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2080 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 82

necessariamente muitas vantagens práticas, dada a natureza dos veículos a que aludi.

O Orador: - Estou perfeitamente de acordo com V. Ex.ª, pois é exactamente essa a angustiosa situação que na minha carreira de advogado tenho encontrado. É essa exactamente. Na minha pequena exposição tive oportunidade de referir ao seu número, que é grande.
Os condutores de veículos a que V. Ex.ª se refere, veículos com motor, tiveram, em 1961, 81 casos fatais, ou seja de mortes, mas os feridos, que são os que pesam mais nos tratamentos - um morto acaba, é um enterro, é um drama! -, que são às dezenas, se não às centenas, e dão lugar a outros tantos dias de hospitalização e de tratamentos dispendiosos. Os 2286 feridos é que pesam enormemente em todos os hospitais. E o mais estranho é que, como acabei de referir, eles foram tratados, socorridos é internados gratuitamente na maior parte dos casos, porque, por via de regra, os condutores não dispõem de quaisquer recursos, e muitos deles nem sequer pagaram totalmente os veículos, que adquirem a prestações semanais.

O Sr. António Santos da Cunha: - E terão recursos para adquirir a apólice de seguro?

O Orador: - Não têm possibilidades de comprar a pronto e não têm possibilidades também de pagar os 60$ por ano por seguros contra terceiros e, o que é pior, dê segurar o próprio tripulante.

O Sr. António Santos da Ganha: - Então, fechem-se as fábricas!

O Orador: - Não estava a falar da fábrica de Braga ... (risos).
Um dia, em Roma, tive conhecimento de um apelo da imprensa a pedir para se pôr cobro aos desmandos das bicicletas motorizadas em toda a Itália. O ruído era de tal modo intenso em todas as ruas de Roma que os turistas americanos não se aguentavam lá mais de uma noite, por não poderem dormir. E eu próprio, na segunda ou terceira noite que lá dormi, verifiquei que o ruído era, na verdade, ensurdecedor. Além dos desastres, do impecilho do trânsito, o barulho.
Não sou inimigo da motorização nem das bicicletas motorizadas. Mas sei o drama das vítimas das bicicletas; por isso me atrevi, pelo menos, com o aplauso do Sr. Deputado Amaral Neto, a sugerir aqui que o seguro não fosse de mera responsabilidade civil, mas também do próprio condutor.
Não vejo impossibilidade de a nossa indústria seguradora poder cobrir os riscos referidos e em condições razoáveis de preço. Bastará pensar que o vultoso aumento de carteira de seguro permitirá certamente uma mais económica cobertura individual dos riscos e a organização de serviços eficientes à escala nacional. Requeri há dias alguns elementos que me permitissem ajuizar mais concretamente da percentagem dos veículos em circulação no País a coberto de apólices de seguro de responsabilidade civil.
Não os obtive ainda (e isto não envolve qualquer crítica, pois reconheço ter sido escasso o tempo de dilação).
Mas nem por isso deixo de manifestar a esperança de que em breve seja imposta a obrigatoriedade de transferência do risco em causa em relação a todos os veículos motorizados, incluindo os velocípedes com motor, e quanto a estes também a cobertura dos riscos pessoais do próprio condutor.
Não considero essa imposição impeditiva da circulação rodoviária nem o seu gravame incomportável.
Todos os que se deslocam por estrada ao estrangeiro sabem, como eu, que nas fronteiras o único documento verdadeiramente essencial para o trânsito é a carie verte, a apólice de seguro válida. Já me sucedeu em diversas passagens de fronteiras, nomeadamente nas de Itália, Suíça, Bélgica, Holanda e França, ser esse o único documento exigido, e com interesse. Os passaportes, esses quantas vezes nem chegam a merecer uma simples olhadela, quanto mais um carimbo!
Se é assim por toda a Europa Ocidental, porque não há-de ser também em Portugal.
Mal se compreende que haja ainda quem ponha em circulação um veículo motorizado de qualquer tipo, sem se assegurar da possibilidade de arcar efectivamente com os danos que ele possa causar, por fatalidade, nas pessoas e nas coisas.
E doloroso é tantas vezes ver a inutilidade do arbitramento de indemnizações ou obrigação de pagamento de encargos às vítimas, seus familiares ou instituições assistenciais, que afinal nada recebem, porque não há património exequível.
Vou terminar.
É realmente inesgotável a problemática que este aviso prévio sugere.
Acidentes de viação havê-los-á sempre e, o que é pior, cada vez em maior número. Temos todos, no entanto, o dever de, na medida das nossas luzes e possibilidades, concorrer para que não se percam tantas vidas e haveres nesta medonha corrida contra o tempo que é a circulação rodoviária.
Antigamente rezava-se nas velhas casas pelos que, embora estranhos, andavam sobre as ondas do mar. Penso que agora já ninguém se lembra de encomendar a S. Cristóvão os que a pé ou, como curiosamente se diz no Alentejo, a cavalo (isto é, sobre qualquer veículo) se afoitam a cruzar os caminhos perigosos do mundo sólido.
Disse-se que nas estradas, não só as portuguesas, mas de todo o orbe, dominava a lei da selva.
Creio haver algum exagero nisso.
O que haverá por toda a parte, cá como lá, é peões deambulando descontraidamente; crianças à solta e em correrias nas estradas; camiões mastodônticos que só por ironia trazem apostos dísticos a indicar a velocidade máxima e que temos dificuldade de ultrapassar ao dobro dessa velocidade; condutores distraídos a ver a paisagem ou a cavaquear alegremente com a companheira (que pode revestir a agradável e perigosa forma discretamente denominada «flausina» pelo respeitável autor do aviso prévio e que me veria embaraçado para traduzir para vernáculo); os que andam devagar de mais, empecilhando o trânsito; os que andam depressa de mais, deixando um rasto de pânico; os apopléticos e sanguíneos, que parece verem em cada desconhecido que cruzam um velho inimigo; os cheios de si, que receiam sofrer o desaire de uma ultrapassagem; os impulsivos; os hesitantes, que nunca sabem se vão parar, virar ou prosseguir; as senhoras - nem todas - que devaneiam ao volante como perante uma passagem de modelos; os ciclistas suicidas, enfim, toda uma fauna indesejável de inexperientes, egoístas, incapazes ou simplesmente embriagados pela euforia da velocidade ou até outra forma de embriaguez.
E por trás de tudo isto não haverá uma crise de adaptação? Foi demasiado rápida a passagem dos sossegados