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4 DE FEVEREIRO DE 1956 441

zação de servidos e actividades respeitantes a museus de arte, arqueologia, etnografia, folclore e história merece o meu aplauso.
Mas dou o primeiro lugar à criação, nos serviços oficiais responsáveis e no próprio público, duma mentalidade esclarecida que favoreça a execução, o cumprimento das disposições legais existentes no sentido de serem ouvidos os pareceres de pessoas ou entidades idóneas em qualquer iniciativa de criação, instalação ou remodelação de museus, de protecção a monumentos, de aquisição, tratamento ou apresentação de espécies. Tal mentalidade é, acima de tudo, função duma activa e esclarecida propaganda.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:-Associo-me a tudo o que foi dito aqui sobre a boa selecção e devida retribuição do pessoal dos museus, sobre a conveniente dotação destes.
Quando me lembro de que a verba atribuída pelo Instituto de Alta Cultura ao Centro de Estudos de Museologia e Arte, anexo ao Museu de Arte Antiga, é da ordem de grandeza de pouco mais duma dúzia de coutos anuais, confrange-se-me a alma com esta indigência.
A culpa não é do Instituto de Alta Cultura, que tantos benefícios tem prestado a vários domínios da cultura portuguesa, mas da pobreza clamorosa da sua dotação orçamental respectiva.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:-Mas julgo também necessário e urgente - tenho aqui falado no perigo que sofrem vários sectores da arte e tradições nativas de se extinguirem sem deixarem rasto, como também de salutares exemplos doutros países na matéria-, julgo também necessário e urgente, repito, estender e intensificar ao e no ultramar uma acção correspondeste à que se iniciou e se preconiza na metrópole.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:-Devo dizer que me não parecem plausíveis certas restrições excessivas à liberdade de saída de alguns objectos etnográficos, como ultimamente sucedeu em Angola com peças colhidas pelo grande etnógrafo alemão Bauman. Porque não se ouvem sobre tais casos os pareceres de especialistas portugueses? Não devemos cair, depois de uma liberdade e indiferença totais, num regime oposto de exagero, que nos não nobilita do ponto do vista da cultura e da investigação cientifica.
Mas prossigamos:
O que mais desfavoravelmente me impressiona, entre nós, nesta matéria, é a frequência com que qualquer colecção fragmentária de um curioso ou de um amador sem critério aparece logo a muita gente - mesmo a gente responsável - como susceptível de constituir o fundo de um museu.
Não me cansarei nunca de considerar como indefensável, mesmo às vezes como perigoso, o coleccionismo puro, o bricabraquismo insciente e desordenado.
Os museus modernos não são armazéns frios, bolorentos e inexpressivos do peças ou objectos reunidos a esmo. São centros de convergência e irradiação culturais, núcleos vivos de divulgação educativa, de defesa de valores cuidadosamente seleccionados e de estudo e investigação de certos aspectos da cultura de um pais.
Não são meros arquivos documentais, desarmónicos, desconexos, desagradáveis, ou simples atracções de curiosidades heteróclitas. Têm um papel, um objectivo, obedecem a um plano, a uma concepção, a uma ideia superior, não a um coleccionismo dispersivo. Necessitam de meios de acção, em pessoal competente e bem pago, um instalações adequadas, em recursos financeiros usados não caprichosamente, mas segundo o critério dos competentes, em meios informativos do público (letreiros adequados e completos, roteiros e guias, monografias, etc.).

Vozes: - Muito bem!

O Orador:-Estou recordando as visitas que tenho feito a museus da Espanha, da França, da Itália, da Inglaterra, da Bélgica, da Holanda, da Alemanha, da Áustria, da América do Norte, do Brasil e ainda do Egipto, do Quénia, da África do Sul e doutros territórios africanos.
Por entre algumas cristalizações de ultrapassados critérios, tanta inovação útil, tanta melhoria fecunda, tamanha compreensão da função dos museus! Visitei salas em que uma só peça, digna de valorização, aparece isolada, destacada.
Visitei conjuntos, núcleos significativos, sistematicamente ordenados. Admirei instalações auxiliares, laboratórios anexos, serviços complementares hoje indispensáveis, bibliografia, ficheiros, planos esclarecedores, filmes e diapositivos, cursos e conferências públicas ou para especializados, roteiros, guias explicativos.
No Museu Egípcio, no Cairo, dispensei os indivíduos que, em chusma, à porta, se me ofereciam para guias. Adquiri um livrinho, um plano, e lá fui sozinho ver o que queria, o que me interessava mais.
No Museu Árabe, também no Cairo, tive um guia, que era sobretudo um intérprete. Visitei as escavações e museus de Heliópolis e El-Maadi. Admirei os museus de Londres, Paris, Berlim, Munique, Viena, Antuérpia, Bruxelas, Amsterdão, Haia, Florença, Roma, Nápoles, Washington, Nova Iorque, Rio de Janeiro, S. Paulo, Dacar, Nairobi, Joanesburgo.
Por toda a parte, consciência da função do museu, planos, publicações, investigações de variada ordem, um critério de valor e de finalidade na disposição das peças.
O museu é o que está exposto nos salões públicos, mas é também o que está e se passa nos gabinetes de estudo, em salas de trabalho anexas, que são os bastidores e complementos indispensáveis de uma grandiosa tarefa cultural e social, direi mesmo de uma grandiosa tarefa de política nacional e de dignificação humana. Pessoal especializado competente.
Estive nos laboratórios e nalgumas secções do Museu Nacional dos Estados Unidos, em Washington, nas instalações correspondentes do Museu Americano de História Natural, em Nova Iorque.
Vi, neste último -que não é de belas-artes, mas de história natural-, o labor nos institutos anexos e, no enorme hall de exposições temporárias, as magnificas reconstituições da vida de animais selvagens no seu quadro natural, reconstituições obtidas por missões especiais ao coração da África, às selvas do Amazonas, às regiões polares, à Nova Guiné, à Austrália.
Quantos milhões de dólares e quantos esforços humanos para se obterem estas composições de museu! Salvas as proporções, só vi entre nós qualquer coisa de semelhante no Museu de Lourenço Marques. A museologia, Sr. Presidente, é coisa séria, não mero diletantismo, devaneio vago e insciente.
Como em 1949, noutro discurso neste lugar, afirmei, apontando factos do género dos que tem sido justamente lamentados, há a necessidade de criar entre nós a mentalidade a que me referi, de codificar e aperfeiçoar uma legislação talvez um pouco complexa, bastante difusa, porventura nalguns casos contraditória, e, acima de tudo, mal conhecida, e justifica-se a concentração de uma acção especializada, estimulante, orientadora, informativa, fis-