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1740 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 66

Sr. Deputado Lopes Roseira, cujo vigoroso apoiado só com irónica contradição pode considerar-se restritivo.

Lembro-me de que houve quem convidasse o presidente da Comissão do Ultramar a intervir e a resposta foi que de modo algum, porque seria muito grave que no momento em que Moçambique acompanhava com apaixonada ansiedade a tragédia de Angola se levantasse uma sua voz que, no bom desejo de suavizar a chicotada ouvida com o amaciar da linguagem ou o desenvolver mais sereno das ideias formuladas com agressividades bravias de micaias, pudesse interpretar-se como sendo Moçambique a negar a sua compreensiva solidariedade de fundo à martirizada e ensanguentada Angola.

Aliás, o tempo, cujo transcurso é precioso auxiliar da inteligência dos factos, encarregou-se, com a sabedoria que tem, porque é velho, de provar, insofismavelmente,- que, para além da violência e da veemência com que se disse, e de como se disse, foi posta à consciência nacional em 15 de Março uma problemática considerável e fundamental.

Também a Câmara não ignora que esse discurso produziu grande emoção em toda a metrópole, Angola e Moçambique, como novos estilhaços da guerra de Angola que caíssem em Lisboa, Luanda, Beira ou Loureço Marques. Muitos meses depois, quando cheguei ao Chiado da minha terra, era ainda fresca a ânsia de pormenores. Queriam saber como reagira, na superioridade do seu altíssimo espírito e como guardiã e suprema garantia do bem dos povos nacionais, esta Assembleia Nacional, que faz as leis que os regem.

E eu contei. Contei que a Assembleia, com o mais acrisolado amor pelos povos, manifestara, na orquestração eloquente das autorizadas vozes que patrioticamente ripostaram em nome do brio nacional, a sua mais convicta fé nos gloriosos destinos da Pátria e invectivara duramente o Deputado que duvidara desses destinos nos caminhos seguidos até agora. Alguém me perguntou: «E então? Vocês não disseram nada?» E eu respondi: «Não, nós não dissemos nada». Todas as caras que me rodeavam ficaram mudas a olhar-me, com seus olhos de censura incómoda, e por momentos breves e angustiosos caiu o silêncio sobre nós, pesado como o mármore negro da mesa.

Pois sobre um memorável discurso temos agora o de 12 de Dezembro. Não me é possível medir aqui a impressão que este terá causado em Moçambique. Mas de qualquer forma não aconselho ninguém a ser fiador dela, porque eu estava lá quando apareceram na imprensa local as primeiras referências ao livro do Sr. Doutor Pacheco de Amorim, que aliás- já conhecia, porque o lera antes de sair de Lisboa.

Deste modo, quando a opinião pública de Moçambique começou a alvoroçar-se e a manifestar forte propósito depreciativo a traduzir indignação unânime em tom de escândalo público, eu estava senhor da doutrina e da sua forma, e podia tentar avaliar a reacção pública a tal ideia. Foi, portanto, em pleno ambiente laboratorial que me dediquei a observar as reacções da cobaia, isto é, do público, ao estupefaciente da integração nova, medicada com o auxílio valioso e expressivo do ilustre Deputado angolano.

A Câmara não estava lá, e tenho por isso muito gosto em informá-la, mas peço a cada um dos Srs. Deputados que me escutam o favor de obter por outras vias a contraprova do que digo.

Também chegaram a Moçambique curiosas notícias telegráficas referentes à peregrinação do ilustre Deputado ?- seu conjunto, que alertaram a opinião pública mais esclarecida da província, a qual, como é seu hábito e seu direito secular, fiscaliza com zelo verdadeiramente policial todos os actos da metrópole e verbera impiedosamente os insensatos.

O Sr. Pinheiro da Silva: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Rogo a V. Ex.ª se digne pedir a palavra depois de terminar o meu discurso.

O Sr. Pinheira da Silva: -Compreendo ... V. Ex.ª está no uso de um direito que lhe assiste.

O Orador: - O meu escrúpulo, na simples reportagem que estou a fornecer a Câmara, obriga-me a acentuar o espanto com que Moçambique viu envolvido no caso o ilustre Deputado de Angola, pelo que ao povo que pensa não foi possível deixar de considerar estranha tal presença.

Estranha, porque Moçambique sabe quanto Angola tem suplicado em vão que o Governo lhe outorgue uma descentralização tão ampla que lhe permita governar sobre si a sua própria vida e intervir directa e activamente na orientação, preparação e execução das soluções requeridas pelos problemas autenticamente nacionais, o que significa que Angola quer legitimamente participar nas decisões nacionais, sem ser apenas com o mero formalismo do sete Deputados nesta Assembleia, onde aliás estão inteiramente privados de qualquer iniciativa de lei que dê satisfação suficiente a tão razoáveis, justos e coerentes desejos.

Sinto que Moçambique está inteiramente de acordo com esta problemática angolana, que é sua também, e não só deseja que se efective a participação angolense na solução dos problemas nacionais que também se repercutem em Moçambique, como deseja que todas as províncias ultramarinas tenham voz autenticamente activa nos destinos da Nação que todas formam.

Outro motivo de espanto em Moçambique diz respeito a ter-se efectuado intencionalmente na metrópole a digressão divulgadora. Moçambique não levou isso a bem, porque pensa com justa razão que qualquer grupo que surja com a intenção de apregoar ideias contrárias às das províncias deve deslocar-se às próprias províncias para localmente convencer as populações interessadas do erro em que estejam.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - E meu dever acentuar quanto Moçambique é sensível ao que ela considera movimentos tendentes a erguerem a opinião metropolitana contra a opinião ultramarina. É inegável que o ultramar considera a metrópole mal informada das realidades ultramarinas e mal preparada, portanto, para elaborar sozinha teorias governativas de âmbito nacional, que forçosamente assentam em falsas verdades.

O Sr. Aguedo de Oliveira: - A recíproca também pode ser verdadeira.

O Sr. Pinheiro da Silva: -É a única verdadeira, Sr. Dr. Aguedo de Oliveira.

O Orador: - Todavia, Moçambique não está certa se essas falsas verdades, feitas mais de lógica geométrica do que de factos reais, traduzem apenas ignorância ingénua ou não exprimem nem ignorância nem ingenuidade, nem sequer o patriotismo exaltado que é tão comum á