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9 DE JANEIRO DE 1963 1745

Em Braga, na minha qualidade de presidente da Camará, função que então exercia, ajudei a criar uma cooperativa que promovesse o fornecimento de leite a cidade. Levou-me a isso não só a melhoria higiénica que ao produto seria dada, e de facto se deu, mas também uma prometida melhoria de condições de compra à lavoura local. Resultado, resultado de que me penitencio, a lavoura está a vender o leite a um preço que mal chega a 50 por cento daquele a que é vendido ao consumidor.

Os lavradores queixam-se justamente do baixo preço por que lhe compram o produto. Os dirigentes da cooperativa, a quem levei a reclamação, dizem-se abandonados por determinadas entidades do Ministério da Economia, que tinham obrigação de os amparar, e que a falta de fiscalização permite a entrada de leite clandestino, o que onera, como é lógico, a distribuição, além do desrespeito pela lei a que habitua a população, o que também considero grave.

Vão agora falar aos meus amigos das aldeias - a quem escutei os desabafos e prometi trazer o caso até esta tribuna - em cooperativas e coisas no género. Há experiências que têm de ser muito cautelosas, para que não se desacredite o sistema.

Pressinto que me vão acusar de estar a fazer demagogia, mas a verdade é que as palavras que estou pronunciando não agradam ao homem da cidade, e é este, o das esquinas e das mesas de café, que desgraçadamente faz opinião.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - Se na verdade este não pode pagar mais pelos produtos que o campo lhe entrega, creio que de momento não há que indemnizar a lavoura através de subsídios que possam ajudá-la a manter a sua exploração agrícola de pé.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - De contrário, não tardará que o homem da cidade seja obrigado a pagar mais caro os produtos da terra, pois estes vêm forçosamente a escassear e teremos de recorrer a importação, e a fuga de divisas será enorme. Repare-se no que se está a passar já com a batata.

O Sr. Amaral Neto: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faz favor.

O Sr. Amaral Neto: - O problema para o Homem da cidade não é só o risco de lhe faltar a alimentação. É também o de lhe faltar a colocação dos seus próprios produtos, pela falta de recursos da enorme população do campo.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - Técnicos, crédito e valorização dos produtos, eis as medidas de emergência que é necessário encarar muito a sério. E a propósito, porque esperamos para criar escolas, fora dos grandes centros, que formem técnicos de nível médio, que são aqueles de que a lavoura mais precisa? Apelo para o Sr. Ministro dos Finanças, para que estabeleça desde já os necessários e indispensáveis créditos, e para as juntas distritais, que bem poderiam auxiliar estes desígnios, aumentando assim a sua esfera de actividade, reduzida pelas últimas reformas do Código Administrativo.

Sr. Presidente: uma das maneiras de devolver ao agrário aquilo que o urbano lhe tem surripiado constantemente seria a concessão do abono de família aos trabalhadores rurais.

Em reunião recentemente realizada na vizinha Espanha, sabem-no bem os portugueses que ali nos representaram, fomos severamente criticados por ainda não termos concedido o abono de família aos nossos rurais. E que constituímos quase excepção na Europa.

A Corporação da Lavoura reclamou ao Governo uma série de medidas que vão de encontro às instantes necessidades do momento - fê-lo com um vigor que agradou a minha consciência de homem livre -, e entre elas a concessão do abono de família aos trabalhadores do campo.

Estou certo de que o Governo não se recusará a encarar de frente este problema de ordem social, de ordem económica e de ordem política. Não pode negar-se por mais tempo a fazê-lo. Não se diga que não temos possibilidades financeiras. Mobilizem-se para o efeito determinados fundos, em grande parte criados à custa da lavoura, e elas serão encontradas.

E evidente que a pobreza da nossa economia põe dificuldades a resolução deste e de outros problemas.
Não podemos negar que o nosso desenvolvimento, apesar de vivermos no período de plena expansão do nosso II Plano de Fomento, é de molde a criar as mais justas preocupações.

No Porto, no simpósio que benemeritamente promoveu a União Católica dos Industriais e Dirigentes do Trabalho - a que eficientemente preside o nosso distinto colega Alfredo Brito -, perante uma numerosa e qualificada assembleia, escutámos um homem de grandes responsabilidades e autoridade, o antigo Ministro e Deputado engenheiro Daniel Barbosa, afirmar que Portugal continua com a lanterna vermelha nos índices da produção e consumo.

Há, pois, que procurar a causa da nossa relativa estagnação, encontrar o motivo do marasmo em que se desenvolve penosamente a nossa economia.

Se uma actividade económica se desenvolve naturalmente, de modo a procurar satisfazer as necessidades materiais, que são o alicerce da vida humana e a preocupação constante de todos nós, se satisfaz, em toda a plenitude, as necessidades básicas da conservação da espécie e permite a satisfação de outras que o progresso material vai tornando apetecíveis a todos, então poderemos, sobre ela, firmar o estabelecimento de novos progressos sociais e políticos. Mas se, mesmo dirigida, não consegue que o progresso traga satisfação às necessidades mais prementes do povo, então não poderemos construir nenhum sistema social ou político sobre tais alicerces, e teremos de procurar determinar se o defeito está no sistema ou nos homens, dirigidos ou dirigentes. As leis e os homens que as executam servem ou não conforme servem ou não o bem dos povos.

Se a nossa economia vive, como parece confirmar-se, como a semente da parábola que cai em terreno bom, cresce, mas é abafada pelos espinhos, é necessário e urgente que esses espinhos sejam arrancados, para que se não estiole e seque a planta que nasceu da boa semente. Proceda-se a selecção devida e que conhecedores do seu ofício, conscientes da escolha, distingam o trigo do joio - que tantas vezes se veste com as mesmas roupagens daquele. E que, depois de feita a selecção é a escolha, seja possível utilizar todos os meios de que o Governo pode lançar mão para destruir as ervas daninhas, de modo a que a seara cresça e se desenvolva em toda a sua plenitude.

A recente publicação do Decreto-Lei n.º 44652, remodelando profundamente a orgânica funcional da economia nacional, alegrou-me sobremaneira, pois o seu aspecto de orientação no nosso futuro económico é de forma a