672 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 103
lismo tanto sob o regime do capitalismo liberal como perante o influxo de uma economia de direcção central.
Há elementos positivos e factores negativos; aqueles dizem respeito ao desenvolvimento económico, estes à anemia dos meios rurais.
Entre os elementos positivos ou causadores devemos salientar a menor facilidade de transportes, a escassa mobilidade da energia, o aumento da dimensão das empresas, as facilidades de distribuição de produtos, as maiores possibilidades de dispor de mão-de-obra qualificada, etc.
Pelo que se refere aos factores negativos que determinam ou estimulam o êxodo rural, devem anotarão motivos económicos, sociais e psicológicos. Daqueles, a diferença de remuneração de assalariados e empresários na agricultura e na indústria, a redução sucessiva da parte do rendimento agrícola no rendimento nacional, a progressiva distorção dos preços agrícolas e industriai» pela constante deterioração daqueles parecem decisivos; dos motivos sociais e psicológicos devem destacar-se o desconforto da via no campo, a deficiente protecção social e de meios de defesa sanitária, a atracção exercida pelo género ou modo de vida citadino, a preocupação de melhorar as condições de vida, que podem ter-se como mais importantes.
Gomo resultado ou consequência da acção congregada destas forças convergentes pode dizer-se que o estado de alma do rural é de inteira frustração, sentimento que traduz uma tragédia, que Simone Weill caracterizou nos termos seguintes:
Um mundo social está profundamente doente quando o camponês trabalha a terra com o pensamento de que se é camponês é porque não foi suficientemente inteligente para ser outra coisa ...
Quem ousará negar a esta sentença uma profunda actualidade na nossa vida, na vida que, graças a Deus, vamos vivendo?...
Mas como responsabilizar o centralismo administrativo por este processo quando durante o seu desenvolvimento, ou, pelo menos, durante a sua fase crucial, vigoravam conceitos ou preconceitos de acção governativa que talvez melhor pudessem ser ditos de inacção governativa?
Parece-me que seria mais lógico dizer-se que o centralismo administrativo foi o reflexo de todo este processo económico-social, que se limitou a acompanhar; pelo menos até ao advento do Estado intervencionista a centralização deverá ter-se como reflexo, e não como causa.
Desde a revolução nos conceitos da acção e missão governativa a centralização, ainda quando justificada, pode legitimamente responsabilizar-se por maior ou menor intervenção no processo concentracionista.
Só desde esse momento e na medida em que, desde então, a concentração urbana e industrial continuou a operar-se, ao mesmo tempo que a anemia rural não deixou de agravar-se, é que ao centralismo administrativo podem ser atribuídas responsabilidades.
Em qualquer caso o que parece líquido é ser preciso lutar contra a centralização como meio de combater a concentração, tanto sob o aspecto de congestão populacional como de aglomeração industrial.
Que num sistema económico como o actual, em que os homens se despersonalizam por detrás de uma maquinaria complexa em fábricas tontas vezes gigantes, se acumulam em residências dormitórios, se massificam, reformar a vida económica, de sorte que volte a estar sujeita a uma dimensão humana, de forma que o homem volte a reconhecer-se e a ser considerado, de facto, como portador de valores eternos, que num sistema
económico como o actual se considere e tenha a reforma dos processos e das condições de produção como objectivo fundamental parece indiscutível..
Ë sabido, de resto, estar a verificar-se uma dupla acção neste sentido. Por um lado, a evolução dos equipamentos está a conduzir, sucessivamente, o trabalho do homem de automotivo a vigilante. Por outro, os próprios interesses do capital - ainda quando não estiverem presentes preocupações humanas - estão a levar u fórmulas em quê o homem é cada vez mais integrado na empresa, até à própria reforma de empresa pela associação capital trabalho.
Este movimento, deve dizer-se, está, aliás, a fazer convergir os métodos capitalistas e as técnicas socialistas, impulsionados uns e outras pela mesma necessidade de integrar o factor humano.
Estão pois justificadas as preocupações de Lebret e dos seus colaboradores quando se não absolutizem a ponto de esquecer todas as outras exigências e os diferentes ângulos de visão dos problemas económico-sociais.
Pelo que respeita ao centralismo, que as doutrinas da equipa de Economia e Humanismo visam também directamente, parece/evidente que para lá da responsabilidade directa e indirecta que nas últimas décadas tenha no desenvolvimento deste processo, tanto nos países de. economia industrial madura como nas comunidades em vias de desenvolvimento, pelo que respeita ao centralismo administrativo, parece evidente ter de ser frontalmente combatido, se quisermos lutar contra a anemia de muitas regiões em depressão económica, direi, em consequência de uma depressão social, cultural e técnica.
Daqui decorre naturalmente uma concepção de organização do espaço que visa ou tem de servir-se de uma transformação dos métodos e processos de acção administrativa, que constitui uma política.
Dentro deste conceito, não pode nem deve restringir-se a organização do espaço e o urbanismo apenas a especialistas e técnicos, como tem acontecido em França, ou confiá-la às iniciativas e orientações das autoridades locais, como parece ser a tendência italiana, sueca e, em parte, nos primórdios, a inglesa.
No quadro de uma política de organização do espaço, decidir sobre a construção 'de casas, a edificação de escolas, a implantação de cidades, a realização de modificações estruturais ou melhoramentos fundiários, a execução de vias de comunicação, as distribuições de água ou de electricidade, a instalação de indústrias, etc., toma um significado bem mais do que técnico- no dizer de Pisani -, pois se inscreve num esforço de conjunto, coerente e total, pois se funda sobre um estudo do nosso espaço e do nosso povo assim como das suas relações e da sua evolução.
A organização do espaço não se situa, assim, ao nível técnico, mas da política, constitui uma certa concepção da vida nacional e exige a colaboração de diversas disciplinas, a cada uma das quais é preciso dar um sentido.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - E por isso que já se disse que uma verdadeira política de organização do espaço supõe a reforma do Estado, da Administração, da fiscalidade, dos costumes».
Sr. Presidente: quem se detiver a olhar sem paixão, mas também sem romantismo, para o desequilíbrio regional, fortemente pronunciado, para a anemia de muitos dos nossos distritos, para o estiolamento da vida social, intelectual e económica da generalidade das nossas cidades interiores, quem apreender a ansiedade da