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1892 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 73

O Sr. Cutileiro Ferreira: - Sr. Presidente: pedi a palavra para mandar para a Mesa o seguinte

Requerimento

«Porque chegou ao meu conhecimento que o Arquivo Distrital de Évora - um dos mais importantes do País - está em risco de eminente destruição, pela humidade e suas devastadoras consequências; porque me consta que não foram consideradas as opiniões dos técnicos competentes no assunto, requeiro, Sr. Presidente, que, pelo Ministério da Educação Nacional, me sejam urgentemente fornecidos os pareceres que levaram à transferência do referido Arquivo para as novas instalações, que tudo leva a crer conduzirão a gravíssimos prejuízos num valorosíssimo sector do património cultural nacional.

Fundamentalmente interessam os pareceres e relatórios dos Srs. Inspector Superior das Bibliotecas e Arquivos e Director da Biblioteca Pública e Arquivo de Évora».

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente:-Está em discussão na generalidade a proposta de lei sobre saúde mental. Tem a palavra o Sr. Deputado Santos Bessa.

O Sr. Santos Bessa: - Sr. Presidente: a extraordinária importância que há-de vir a ter para a saúde pública a execução da lei em que for transformado o projecto agora em discussão obriga-me a fazer algumas considerações a respeito dos objectivos que ele visa atingir: a prevenção e tratamento das doenças mentais, a recuperação dos indivíduos diminuídos por efeito dessas mesmas doenças e o estabelecimento da estabilidade do seu equilíbrio psíquico.

Em Portugal, como, aliás, no Mundo inteiro, o problema da saúde mental tem tomado sérias proporções, diremos mesmo uma acuidade tal que passou a ocupar um dos primeiros lugares entre os problemas sanitários a resolver com urgência.

A Câmara e o País têm consciência da gravidade do problema, e por isso mesmo não é necessária a citação de números para justificar a atitude do ilustre Ministro da Saúde e Assistência Martins de Carvalho, que subscreveu este projecto de lei, e o louvor que lhe dirijo por o ter feito. E quero felicitar também o autor do douto parecer da Câmara Corporativa, o Prof. Bissaia Barreto, ...

O Sr. Pinto Carneiro: - Muito bem!

O Orador: - ... que desde há algumas décadas se consagra ao problema da assistência psiquiátrica, a quem se deve o Hospital Sobral Cid e o de Lorvão e a mais intensa campanha em prol da actualização das técnicas de assistência psiquiátrica que neste país se realizou e que serviu de base à reforma que se concretizou na Lei n.º 2006.

O Sr. Pinto Carneiro: - Muito bem!

O Orador: - Em todo o Mundo, desde há um século a esta parte, tem sido constante o aumento do número de doentes mentais, em proporção variável conforme a incidência dos múltiplos factores que o determinam.

Isto apresenta-se como uma verdade a toda a gente.

No entanto, um professor ilustre (Miller Guerra) diz textualmente, em trabalho recente:

Não há nenhuma prova de que as doenças mentais (psicoses) tenham aumentado com a civilização e também ainda se não demonstrou que as psicopatias e as neuroses sejam mais numerosas do que foram algumas décadas atrás, embora seja provável que assim aconteça. A única coisa incontestável é que o indivíduo procura o auxílio do psiquiatra mais frequentemente do que outrora procurava.

E uma verdade que a vida civilizada exerce hoje sobre o homem uma mais intensa pressão que noutras eras e que nas sociedades evoluídas se repetem com frequência as tensões e com elas se geram conflitos emocionais e reacções psicológicas abnormes que o indivíduo procura resolver com o apoio do médico, como diz o mesmo professor. Mas isto mesmo gera a insegurança e a ansiedade e, portanto, a desadaptação.

A passagem do meio natural ao meio técnico, segundo o conceito de G. Friedmann, arrasta consigo a submersão de certas massas sem preparação psicológica ou cultural para essa mudança de condição de vida. A industrialização de certos países tem-no demonstrado claramente e o nosso, em plena fase de industrialização progressiva, não faltará à regra.

Entre os factores que geram essas perturbações mentais citaremos: a racionalização do trabalho das oficinas, os ruídos das fábricas e da própria cidade, a intensidade do tráfego, as exigências cada vez maiores das famílias, a atracção das diversões, a mudança dos hábitos, o desejo de ascensão social, a sensação de insegurança, a mais frequente desarmonia familiar, a desadaptação, etc.

Todos esses estímulos e traumas, principalmente quando ligados a um factor hereditário, geram perturbações mentais, tanto mais intensas e frequentes quanto mais frequente e intensa é a acção desses agentes e menos robusta a capacidade do indivíduo para lhe resistir. Se não aumentam as psicoses, aumentam pelo menos as neuroses e algumas psicopatias.

Pêlos últimos inquéritos realizados, e segundo o Prof. Baraona Fernandes, um quarto ou um terço das faltas do pessoal registadas na indústria são causadas por afecções mentais, muitas delas consequências de neuroses geradas por perturbações do meio familiar e das condições de trabalho. Neste particular, têm marcada influência a selecção profissional dos operários, o tamanho da fábrica (quanto maior, pior), a monotonia do trabalho mecanizado (aliás já salientado num excelente filme de há anos), a automatização anulando a iniciativa individual, má adaptação às condições de trabalho, etc.

A profilaxia nem sempre é fácil e o êxito das medidas aplicadas para atenuar a acção prejudicial destes elementos nem sempre é segura.

Como se diz na proposta, nos Estados Unidos da América, 40 a 50 por cento dos leitos dos hospitais são agora ocupados por doentes mentais e em Portugal, em dez anos, houve um aumento de 10,7 por cento destes doentes.

E podemos juntar que na Inglaterra uma pessoa em cada vinte precisa de tratamento psiquiátrico em qualquer altura da vida. Isto sem falar nas neuroses e na maioria das psicopatias. Estas parece serem quatro a cinco vezes mais numerosas que as formas psicóticas (Miller Guerra).

E, efectivamente, estatísticas recentes de Fein (1958) e de Ablee (1959), citadas por peritos da Organização Mundial de Saúde, mostraram um aumento real das perturbações mentais nos últimos anos.