216 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 141
política de valorização dos meios rurais, cie uma inteligente concepção do que deve e pode ser o equilíbrio de condições de vida entre os mais diversos aglomerados populacionais.
Começa o relatório por referir o contraste entre os níveis de vida das populações urbanas e rurais provocado por uni fenómeno que acentuou o desequilíbrio entre a vida das cidades e dos campos para benefício daquelas e em detrimento destes. E felizmente que mais uma vez, vem a esta Assembleia, em documento do Governo, o reconhecimento desse desequilíbrio e, o que mais importa notar, a declaração de que se torna, cada vez mais imperioso contrariar o agravamento de uma situação que, a permanecer, poderá trazer ao Puís perturbações de tal modo graves que podem fazer perigar unia estrutura erigida com devotado sacrifício e enraizado amor a esses mesmos meios rurais, que constituem a melhor e mais sã reserva dos nossos valores humanos.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - A aldeia necessita de águas e esgotos, vias de comunicação e transportes, necessita de todo o conjunto de benefícios que o progresso da técnica e da civilização lhe pode conferir, mas necessita também de permanecer detentora, dos tradicionais valores espirituais que têm sido apanágio das gentes portuguesas.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Que se não perca a aldeia portuguesa por permitir que se despovoe ou incentivar que se transforme num amálgama urbano sem personalidade, sem linha de vida definida, sem a existência de um traço comum nos seus habitantes, que ela continue, como sempre foi, na pureza de uma, associação de famílias que se entreajudam e vivem lias canseiras ou alegrias, na tempestade ou na bonança, sob o superior estímulo de um ideal comum.
Todos quantos nesta Assembleia têm largamente debatido a necessidade de suster a corrida aos aglomerados urbanos podem felicitar-se, e tantos têm sido e tilo insistentemente que é legítimo afirmar-se ser a própria Assembleia que, no seu todo, se pode felicitar.
Não será, por si só, o abastecimento de água das populações rurais benefício que impeça a fuga da aldeia e o abandono dos campos. Não; o problema que se põe é por de mais amplo e complexo para solução tão simplista, mas não nos caiba a menor dúvida de que, se não é medida suficiente, é-o, sim, primariamente necessária, ou não fossem o bem-estar económico e o saneamento duas condições intimamente ligadas e não estivesse o fundo da questão num fenómeno do tipo económico social.
Que o Governo, na sua proposta de lei, não quis esquecer a estreita ligação entre o saneamento e o bem-estar económico, que não deixou circunscrever o abastecimento de água em limites de mero âmbito sanitário, mas antes se preocupou com factores mais latos, embora tantas vezes esquecidos, como são os do bem-estar dos povos e o da produtividade das famílias rurais, atestam-no, pelo menos, dois princípios que se podem considerar inteiramente novos em relação ao que vinha sendo, não talvez o pensamento dos governantes, mas uma directriz de execução, decerto condicionada por mal compreendidos imperativos.
São esses princípios o da previsão do mais largo emprego da distribuição domiciliária e o da «generosidade» com que deverão ser previstas as capitações de consumo, que terão em couta «não só as necessidades domésticas, como também as de rega das hortas e pomares nos quintais anexos à habitação rural, da alimentação das cabeças de gado e da exploração das pequenas indústrias caseiras, agrícolas e pecuárias, que tão importante papel desempenham na economia das famílias rurais».
Srs. Deputados: nestes dois, aparentemente singelos, mas fecundos, princípios enunciados na proposta de lei se patenteia um sentido de realidades, uma noção exacta das justas exigências dos nossos povos, um conhecimento preciso do que é a missão do Governo na plena latitude das suas funções, que honram o Ministério das Ohms Públicas e a nós, lídimos representantes desses povos e dos seus direitos e anseios, nos enche da júbilo.
Custe embora ao poeta, deixe Leonor de ir à fonte e leve-se a, fonte a cada família portuguesa, com agira abundante, água que, longe de representar, pela sua penosa obtenção, um sacrifício, muito longe de ser um luxo, seja. sim, um factor de bem-estar s produtividade.
Registe-se ainda, como francamente louvável, a intenção governamental de coordenar os abastecimentos rurais com as obras hidráulicas de rega ou de produção de energia e de planear procurando, como se estabelece na base III, englobar em cada projecto o maior número possível de povoações, independentemente da sua subordinação administrativa, de modo a poderem ser colhidos os benefícios dos abastecimentos em conjunto, a partir de origens de águas seguras e abundantes.
Fazem-se votos por que quantos são responsáveis pela gerência administrativo, dos nossos concelhos meditem nas generosas consequências destes conceitos e, pela influência do seu prestígio u pelo seu exemplo, não permitam que falsas noções de autonomia administrativa ou confrangedoras e pueris rivalidades de vizinhança prejudiquem uma intenção tão objectiva quão eficiente será a sua concretização.
Não desejamos também deixar de referir a consagração que o relatório da proposta de lei n.º 28 confere aos benefícios que normalmente advêm para a câmaras municipais da cooperação das populações locais directamente interessadas, e dizemos consagração porque, embora de há muito aceite e até almejada pelas administrações municipais, nem sempre a orgânica estadual e parecia desejar ou compreender, quer como valioso contributo material dado ao município, quer ainda, no feliz dizer do relatório, como fenómeno salutar que não deve impedir-se, mas antes estimular-se.
Srs. Deputados: estamos de facto perante uma proposta de lei do mais elevado alcance e que poderá trazer os mais frutuosos benefícios para os nossos meios rurais, proposta alicerçada em são critério, amarrada a profundo conhecimento do problema e impulsionada por directrizes que, apraz registar, são de molde a permitirmo-nos um franco optimismo, mesmo quando se tome em linha de conta quanto ainda é de presumível em relação aos recursos hídricos do País.
De presumível, dizemos, pois que ao esforço já despendido pelos respectivos serviços há ainda muito esforço a somar antes que se possa ter uma ideia suficientemente exacta das nossas possibilidades hidráulicas.
A propósito refere a Câmara Corporativa quanto de cruciante é o problema da escassez de pessoal técnico, sobretudo, diz o citado parecer, de pessoal técnico auxiliar, que, continua, tão larga aplicação poderia ter na realização de um plano como o definido na proposta de lei em apreciação. Oportuna referência a da Câmara Corporativa, mas não menos oportuno é também lembrar como esse problema se agrava no âmbito das possibilidades técnicas dos municípios.