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17 DE ABRIL DE 1959 491

E se há uma diferença e um símbolo próprio a distinguir o servidor do direito, essa diferença devo, logicamente, reflectir-se na lei e esse símbolo tem de merecer especial tratamento do sistema jurídico, para não ser humilhado nem diminuído.
Claro que os advogados não podem, nem devem, cometer infracções penais no exercício da profissão. Se o fizerem, têm de ser punidos, mas de acordo com o preceito especial que lhes é aplicável, isto é, de acordo com o artigo 412.º do Código de Processo Penal.
De resto, é isto que os advogados pretendem. Não pedem imunidades. Pedem apenas que os julguem devagar, isto é, com a serenidade inerente à verdadeira justiça.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador:- Sr. Presidente: no artigo 2.º do projecto propõe-se a modificação dos artigos 435.º e 458.º do Código de Processo Penal no sentido de assegurar aos advogados os direitos de instarem directamente as testemunhas e de ditarem para a acta da audiência os seus requerimentos e protestos verbais.
Defende-se, assim, o regresso, puro e simples, ao regime anterior ao Decreto n.º 36 387.
Tem sido preocupação constante da Ordem dos Advogados, reivindicar o reconhecimento destes direitos. E compreende-se.
O sistema, imposto por aquele decreto, de as perguntas às testemunhas da parte contrária serem formuladas através do presidente do tribunal, é altamente inconveniente.
Quebra-se a força do interrogatório, amortece-se a própria intuição da verdade e o estranho triálogo só serve, como salienta o Dr. Angelo de Almeida Ribeiro, para permitir à testemunha falsa ou tendenciosa «entrincheirar-se na paixão com que depõe ou na mentira que engendra».
Sem a instancia directa, a actuação do advogado esvazia-se de um contributo precioso para a própria administração da justiça.
E não se diga que o interrogatório directo acarreta a demora do julgamento. A matemática ensina que demora menos tempo formular um certo número de perguntas directamente do que fazer o mesmo número de perguntas através de um intermediário, que tem de as repetir, isto é, de as duplicar.
O certo é que a grande maioria dos magistrados tem permitido n, instância directa, com inegáveis vantagens de tempo e, principalmente, com inegáveis vantagens para a indagação da verdade.

Porque, se há prova que precise de ser fiscalizada e submetida à pedra de toque de interrogatórios disparados de ângulos diferentes, essa é, de facto, a prova testemunhal, dada a sua fluidez, vícios e insegurança. Já um magistrado ilustre a classificou de «um crime à solta».
Ora, quem está em condições mais eficientes para vencer e descarnar um perjúrio ou a paixão de um depoimento é o advogado, que, mercê das informações e zelo do cliente, conhece os seus fios interiores e a rede de hábitos, ligações e influências que, porventura, cercara, , determinam e inspiram a testemunha.
O advogado está, assim, mais perto dos factos, mais próximo da própria respiração humana do caso. O advogado está dentro do processo, o juiz está acima do processo.
A alteração que o projecto propõe ao texto do artigo 458.º visa a atribuir aos advogados o direito de ditarem directamente para a acta os seus requerimentos e protestos, como, aliás, acontecia anteriormente ao Decreto n.º 36 387.
O sistema vigente de confiar a redacção aos presidente do tribunal tem gerado mal-entendidos, inúmeros atritos e alguns vexames.
Ainda há pouco tempo, um dos mais notáveis advogados deste país, nosso colega nesta Assembleia, no decurso de uma inquirição de testemunhas em carta precatória, ao pedir a palavra para um requerimento recebeu do juiz esta singular expressão: «Esteja caladinho», não sei se acompanhada do clássico dedo no nariz, com que ó costume abafar uma impertinência infantil.
A multiplicação destes casos e incidentes demonstra a necessidade de alterar o sistema e de se consagrar uma solução que conduza ao equilíbrio requerido.
O parecer da Câmara Corporativa observa, com propriedade, que «requerer e protestar compete aos advogados, e não aos juizes, cuja função é decidir».
Não se compreende, de resto, que seja o juiz a resumir e redigir um requerimento que lhe é dirigido e sobre o qual tem de pronunciar-se.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:-Insensivelmente, pela própria deformação de julgar, a selecção que a síntese implica vai já distorcida, canalizada para a decisão, quando não espelha, até, a hostilidade ou incompreensão ao que se requer.
Acresce que, como frisa o Dr. Almeida Ribeiro num passo da magnífica conferencia proferida na Ordem dos Advogados e que o parecer também cita, «um juiz alvejado num protesto precisa de ser quase extra-humano para resumir com perfeito equilíbrio palavras que são dirigidas, as mais das vezes, contra ele próprio».
Por estes motivos, o texto proposto no projecto é da maior conveniência para os advogados, para os juizes e, sobretudo, para o prestigio da justiça.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: o parecer da Câmara Corporativa é um documento exaustivo, minucioso e revestido daquele brilho que é timbre do alto espírito que o relatou.
As emendas que preconiza resumem-se a uma arrumação, uma intercalação e a substituição de duas palavras.
Como não tenho qualquer espécie de orgulho gramatical e permanece inalterável a substancia do projecto, concordo com elas e nada me custa, nos termos do artigo 37.º do Regimento, fazê-las minhas.
É sem dúvida mais aconselhável, sob o ponto de vista da técnica processual, incluir no próprio artigo do Código um preceito que dissipe as dúvidas de interpretação, do que deixar o intérprete em face de um diploma avulso.
A solução de artigo um parágrafo ao artigo 411.º, com o conteúdo do artigo 1.º do projecto, oferece maior utilidade e segurança. No fundo, vai-se ao encontro do próprio princípio da codificação, evitando dispersões e a quebra da unidade sistemática do ordenamento legislativo.
Não pode, todavia, sustentar-se que foi este o método seguido pelo legislador do Decreto n.º 36 387.
Só por mero lapso se afirma no parecer da Câmara Corporativa que este decreto aditou um § único ao artigo 413.º, quando a verdade é que apenas alterou b § único que. já existia no referido preceito!
Também já hoje não é líquido o princípio da titularidade exclusiva do Ministério Público na acção penal que o parecer refere a propósito do § 2.º do artigo 435.º
Basta relembrar que nos crimes particulares o exercício da acção penal pelo Ministério Público depende da acusação particular. E nem pode mesmo prosseguir nela