O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

13 DE JANEIRO DE 1960 211

Repousam os restos mortais do insigne capitão-mor em campa rasa na capela lateral direita da Igreja da Graça, sa mais delicada jóia de arte que Santarém, para honra sua, ainda conserva como preciosíssima relíquia da arquitectura gótica», como escreveu António Áreosa Feio, na sua bela obra Santarém Princesa das Nossas Vilas.
Já tinha sido erguida há mais de um século, na nobre vila de Santarém, essa Igreja da Graça, quando Pedro Alvares Cabral, «tão versado em cosmografia e marinharia», partiu da praia do Resido, desta cidade de Lisboa, capital do Reino e cabeça de um império em começo de formação. Em boa parte anula hoje perdura esse império, mercê de Deus e, porventura, da riqueza humana, da potencialidade criadora, da nobreza dos ideais K dos princípios que inspiravam os portugueses que o formaram & mantiveram e dos que ainda agora o sustentam e defendem com o mesmo ideário, a mesma devoção patriótica e o mesmo sentido universalista que sempre presidiu à nossa acção civilizadora levada a cabo nas cinco partes do Mundo.
Foi nessa Igreja da Graça, da hoje cidade de Santarém, que o Sr. Embaixador do Brasil, Dr. Negrão de Lima, ajoelhou e orou junto da campa de Pedro Alvares Cabral, erguendo ao céu, por certo, as mesmas preces u orações que o insigne capitão-mor ergueu com todos 05 seus comandos quando pela primeira vez pisaram as então desconhecidas terras de Santa Cruz.
Repetiu, assim, o Sr. Embaixador o gesto do seu compatriota e grande lusófilo Dr. Afrânio Peixoto, que este refere na sua obra - escrita na «nossa amada língua portuguesa» - Viagens na Minha Terra, dizendo:
«Na Igreja da Graça ajoelho-me e venero uma grande memória: Pedro Alvares Cabral aqui jaz ... Pelo Brasil que ele revelou no Mundo rendo-lhe homenagem ...».
O gesto do Sr. Embaixador Negrão de Lima é mais um testemunho vivo e eloquente de que os brasileiros esclarecidos e responsáveis cultivam e afervoram o sentido profundo dos laços históricos que unem Portugal e o Brasil, pois o Sr. Embaixador pertenço ao verdadeiro patriciado intelectual do Brasil.
Por isso ele disse, com ajustada propriedade, em discurso proferido em Santarém, que nas ruas calmas e tranquilas daquela cidade e sob as arcarias ogivais da Igreja da Graça vinha retemperar o seu espírito.
Obra do espírito foi, na verdade, a que logo de início e sempre os Portugueses realizaram no Brasil, desde que ali aportaram e tomaram contacto com os íncolas dessa terra prodigiosa, que hoje se afirma como das mais progressivas em todo o hemisfério austral e também das mais fiéis às crenças dos seus antepassados.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Obra de espírito, tão luminoso e são que pôde vivificar e continua a presidir à estruturação e desenvolvimento da vida de uma já grande 6 próspera nação, que antevemos, e ardentemente desejamos, seja das que mais decisiva influência venha a exercer no ordenamento do mundo d« amanhã.
É que no recheio humano das naus e caravelas com que Cabral fez rumo a terras ignotas que deviam existir para além do mar Atlântico, lá para as bandas do Sol-Poente, se continha como que uma síntese dos princípios e conhecimentos que informavam uma civilização já milenária que se esclarecera e fixara com a verdade revelada por Cristo, que cada ano o mundo cristão celebra.
E que nelas seguiam mareantes, matemáticos, cosmógrafos e geógrafos esclarecidos e experimentados, que em sua formação científica provinham em linha ruela dessa Escola de Sagres, que o ínclito e genial infante D. Henrique criara para que os Portugueses dessem novos mundos ao Mundo.
Nelas iam outros letrados: cronistas, físicos, jurisconsultos, ecónomos e mais de que as crónicas nos falam e dão memória, conjuntamente com freires, abados, vigários e outros representantes da milícia espiritual, futuros divulgadores do. palavra, do Evangelho nessas sociedades que íamos trazer para a luz da civilização.
Ao lado destas elites, e formando um todo com elas iam os simples marinheiros, gente do povo, todos animados pela mesma fé ardente e por indomável desejo de cumprir a missão que a Pátria lhes incumbira pela voz do seu chefe e rei. Assim era a tripulação da frota que Joio de Barros disse ser «mui poderosa em armas e gente luzida».
E quando o mar era revolto e a tempestade açoutava, e sacudia as naus era a ideia da Pátria que, sobrepondo-se a tudo, até mesmo ao instinto de conservação, unia s conjugava seus esforços obedecendo a voz de comando, para dominar os elementos, vencer o perigo e chegar a porto de salvamento.
Magnífica e sempre actual lição a que dessa epopeia se colite, por força da qual temos de reconhecer que é constante da nossa história, como de resto da de todas as nações que têm verdadeiro sentido da sua vocação e do seu destino, que nos lances decisivos da nossa vida colectiva só podemos subsistir e criar mais fortes raízes da vida perene pondo de parte o que nos divide para só fortalecermos os sentimentos que nos devem unir: de respeito pelos sacrifícios e ardor patriótico dos que nos antecederam e pelos direitos dos que se nos hão-de seguir.
Mas por força do feito de Pedro Alvares Cabral e da acção igualmente heróica e persistente de ta til os portugueses que depois dele ali missionaram as almas, fecundaram a terra e defenderam suas gentes criou-se nu nutra margem do Atlântico uma nova comunidade lusíada que perante o mundo de hoje é mais um testemunho irrefutável das virtudes e potencialidade criadoras da raça.
Foi para prestar homenagem a essas virtudes e potencialidades, que transmitimos e se mantêm vivas na alma brasileira, que o Sr. Embaixador Negrão de Lima foi em romagem espiritual ajoelhar e rezar junto do túmulo de Pedro Alvares Cabral, segundo penso e creio.
Havemos de tê-lo como um gosto de esclarecido e são nacionalismo, daquele nacionalismo de sentido universalista que impulsionou a gesta heróica dos portugueses de 1500.
Havemos de considerá-lo como afirmação de que sendo comum a raiz e seiva das duas comunidades lusíadas, a uma e outra se impõe fortalecer, dar vida nova e actual aos laços históricos que as prendem o tornam comuns os seus destinos; e denunciar como atentatórios dos interesses da grei todas as atitudes, todos os actos, todas as condutas pessoais ou colectivas que possam por qualquer forma dividi-las ou amortecer os sentimentos fraternos por que estão vinculadas.
O mar Atlântico nos separa e simultaneamente nos une.
Somos nele duas bases estratégicas donde impulsionar e defender esses interesses comuns.
E foi, por certo, este pensamento que inspirou as palavras do Sr. Ministro da Marinha do Brasil proferidas em entrevista recentemente dada à Imprensa, a sugerir a realização de manobras navais conjuntas das armadas brasileira, e portuguesa nesse oceano Atlântico que é vínculo ila nossa coexistência e legítimo a necessário instrumento do desenvolvimento e progresso da grande comunidade luso-brasileira.