3072 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 124
O interesse que suscitam os problemas da educação a todos quantos se sentem responsáveis pela formação das gerações futuras, quer como pais, quer como educadores, quer ainda como dirigentes ou orientadores nos vários sectores da vida nacional, prova-o o grande número de oradores que têm participado neste debate e o calor das discussões.
Embora consciente da dificuldade e responsabilidade de tratar tema tão complexo, sobretudo depois de ter ouvido as brilhantes intervenções dos que me antecederam, atrevo-me a subir a esta tribuna para dar o meu modesto contributo nas breves considerações que farei sobre alguns aspectos do ensino, em particular do ultramar.
Sr. Presidente: a rapidez com que a vida moderna se processa e as suas exigências vêm-nos demonstrando que vão sendo cada vez mais necessários, e a prazos cada vez mais curtos, os reajustamentos, as alterações e as reformas.
Apesar de algumas vezes se terem ajustado os planos e modificado os programas, verifica-se que o ensino já não corresponde, hoje nem às necessidades reais das crianças e dos jovens, nem aos interesses do País.
E, aliás, um fenómeno que se observa também noutras nações onde se procura dar ao ensino novas directrizes, quer por meio de planificações, quer por experiências, por vezes ousadas e dispendiosas, com o fim de adaptá-lo cada vez mais e melhor à natureza dos indivíduos, às necessidades das sociedades e dos Estados e ainda às possibilidades da vida futura.
Que o Governo está consciente da urgente necessidade de melhorar e actualizar o nosso ensino, provou-o já o ilustre Ministro da Educação Nacional, Prof. Galvão Teles, ao declarar publicamente o planeamento da acção educativa, cujos trabalhos estão já em curso, e ao expor o esquema da orientação que se pretende dar a essa tão grande realização. É uma obra oportuna e grandiosa, não isenta de grandes dificuldades, sobretudo num momento um que os problemas da defesa do território ocupam um lugar de primazia. Mas o problema da educação nos seus múltiplos e variados aspectos merece também um lugar primordial, pois que é da sua boa solução que resultará a forca humana capaz de sustentar física e moralmente a própria Nação nos difíceis dias de hoje e continuá-la no futuro.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
A Oradora: - Será, sem dúvida, por uma educação mais racional u adequada ao indivíduo desde a sua infância, à adolescência e à juventude e por um ensino mais perfeito, coordenado nos seus vários graus e harmonioso nos aspectos físico, intelectual c moral, que o homem se tornará não só mais apto para o trabalho, mas também mais consciente das suas responsabilidade como membro da colectividade a que pertence.
Sr. Presidente: ao fazer estas considerações tenho em mente o homem português, no seu conjunto, o da metrópole, e o do ultramar. Porque na alteração dos planos educativos, na reforma dos programas e dos livros que se fizer não poderá deixar de se ter em conta o vasto espaço português na sua diversidade e unidade. Há que atender, por um lado. à unidade que deve presidir ao planeamento da acção educativa no conjunto da Nação; por outro, aos ambientes diversos em que essa educação se vai desenvolver.
Deverão a arar-se as linhas mestras que orientarão a educação em todo o território português, definir-se as normas genéricas a que deve obedecer o ensino, mas atender-se também muito especialmente aos problemas locais resultantes da diferenciação geográfica e da diversidade dos povos.
Este dualismo do nosso ensino não tem sido devidamente considerado, porquanto ainda hoje nos estamos ressentindo da grave lacuna de um quase desconhecimento ou de um conhecimento muito imperfeito das províncias ultramarinas através dos diferentes graus de ensino e da inadaptação dos métodos, programas e livros ao ultramar.
Torna-se necessário reforçar o sentido da unidade por meio da intensificação do ensino das disciplinas que mais contribuem para tal e das que têm um valor formativo comum a todo o homem português.
Além disso, deverá orientar-se o ensino de modo que se dê ao aluno um conhecimento mais exacto e actual do ultramar, preparando-o, assim, para melhor o compreender e amar.
Mas importa também eliminar dos sistemas, dos programas e dos livros as deficiências que resultam de uma excessiva unificação que em nada contribui para a eficiência do ensino.
Poderia apresentar à Câmara casos concretos da minha experiência de professora demonstrativos do que acabo de referir, mas não quero abusar da paciência de VV. Ex.ªs alongando-me em pormenores. Apenas, e num sentido puramente construtivo, chamarei a atenção para o cuidado que deve merecer a elaboração das selectas de português do 1.º ciclo, tantas vezes repletas de trechos inadequados aos estudantes do ultramar e inacessíveis pelos assuntos e vocabulário a crianças de tão pouca idade, como são as dos primeiros anos dos nossos liceus.
A diferença do ambiente e a natureza peculiar da população escolar mutirracial do ultramar obrigam a ter de se dar ao ensino, em alguns dos seus aspectos, uma orientação que melhor se adapte às condições do meio.
No ensino primário já se enveredou pelo bom caminho, procurando-se libertá-lo de uma excessiva centralização. Assim, já nas províncias do ultramar se procura localmente estudar os programas, experimentar novos métodos e elaborar os livros de acordo com os naturais interesses das crianças a que se destinam.
O esforço que o governo das províncias ultramarinas está fazendo nesse sentido é digno dos maiores louvores. Contudo, há que fazer uma verdadeira planificação assente em estudos pedagógicos sérios, e não apenas revisões parcelares ou imprevisões que resultam, muitas vezes, imperfeitas e incompletas, com a consequente perda de dinheiro e tempo. Para isso haverá necessidade de se dotar o ultramar de centros regionais pedagógicos, com técnicos especializados na investigação pedagógica e na didáctica.
Sabemos que a Fundação Gulbenkian, que tão altos serviços tem já prestado ao País no campo da cultura, acaba de criar em Lisboa, e pela primeira vez em Portugal, um Centro de Investigação Pedagógica. Seria de toda a vantagem que a sua acção se pudesse estender também ao ultramar, onde os estudos dessa natureza são urgentes e essenciais.
Espero que o Conselho Coordenador, acabado de criar, pelo Ministério do Ultramar, pela Portaria n.º 20 289, de Janeiro deste ano, com o fim de estudar e orientar o ensino nas províncias ultramarinas e propor as medidas de natureza educativa, e cultural que entender necessárias, considero, este aspecto do ensino.
De tal Conselho há também muito a esperar quanto à fiscalização pedagógica, que não deverá ser meramente burocrática em cumprimento da lei, mas activa e orientadora.
Seria, de toda a vantagem para o professorado do ultramar que, à semelhança do que se vem fazendo na metró-