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1876 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 72

Toda a gente sabe que as receitas próprias de que as câmaras municipais actualmente dispõem não chegam para fazer face às suas obrigações. O Governo, a Câmara Corporativa e a Assembleia assim o reconhecem, encarando o recurso às derramas e admitindo, portanto, até, que uma receita extraordinária sirva para fazer face a uma despesa normal, ordinária, como muito bem disse o ilustre relator do douto parecer da Câmara Corporativa.

Mas as derramas, admitidas no n.º 2 da base XXXII, não resolvem a situação a que me reporto: são antipáticas, têm desagradável repercussão política; têm carácter temporário, anual, que não serve para resolver uma dificuldade permanente e só serve, quando muito, para atenuar passageiramente a gravidade do existente; levam muito tempo a ser concedidas e, além disso, a autorização para as lançar nem sempre corresponde ao que foi solicitado. Como se diz no douto parecer da Câmara Corporativa, 164 dos 273 concelhos solicitaram autorização para lançar derramas em 1959, as quais totalizaram cerca de 24 000 000$, o que dá bem a ideia das suas necessidades. Estou certo de que se maior não foi o número das que pediram, foi pelas razões que acima citei.

Por tudo isto, exprimo o desejo de que o .problema venha a ser corajosamente e dentro em breve encarado pelo Governo, criando o Fundo Nacional de Assistência, por um adicional às contribuições gerais do Estado ou por qualquer outra via. Assim se criarão as condições que permitam resolver uma grave situação que afecta seriamente a vida dos hospitais e se abrirá um novo ciclo à actividade municipal.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Presidente: - Continuam em discussão.

O Sr. Soares da Fonseca: - Um breve apontamento. Ouvi com a maior atenção as intervenções dos Srs. Deputados Nunes Barata e Santos Bessa, brilhantes como todas as que SS. Ex.ª proferem quando usam da palavra, e em especial as críticas por SS. Ex.ª feitas à situação difícil das câmaras municipais e às obrigações legais de todas em matéria de responsabilidade financeira por serviços de saúde e assistência.

Como SS. Ex.ª, eu queria exprimir que a Administração tomará na devida conta muitas dessas considerações feitas por SS. Ex.ª e procurará dar remédio aos males de uma maneira justa.

Disse o Sr. Dr. Nunes Barata que as derramas e as taxas que as câmaras municipais lançam por vezes são fatais. As taxas e as derramas lançadas pelas diferentes câmaras são, na minha opinião, lançadas sempre com a maior seriedade. For exemplo: uma câmara municipal precisa só de 1000; seria injusto que a derrama fosse além de 2 por cento, mas se precisar de 2000 essa taxa irá até 3 ou 4 por cento.

Quer dizer: a diversidade de taxas é fatal num sistema de derramas. As taxas variam de câmara para câmara.

O Sr. Presidente: - Continuam em discussão.

O Sc. Proença Duarte: - A propósito da base em discussão, foi posto aqui o problema financeiro que advém para as câmaras da sua obrigação de assistência hospitalar. Também reconheço, Sr. Presidente, essa dificuldade que advém para as câmaras e os prejuízos que .para elas acarreta o dispêndio que têm de fazer com a assistência, em prejuízo de outras realizações de interesse público.

Mas a verdade é que, por outro lado, surge um outro problema, que é o problema das Misericórdias.

As Misericórdias têm o dever de receber os doentes pobres e os indigentes. Segundo a lei, está consignado que as câmaras serão responsáveis por uma percentagem da despesa a fazer com esses doentes, e daí adveio aquela problema, já aqui referido, de que as câmaras, por divergências de critérios na interpretação da lei, entre o Ministério da Saúde e Assistência e o Ministério do Interior, se recusam a pagar às Misericórdias os 30 por cento sobre a diária dos doentes, indigentes e pensionistas, .por entenderem que na verba consignada para diária está incluído tudo o que o doente precisa de despender para o seu tratamento, enquanto as Misericórdias entendem que a diária se refere só ao estacionamento e alimentação do doente e que todas as outras despesas com radiografias, análises e outros medicamentos necessários para o tratamento é que constituem o montante sobre o qual devem incidir os 30 por cento.

Daqui advém que as Misericórdias recebem os doentes, têm que lhes' dar os medicamentos necessários, radiografias e análises, e no fim não são compensadas pelas despesas feitas.

Este diferendo de interpretação da lei foi já submetido a parecer da Procuradoria-geral da República, que entendeu que o Ministério da Saúde e Assistência é que tinha razão. Porém, o Ministério do Interior continua a ordenar que as câmaras não paguem mais do que aquilo que entendem como diária.

De uma Misericórdia sei eu que é credora de cerca de 1000 contos e, porque os não recebe, deve aos fornecedores uma importância de 700 contos e verifica-se, então, isto que não se compreende: as Misericórdias a accionarem as câmaras. Isto não é prestigiante e mesmo nos casos em que as câmaras são condenadas elas levam às vezes cinco anos a fazer os respectivos pagamentos, enquanto as Misericórdias têm de pagar as despesas num prazo muito mais curto.

Ora a situação das Misericórdias é precária e crítica, como todos nós sabemos.

Sr. Presidente: nos tempos que correm, coda vez mais, as populações, sobretudo as menos protegidas, não compreendem, não aceitam nem se conformam com a falta de assistência médica, internamentos hospitalares e tudo quanto se relaciona com a sua saúde.

E, portanto, a assistência hospitalar que as Misericórdias prestam aos pobres e indigentes é hoje um imperativo da ideia cristã e social.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Assim, Sr. Presidente, seria muito para desejar que das considerações que aqui se fizeram saísse uma interpretação da lei no sentido de que essas despesas são uma responsabilidade dos concelhos por aquilo que devem pagar às Misericórdias pelos tratamentos que estas façam aos doentes dos respectivos concelhos.

Ë evidente, e estaria de acordo com a solução preconizada, muito embora sem qualquer proposta, pelo Sr. Deputado Nunes Barata, quando propõe que seja criado um Fundo Nacional de Assistência para ocorrer a estas despesas, porque assim, Sr. Presidente, todos aqueles que deviam contribuir contribuiriam para essa assistência hospitalar, ao passo que, por outros meios indirectos, conforme ontem já aqui afirmei, muitos há que ficam isentos desse pagamento, porque voluntariamente o não fazem e obrigatoriamente não lhes é imposto.