9 DE JANEIRO DE 1963 1747
dustriais que vivem a coberto de uma tácita e injusta protecção legal, tudo fabricando com uma inconsciência técnica e económica que á largamente ofensiva para a nossa dignidade de consumidor. O certo é que o público vai adquirindo os seus produtos, o que lhe vai minando a sua capacidade de escolha. O panorama do nosso mercado, que consegue consumir toda a classe de produtos de segunda ordem de que se encontra inundado, é de molde a causar verdadeiro, alarme aos futuros industriais.
Chegamos assim a um ponto em que um círculo vicioso entre as necessidades de consumo e a qualidade dos produtos fabricados toma impossível qualquer progresso económico, a não ser que a nossa possível entrada no Mercado Comum torne forçado o progresso da nossa indústria, por libertação de produtos estrangeiros. Lamente-se, contudo, que só assim seja possível encontrar um motivo de progresso e que só a competência assim estabelecida possa transformar o público em juiz da sua escolha.
A dignidade do consumidor exige necessariamente que lhe seja atribuído este papel e que seja ele de facto o determinante consciente do desenvolvimento industrial e da sua linha de rumo. Querer o contrário é inverter a ordem natural dos coisas.
Além disso, devemos acentuar que uma imposição aos gostos, preferências e necessidades do consumidor, feita, embora indirectamente, pelo Estado e à base da lei, corresponde a defender-se o princípio do esmagamento da dignidade humana e a estender a este Portugal cristão os princípios socialistas e comunistas que combatemos teoricamente. (Risos).
Estamos na hora em que a própria navegação se orienta pela pilotagem automática, a que só é necessária a regulação de posta em marcha e pequenas intervenções de correcção; sigamos os mesmos princípios na ordem económica, e que a intervenção do Estado, neste sector, não passe de uma orientação primária e de simples acções de correcção do rumo traçado.
E tempo de considerarmos ultrapassada a fase a que faz referência a lei do condicionamento, pois que, dada a evolução da política económica internacional, o desenvolvimento e o equilíbrio da nossa economia processam-se no sentido da libertação de peias legais e burocráticas para indústrias e industriais válidos produtores de bens de consumo necessários - ao desenvolvimento e ascensão do nosso nível de vida.
Toma-se necessário proteger o consumidor contra o industrial sem escrúpulos, obrigando-o a produzir bem e barato, integrando-o numa perfeita economia de mercado, obrigando-o a viver num ambiente de competência honesta, sujeita ao tribunal imparcial dos interesses do consumidor, que são, afinal, os interesses da comunidade.
O nosso sistema económico, nos sectores de oferta e procura de bens de consumo - que são aqueles que farão prosperar o nosso nível económico e aumentar o valor do produto bruto nacional -, vive numa situação de atraso histórico, sendo o ambiente mais parecido com o da economia medieval do que com os sistemas económicos que tornaram materialmente feliz a vida dos homens que constituem as nações do chamado Mundo Livre.
Há outro ponto fundamental a considerar nas medidas que o Estado possa tomar no sector da economia: dizem respeito às suas consequências consideradas a curto e a largo prazo. Nem são justificadas medidas que, beneficiando a sociedade neste momento, a venham a prejudicar mais tarde, nem medidas que exigem sacrifícios actuais para a concessão de benefícios a longo prazo. Ainda mais uma vez a Igreja se pronuncia sobre assunto de tão magna importância económica, através da voz autorizada do actual Papa, aconselhando a máxima prudência no estabelecimento entre o presente e o futuro. A geração presente não pode ser, por mais tempo, uma geração de sacrifício, mas, se todos quisermos, ela será, sem dúvida, a geração do resgate.
Não foi meu intuito trazer a esta Casa soluções - o que seria ridículo -, mas sim denunciar uma situação alarmante: a da lavoura nortenha, e apontar possíveis motivos de entrave que se verificam e ainda uma palavra de incentivo aos que sobre si tomavam a tarefa de fazer esta velha Nação cada vez maior. Tenho a consciência de que usei uma terminologia que não será talvez a mais conveniente, mas, como sempre, não quis deixar de ser igual a mim próprio. Nasci e vivo no Norte, onde as almas se temperam na rigidez da verdade, talvez porque as dificuldades que se lhe deparam são maiores. Deixei que os cabelos brancos me poisassem na fronte sem dar por isso. Quase não conheci a mocidade: desde novo, mesmo muito novo, me deixei seduzir pelo serviço do regime em que vivemos e em cuja potencialidade continuo a acreditar para resolver as dificuldades que nos afligem.
Sabemos que o nosso atraso económico advém da rotina de séculos e não negamos, antes orgulhosos o podemos afirmar, o progresso deste país nas últimas décadas, progresso que se tem reflectido no melhor viver da nossa gente. Não estamos de mãos vazias - quem poderá negá-lo? -, mas o que Afirmamos é que no sector económico se tem perdido muito tempo e estamos, possivelmente, agarrados a conceitos e disposições que, longe de favorecerem o seu desenvolvimento, têm contribuído para uma certa estagnação.
Temos de considerar que o equilíbrio e desenvolvimento da nossa economia, em breve integrada no Mercado Comum, não se coaduna com os impedimentos legais e burocráticos a que está sujeito o sector da produção. Há que dar mais amplas possibilidades a iniciativa privada, considerando que a liberdade de trabalho é uma das liberdades expressamente definidas na nossa Constituição Política.
Estimular o gosto do consumidor de forma a podermos modificar os nossos índices de consumo é absolutamente necessário e, para isso, há que amparar a apresentação no mercado de bens de consumo em qualidade e quantidade satisfatórias. Impõe-se diminuir, tanto quanto o permita a concepção do bem comum rectamente entendida, a intervenção do Estado no sector da economia debaixo da orientação dos princípios definidos pela Igreja.
Temos de eliminar os desequilíbrios gritantes existentes entre diferentes sectores de produção que se verificam entre nós, nomeadamente promovendo a ascensão ao nível humano no sector agrícola. Mais do que em qualquer outro campo, o sector agrário precisa de ajuda, e ajuda imediata.
Termino, Sr. Presidente, com uma palavra de certeza: temos as condições necessárias para nos libertarmos da mediania em que vivemos e não nos permite voar tão longe quanto se toma necessário. O que é preciso é decisão. Que ela não falte aos homens, pois seria pena não conseguirmos tirar do muito que temos feito os apetecidos frutos, frutos necessários ao viver digno da nossa gente e a posição de Portugal como nação livre e eterna no mundo que se avizinha.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.