29 DE ABRIL DE 1960 831
samento social do Regime, claramente afirmado em textos legais e noutros que já na discussão da generalidade relembrei.
Aliás, a ideia de se interessar todo o elemento produtivo no resultado final, de fazer sentir que os lucros apurados no exercício exprimem o somatório de muitos esforços individuais, e que, por isso mesmo, todos são chamados, como numa grande mesa de comunhão, à participação no corpo dos lucros da empresa, não é coisa desconhecida em Portugal; ela vai sendo praticada em algumas empresas, e de forma alguma isto consiste numa inovação.
Tenho conhecimento de que em alguns casos, e sob formas diversas, que, todavia, há conveniência em disciplinar, essa participação já está a ser considerada.
Há um exemplo, do qual se deu público conhecimento pelos jornais, de uma grande empresa que já distribui pelo seu pessoal uma percentagem de lucros que se aproxima dos 13 por cento, valor muito elevado nestas comparticipações, e que, por isso, considero que será justo sublinhar com uma palavra de incentivo e de aplauso. Trata-se da Companhia do Açúcar de Angola, empresa onde, aliás, suponho que não conheço ninguém. Esse desconhecimento é, porém, o que me autoriza a deixar esta breve referência no assunto.
Poderia dizer-se que, tal como vem proposta, a medida teve o carácter de uma recomendação, de uma instância vaga, por isso que se diz que a participação nos lucros se fará sempre que os corpos gerentes neles participem, e nisto se usa a própria redacção da Câmara Corporativa. É talvez um defeito, mas foi a reflectida, prudência que assim o aconselhou. Penso que nesta matéria das empresas não se deve proceder com minúcias discricionárias, porque as características são muito diferentes de caso para caso, e há que respeitar a individualidade de organizações produtivas, cujos problemas, por vezes, se não podem resolver de fora, mas o que importa, dar é o primeiro passo em relação a uma meta que não tardará a ser atingida, e à qual, tenho a certeza, outras novas realizações se vão seguir.
Tenho dito.
O Sr. Amaral Neto: - Sr. Presidente: a formosa intenção do Sr. Deputado Dr. José Saraiva e a bela forma literária com que acaba de a justificar começaram por me dar o receio de ter parecido à Assembleia um tanto ou quanto sórdido, se não mesquinho, o apontamento que fiz há dias, de que, na vida das empresas, também o capital precisa de ser retribuído e respeitado.
Não acompanharei o Sr. Dr. José Saraiva nas suas considerações, porque me falta talento e informarão, mas a escassez da informação não é tanta que não possa dizer que o problema da participação dos operários nos lucros das empresas oferece os maiores melindres, até mesmo porque há que os convencer de que quando lhes é concedida é na medida, justa.
A desconfiança desta justiça de medida poderá vir a criar dificuldades às empresas, especialmente quando é preciso reintegrar fundos, constituir reservas, etc., que apareçam no espírito dos operários como restrições da sua parte.
Mas, felizmente, o Sr. Dr. José Saraiva pôs a sua proposta em termos tão gerais que quase a situou no domínio do ideal, e nesse ideal não tenho a menor dúvida de acompanhar os seus desejos e dar-lhe o meu voto, se os autores do projecto de lei, melhor conhecedores da sua economia, me demonstrarem primeiro que a introdução de uma disposição que carece de ser regulamentada não será factor de atraso para a aplicação das restantes medidas.
Tenho dito.
O Sr. Camilo de Mendonça: - Sr. Presidente: pedi a palavra, primeiro, para responder à pergunta do Sr. Deputado Amaral Neto.
É evidente que a adopção da proposta do Sr. Dr. José Saraiva não traz qualquer inconveniente à economia do projecto. Não afecta as suas disposições, não as prejudica, nem as beneficia; constitui outra matéria, se bem que importante.
Em segundo lugar, para me referir ao problema propriamente dito. Evidentemente que com o princípio tenho de estar de acordo de uma forma total. Há, porém, uma preocupação importante que não posso deixar de evidenciar: a participação dos operários nos lucros das empresas constitui um problema candente em todo o Mundo e, como o Sr. Dr. José Saraiva acentuou, um dos aspectos de um problema mais vasto, o da reforma da empresa. Tem, de resto, a maior utilidade considerar o problema no conjunto das várias soluções que estão sendo adoptadas em vários países e segundo os diferentes ramos das actividades.
Tem-se visto, no domínio positivo, que, a participação nos lucros tem interesse, é real, é significativa, quando se trata de empresas industriais com alto grau de mecanização, quer dizer, de empresas em que o número de trabalhadores é escasso em relação ao capital fixo e aos lucros da empresa. Não conduz a quase nada em empresas do tipo dos serviços, actividades chamadas do terciário, em que o número de empregados é muito grande em relação ao produto final a repartir, Para estas, cedo se viu que a solução não podia ser a participação nos lucros e que qualquer gratificação habitual do fim do ano podia representar mais do que esta participação. Esta faceta tem tido, por vezes, como consequência, parecer a participação uma frustração aos olhos do operário a quem se concede. É claro, nos sectores de fraca mecanização ou grande número de trabalhadores em relação no produto ao empresa.
O Sr. Amaral Neto:-Muito bem!
O Orador: - Por isso se tem enveredado, em certas situações dessas, lá fora, por dois caminhos diversos: um, de comissões da empresa ou de jurados da empresa, que até na nossa vizinha Espanha já existem, diga-se que quase sempre com também bem poucos resultados: o outro, o da participação na própria administração.
Mostra também a experiência que, frequentemente, quando se decretou a participação, e sob qualquer das formas referidas, os resultados não foram brilhantes, e apenas quando, por meios indirectos, se propiciou às empresas esse caminho, com a contrapartida de dados benefícios ou concessões, se entrou francamente no domínio positivo.
Devo esclarecer, Sr. Presidente, que o caso da Alemanha, muito falado, é bastante diferente dos restantes, porquanto aí operaram-se, transformações económicas paralelas, em consequência das vicissitudes de certos industriais, imposições dos vencedores e até da reentrega do comando económico outra vez ao povo alemão.
Mas, dizia eu, Sr. Presidente, que só quando a solução adoptada o foi por forma indirecta, de sorte que veio a ser adoptada por opção da empresa - a empresa que conceder participação dos seus empregados nos lucros, em conselhos sociais, na administração, terá o direito consequente a constituir caixa de previdência da própria empresa, de beneficiar de determinadas deduções fiscais, etc. - só nessas condições è que nesta matéria se entrou no domínio de efectiva aplicação destes princípios, tornados social e psicologicamente operosos. Não aceito, porém, a objecção corrente de que não temos nem mentalidade nem nível económico adequado para tentar essa experiência. Recordo-me, a propósito, da