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13 DE ABRIL DE 1961 547

comandavam o trânsito empoleirados e colocados em invulneráveis pedestais, que, elevando-os a reinantes alturas, parece por vezes ameaçarem o mar e o mundo, fazendo contrastar a elegância da farda com a deselegância de modos.
É assim o ambiente das grandes capitais, onde a par do crescimento material, do constante fervilhar de atractivos e da volúpia de vãs tentações, a vida se torna cada vez mais vertiginosa, mais frívola e mais egoísta.
Indiferente às maldades e cobiças de um mundo ateu e confuso, Lisboa continua a ser a dama requintada, que, fazendo com a maior dignidade as honras da Casa Portuguesa, abre, senhoril e afável, as suas portas de par em par, para com a maior cortesia receber os inúmeros estrangeiros que a visitam, atraídos pelas suas encantadoras belezas e pela dome paz que o nosso país lhes assegura e oferece.
Todavia, há nesta formosa cidade, cada vez miais ciosa do seu aspecto cosmopolita e do seu progressivo desenvolvimento urbanístico, certas coisas que destoam e impressionam talvez até mais os olhares e a mentalidade do provinciano calmo e habituado a dar a salvação quando se cruza com o seu semelhante do que o próprio Alfacinha, que se habituou a acotevelar-se nas ruas, nos teatros, nos autocarros e nos eléctricos ou a estudar à mesa dos cafés os boatos e as anedotas que no dia seguinte há-de levar à repartição, à oficina ou aos diferentes locais de trabalha.
Entre as dissonâncias que mais ferem a sensibilidade e mais fortemente negam a nossa consumada tradição artística figuram as variadas aberrações arquitectónicas, que tornam incaracterísticas muitas das artérias e praças da nossa formosa capital.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Não há dúvida de que em muitos casos a construção de características genuinamente portuguesas se transformou em amontoados de arranha-céus estilo «favo de abelha», onde, em verdadeiras colmeias de seres humanos, vive a burocracia fugida u dureza dos meios rurais.
O mármore e o granito, invocados com tanta elevação poética, estão ultrapassados, no tempo e no espaço, pelo ferro e pelo cimento armado, com que se criou uma nova técnica arquitectónica para fazer gaiolas e jardins suspensos da Babilónia, onde o espírito comercialista para muito acima da arte e do bom gosto.
O estilo, tal como os usos e costumes, é elemento primordial de identificação dos povos e imprime-lhes verdadeira personalidade.
Temos o nosso estilo arquitectónico próprio, e por isso bastaria apenas enquadrá-lo racionalmente no espírito das concepções modernistas, para que, sem sairmos da construção de recortes tipicamente portugueses, seja possível conceber blocos caracteristicamente aceitáveis e adaptáveis ao nosso meio, em vez de verdadeiras fileiras de caixotes de importação.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O urbanismo deve ser uma arte, e não lima fábrica de série, onde apenas se traçam avenidas e fabricam casas, sem qualquer preocupação de estética ou de afirmação de nacionalidades.
Cada povo tem o seu estilo próprio, pelo que a sua evolução e progresso urbanístico não pode fazer-se à custa da total negação ou do simples alheamento dos valores tradicionais.
Assim o tem entendido a actual Câmara Municipal de Lisboa, que, estando a dotar a cidade de admiráveis melhoramentos, tem procurado fazer reviver todas as tradições, oferecendo assim aos estrangeiros, a par do maior conforto moderno, um ambiente tipicamente português.
A edilidade citadina, presidida pelo espírito dinâmico do Sr. Brigadeiro França Borges, tem realizado unia obra de extraordinária envergadura, pelo que conquistou a confiança e a simpatia dos Lisboetas e tem merecido a mais viva admiração de todo o público em geral.
O Sr. Brigadeiro França Borges, figura nobilíssima de militar destemido e de nacionalista fervoroso e abnegado, tem realizado à frente dos destinos da primeira câmara municipal do País uma obra de renovação e ao mesmo tempo de recuperação tradicional verdadeiramente notável.
Sem pretender ferir a sua modéstia, desejo deixar aqui bem sublinhado o muito apreço em que tenho as suas altas qualidades e a grande admiração que me merece a sua obra realizada nesta grandiosa cidade de Lisboa, que é a cabeça e o coração deste Portugal hospitaleiro e cavalheiresco, que temos de defender palmo a palmo da ingratidão, do ódio e da inveja, de modo a honrarmos o nosso passado histórico e a mantermos íntegros, no presente e no futuro, os nossos legítimos direitos de soberania.
A cidade de Lisboa, que é a alma da Nação Portuguesa, donde partiram as naus que levaram aos quatro cantos do Mundo o espírito cristão e civiliza dor dos Portugueses, tem atravessada um extraordinário surto de progresso, que a torna cada vez mais tentadora e apetecida por nacionais e estrangeiros.
Onde ainda não há muito tempo eram quintas rústicas, olivais frondosos, ou magras terras, de semeadura, surgiram, como que por encanto, novas zonas urbanísticas de surpreendente aspecto cosmopolita.
A diligente acção camarária, ao mesmo tempo, que procura dar à cidade nova um desenvolvimento arejado e moderno, tem, com o melhor bom senso, procurado remediar erros e evitar mutilações, na preocupação séria de manter quanto possível o aspecto tradicional e típico da velha urbe, tornando-a assim cada vez mais encantadora e cheia de interesse.
Deste modo, foi possível libertar a Avenida da Liberdade das caricaturais escadinhas e dos ridículos recantos de namorados existencialistas, restituindo aquela tão discutida e famosa artéria citadina à nobreza do seu classicismo, ao encanto das suas pedrinhas brancas e pretas, à harmonia dos seus jardins, à poesia dos seus lagos e figuras decorativas e à formosura do seu traçado austero e artístico.
Honra à coragem do Município, que, indiferente a modernismos informes e alheio à crítica de modernistas excêntricos, soube enfrentar uma situação que constituía, um lamentável atropelo à arte e enchia de tristeza a maioria dos Lisboetas, orgulhosos de possuírem uma das mais famosas avenidas do continente europeu.
Louvor e justiça ao conceituado periódico da tarde Diário Popular, que, ao lançar com desassombrado bairrismo e a maior oportunidade o grito de alarme «Salve-se a Avenida», despertou a consciência citadina e estimulou a atenção da edilidade, que prontamente mandou proceder aos meticulosos trabalhos de reintegração - e a Avenida salvou-se...
Mas, Sr. Presidente, há ainda que salvar Lisboa de muitas outras monstruosidades, pelo que é necessário libertá-la de azinhagas inestéticas, apertadas e perigosas, onde o trânsito constitui um traiçoeiro atentado à vida e a solitária escuridão representa um permanente pesadelo para a moral de quantos por essas impudicas vielas têm de transitar.
Encontra-se, por exemplo, neste caso, a chamada, pomposamente, Rua do Fidié, traçada nos tempos saudosos das carrocinhas e que, por incumbência especial