado Deus Figueira.
Afigura-se, portanto, de boa medida económica a construção em primeiro lugar dos hotéis preconizados pelo Sr. Deputado Paulo Cancela de Abreu, em Lisboa, Fátima e Évora. Deve ter o hotel de turismo em Évora a primazia, porque Lisboa não está inteiramente desprevenida; Fátima pode aguardar mais algum tempo, porque os peregrinos, por via da sua fervorosa fé, não deixarão de ali afluir nos dias solenes, fazendo dos incómodos da jornada uma manifestação gostosa e voluntária da sua própria penitência.
Évora, afastada de centros onde há hotéis, não atrai, antes repele, os que desejariam em dias consecutivos percorrer o vasto tesouro dos seus monumentos e pitorescas perspectivas.
No sector de estradas, problema Intimamente ligado ao turismo, é de justiça afirmar-se que melhoraram sensivelmente as ligações distritais e está em curso a reparação de uma das estradas que facilitam o acesso ao Algarve por Beja.
O que continua incómodo, por desgaste de estradas, já feitas há anos, é o percurso da ligação Évora-Santa-