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9 DE FEVEREIRO DE 1963 2077

Perdoar-me-ão estas variações sobre tema tão do meu agrado e apenas apontarei outro aspecto, para mim apaixonante, do progresso automóvel:
O admirável aperfeiçoamento mecânico que conduziu às actuais maravilhas de conforto, velocidade, simplicidade, eficiência, que são os automóveis actuais.
Talvez não nos demos suficientemente conta do caminho andado, e rapidamente, neste domínio, desde os antepassados mecânicos de há 40 anos. A progressiva redução de cilindrada dos motores e seu alto rendimento, o espectacular aligeiramento no peso total dos veículos, a suavidade das suspensões, a precisão da direcção, a eficiência dos órgãos de travagem, a perfeita ténue de route, a duração e aderência dos pneus, e tudo isso generalizado em maior ou menor grau a uma enorme gama de tipos e marcas a preços que seriam acessíveis se não fora a pesada incidência dos direitos e taxas.
Na realidade o automóvel democratizou-se, fabricado em grande série em todos os modelos e destinos, e por forma geral com grande nível de eficiência.
Conseguiram-se velocidades espantosas, mesmo em carros de pequena cilindrada e baixo custo, e há no mercado carros de série de grande turismo que atingem os 160 km e mesmo 200 km por hora.
O banco de ensaio dessas fascinantes maravilhas mecânicas foi sem dúvida a pista de corridas, em que foram sucessivamente dominando as criações precursoras dos grandes especialistas europeus, franceses, alemães, italianos e, agora, ingleses, desde Delage e Etore Bugatti até Enzo Ferrari, passando pelo Dr. Porsche, por Alfa Romeo, Maserati e Mercedes, conduzidos por esses novos gladiadores das pistas que se chamaram Nuvolari, Benoist, Acchile Varzi, Vimile, Von Stuck, Carraciolo, Ascari, De Portago e Juan Manuel Fângio.
Este delírio ambulatório, que é uma das características da nossa época, e também uma das suas forças vitais, tem o reflexo trágico no imenso cortejo de vítimas, que, por fatalidade das coisas, vai crescendo inexoravelmente.
É esse afinal o preço, em sangue e vidas, da civilização mecânica que o homem deste século esforçadamente ergueu, colocando-a ao seu serviço.
Como o aprendiz de feiticeiro, o homem fez deflagrar uma medonha força, em si útil e já hoje irreversível, capaz no entanto de o triturar em proporções alarmantes.
E o sangue que para o asfalto vai escorrendo de tantos corpos dilacerados e estropiados nesta cavalgada implacável do progresso emociona crescentemente, e justificadamente, por toda a parte, a opinião pública, ainda não totalmente embotada na sua sensibilidade.
Daí um clamor geral para que se ponha um dique àquilo que já foi denominado de desumana carnificina por um pontífice romano.
São esses também afinal os generosos impulsos que determinaram a realização deste aviso prévio, que a Câmara acolheu com compreensível interesse.
Penso que todos estaremos de acordo em reconhecer que por mais eficazes que sejam as medidas destinadas a evitar os riscos de acidentes de viação estes não serão jamais suprimidos. Admitindo mesmo que relativamente seja possível reduzir o número e gravidade dos acidentes, o aumento sempre crescente, e desejável aliás, dos veículos em circulação não permitirá alimentar esperanças quanto à redução do número absoluto dos acidentes de viação.
Temos de partir desta premissa, sem dúvida trágica, mas única ajustada às realidades, sem que isso invalide os objectivos que estão na base deste aviso prévio e das meritórias intenções do seu autor.
Temos de fazer realmente um esforço - todos os esforços, para reduzir as possibilidades de acidentes de viação e lançar mão de todos os meios para a sua prevenção.
No enunciado do aviso prévio se enumeram alguns, que vão desde uma acção pedagógica a partir da escola primária (dando execução ao legislado em 1960), ao aumento dos meios de acção da Polícia de Viação e Trânsito, à obrigatoriedade de seguro de responsabilidade civil para todos os veículos motorizados e ao melhoramento das estradas.
Valerá a pena, entretanto, determo-nos um pouco no exame das estatísticas da sinistralidade de viação em Portugal, referido ao último ano de que estão apuradas, 1961.
Na totalidade foram registados 20 756 acidentes de trânsito, o que corresponde a um aumento substancial de cerca de 10 por cento em relação a 1960, quando é certo que a progressão de aumento havia sido mais suave nos anos anteriores, como mostra o seguinte quadro:

Número total de acidentes registados

1957......... 17 562
1958......... 18 125
1959........ 18 112
1960 ....... 18 900
1961....... 20 756

Quanto às consequências dos acidentes, há a notar um aumento substancial naqueles de que resultaram lesões corporais, tendo diminuído em números absolutos aqueles em que sómente se verificaram danos materiais (quadro n.º 39 do Anuário Estatístico dos Transportes Terrestres, 1961).
Afigura-se-me, no entanto, ser possível encontrar explicação para o facto na tendência de todos conhecida, e compreensível, de os condutores e proprietários de veículos evitarem sempre que possível a intervenção das autoridades no caso de o acidente sómente causar danos materiais nos veículos, chegando a acordo directo, ou através dos respectivos seguradores, quanto ao custeio das reparações.
De interesse é salientar que o número de vítimas de acidentes mortais foi em 1961 de 738 e de 17 197 o número de feridos, dos quais 5279 gravemente.
Dos 738 mortos, 339 eram peões, ou seja pouco menos de 50 por cento do total, avultando ainda a mortalidade dos condutores e passageiros de velocípedes sem motor, 94, e de velocípedes motorizados, 82. Isto significa que a sinistralidade mortal é sensivelmente maior nos peões e nos condutores de bicicletas, com e sem motor, como, de resto, o é também na sinistralidade geral por acidentes de viação.
Bastará dizer que em 17 935 vítimas 11 849 se incluem nos grupos «peões» e «condutores e passageiros de velocípedes».
Seria de interesse ainda uma apreciação mais detalhada da sinistralidade, extraindo dos quadros estatísticos, aliás muito elucidativos, do Anuário aos Transportes Terrestres elementos curiosos. Mas já que tal me não é possível, sem exceder os limites razoáveis desta exposição, respigarei apenas os seguintes apontamentos:
Dos 339 peões vítimas de acidentes de trânsito 76 eram crianças até aos 4 anos e 50 dos 5 aos 14. E dos feridos distribuíram-se por esses grupos de idades nada menos do que 670 e 1487.
A distribuição dos acidentes de viação por meses do ano revela que nos meses de Junho, Julho e Agosto se verificam mais acidentes, e que os sábados e domingos