13 DE ABRIL DE 1961 551
pelo bem do semelhante, pela causa do pobres e dos humildes, a quem dedicadamente serviram, merecem bem ser lembrados pelo exemplo que nos legaram.
O Dr. Aires Pinto Ribeiro, que se entregou inteiramente à vida de médico em terras de além-mar, pode e deve ser considerado como varão ilustre, que acima da Pátria coloca Deus e ao serviço de Deus e da Pátria terminou os seus dias em perfeita serenidade de consciência, após uma vida de trabalho exaustivo em holocausto da grei portuguesa.
Foi longa e proveitosa a sua actividade no desempenho de missões que lhe foram confiadas, cumprindo dedicadamente as obrigações inerentes aos problemas da saúde e da higiene, pelos quais tanto lutou, num apostulado constante em defesa dos que sofrem, dominados pela miséria e pela doença.
No desempenho da sua profissão, confundindo sentimentos de humanidade e caridade com as suas obrigações de clínico, nunca soube distinguir o pobre e o fraco do rico e do poderoso, grande divisa e símbolo de uma vida a praticar o bem.
Na ilha de Moçambique, onde iniciou a sua carreira de médico do ultramar, em Angoche, em Lourenço Marques, na chefia dos serviços de saúde de Moçambique, em Macau, onde exerceu chefia idêntica, e, finalmente, em Lisboa, como inspector superior dos Serviços de Saúde do Ultramar, o Dr. Aires Pinto Ribeiro nunca perdeu o sentido que sempre havia orientado o seu espírito, cumprindo e prestigiando a lei nas suas funções administrativas, sempre dentro de um critério social e humanitário digno do maior respeito.
Poderia ter legado aos seus pares uma obra compendiada do mais alto merecimento, visto possuir dotes excepcionais para o fazer, mas a sua obsessão pela clínica, em que consumia todo o seu tempo, não lhe dava o repouso e a tranquilidade necessários para lançar no papel toda a vasta soma de conhecimentos adquiridos em largos anos de actividade.
Os seus relatórios são modelo de clareza e de expressão, e através desses documentos se pode avaliar a exaustividade do seu labor.
Bastaria o seu Programa de Acção Sanitária e Profiláctica, publicado em 1956, quando director dos Serviços de Saúde de Moçambique, magnífico documento das directrizes a seguir para revigoramento e desenvolvimento das populações nativas, para conceder ao Dr. Aires Pinto Ribeiro um dos mais categorizados lugares no exercício da profissão médica.
Como definição clara do que poderiam e deveriam ser os serviços de saúde de Moçambique, dentro da organização de que dispunham, através de medicamentos, actos cirúrgicos, agentes físicos e conselhos e imposições higiénicos, afirmava o Dr. Aires Pinto Ribeiro:
Com estes meios podem os serviços de saúde exercer uma larga e útil acção em proveito da humanidade sofredora; mas não podem, de maneira efectiva e durável, curar e, ainda menos, evitar as doenças que os factores da miséria social geram e mantêm. Com efeito, o tratamento curativo e profiláctico destas doenças ultrapassa os meios de acção dos serviços de saúde, porque depende de toda a organização social: económica, administrativa, educativa, etc.
São, na verdade, de uma extraordinária eloquência estas afirmações, que definem, com todo o merecimento, dificuldades quase insuperáveis que ele venceu na prática do sacerdócio médico.
Para orientar em profundidade a sua acção, estudou as condições sociais em que viviam as populações nativas de Moçambique, mergulhadas numa ignorância que ele aponta como fonte de miséria e de doença, ignorância que, esclarecida, evitaria muitas e graves enfermidades.
A sua actividade não tinha limites, e o inquérito feito acerca da alimentação do indígena, numa pormenorização inteligente, demonstra o merecido interesse pela saúde do indivíduo.
Teve manifestações de extraordinário alcance, como foi a referente à água, como objectivo de higiene corporal, ao qual juntou a campanha em favor da limpeza do indígena, providenciando, através das autoridades administrativas, para que, dentro dos meios necessários, se ensinasse o processo simples de fazer sabão, cujo uso constituiu o mais eficaz e o mais económico método de limpeza.
Semelhante campanha, de efeitos magníficos, realizou-se à sombra de um conceito, afirmando que com mais asseio há mais saúde e menos doenças, o que é verdade incontroversa.
Neste pormenor, como em tantos outros de igual projecção, mostrou o Dr. Pinto Ribeiro o seu fino e desenvolvido espírito de observador, ligando às coisas que para muitos seriam pequenas a importância que não possuem outras apresentando extraordinário volume.
A nosologia da província ordenou-a o ilustre médico em duas categorias: doenças incidentais, como as doenças infecciosas que surgem episodicamente na vida do indivíduo, matam ou curam, não deixando geralmente taras orgânicas que venham prejudicá-lo, e doenças de acção permanente, aquelas que, durante largo período da vida, contribuem para o depauperamento da raça, sendo em muitos casos motivo de invalidez e noutros, por enfraquecimento do indivíduo, factores de aumento de receptividade para determinadas enfermidades graves.
Pertencem a esta, categoria a aucilostomose, a bilharziose vesical, as boubas, a lepra, às quais podemos juntar a sífilis e a tuberculose, que nos grandes aglomerados populacionais grassam já com certa intensidade.
Doenças parasitárias unias, microbianas outras, foram estudadas e tratadas pelo Dr. Aires Ribeiro, tirando do facto os melhores resultados, visto ter melhorado o aspecto físico da população, diminuído a morbilidade e a mortalidade, aumentado a natalidade, tornando fecundas mulheres que o não eram e diminuindo a mortalidade fetal.
São expressivos na simplicidade dos números os resultados colhidos na sua actividade clínica, verificados através de quadros, onde as percentagens falam com a maior clareza e a maior evidência.
A obra realizada pelo Dr. Aires Pinto Ribeiro é extraordinária, não cabendo o seu exame numa intervenção que não tem outro motivo a justificá-la senão a pública valorização da tarefa realizada em África por Portugal, tarefa que não nos envergonha e nos enobrece, excedendo em muito o que fizeram outras nações, dominadas apenas pelo egoísmo da ganância e da cobiça.
Não é na verdade este o lugar mais próprio para a exposição do que este homem realizou em terras africanas, equacionando e resolvendo dentro das suas atribuições problemas de assistência médica, de higiene, habitação, limpeza e vestuário, de alimentação, de protecção à economia familiar, e tantos outros, postos com evidente clareza e propriedade, por quem soube compreender as necessidades de uma população filha de Deus como nós o somos e que ele amou dentro das máximas do Evangelho.
Sei bem, Sr. Presidente, que estou a alargar demasiadamente as minhas considerações, mas nesta hora em que o mundo adverso, onde reina a mentira e a