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3170 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 127

a tornar-se o mais grave, o mais difícil, o mais assoberbante de quantos constrangem a lavoura. O dos salários e o do rendimento útil do trabalho; os empresários têm tentado iludir-se, transigindo nos horários e conformando-se com abrandamentos para não cederem tanto nos preços, e chegou-se a este respeito a situações verdadeiramente escandalosas, com que, todavia, é necessária a conformidade para não afugentar mais do campo os que ainda por lá ficam. Já não é o horário industrial; são dias de cinco e de seis horas que se ganham por inteiro em períodos, todavia, de azáfama!
Sem embargo, os agricultores reconhecem que a melhoria dos salários se tornava justificada; somente se perguntam, e perguntam à roda de si, como aguentá-la.
Em resultado deste movimento deslocaram-se seguramente as participações dos trabalhadores por conta de outrem no produto agrícola, mas apesar disto devem continuar muito baixas.
O Dr. Santos Loureiro calculou que no continente a participação média no produto bruto agrícola teria sido aproximadamente a seguinte, no ano de 1958: assalariados, 3800$; empregados, 5700$, e isolados (explorações familiares), 7000$.
Confesso que estes números me parecem demasiado baixos, até pelo critério da possibilidade absoluta de subsistência com rendimentos tão pequenos, mas foram calculados, diz-nos o seu autor, tendo em conta os muitos dias de desemprego entra os assalariados, e de qualquer modo são os que há disponíveis.
Tomando-os como bons, concluiremos que pelas recentes actualizações salariais a massa dos trabalhadores por conta de outrem estará auferindo actualmente entre 5000$ e 7000$ anuais, aproximando-se dos empresários isolados das explorações familiares; em suma, que 1 200 000 pessoas (contados também os últimos), chefes de família na grande maioria, não estuo retirando da actividade agrícola em que se ocupam mais do que 20$ por dia, em média, para seu sustento e das famílias.
Ora esta gente representa 40 por cento da população do País; com os que nos outros ramos da economia trabalham para lhes satisfazer as necessidades, temos que mais de metade do País depende de rendimentos desta ordem.
Mais de metade da massa consumidora, dependente da agricultura, representa uma clientela potencial que a indústria portuguesa e os serviços em crescimento não podem ignorar nem dispensar.
Estagnada ou em perda de rendimentos, a agricultura constitui sem dúvida, na actualidade, o travão do crescimento económico de que já falou ao País o Sr. Ministro da Economia, com apurada observação das realidades. Está ali uma massa de clientela de que a indústria carece para continuar a desenvolver-se; e não pode haver dúvidas, pelo que se conhece da elasticidade dos consumos, mesmo nos parcos exemplos nacionais, de que um aumento de rendimentos irá aplicar-se em grande medida à aquisição de produtos industriais.
Não faltam autores a afirmarem que o desenvolvimento económico se encontra estreitamente dependente da actividade agrícola, não só por exigências de harmonia, cuja ruptura produz sempre tensões internas, mas pela sua contribuição de produto próprio, pela contribuição de consumidora de produtos dos outros sectores, pela contribuição de eventuais lucros ou poupanças aplicáveis ao financiamento das especulações industriais.
Tenho para mim que uma das causas do desenvolvimento das indústrias nos alvores do século XIX foi a existência nas regiões onde mais se processou de capitais disponíveis de agriculturas ricas; e é do consenso geral que a industrialização moderna de certos países foi desenvolvida à custa da agricultura, constrangida por organização ad hoc a fornecer os meios financeiros necessários aos planos de desenvolvimento.
E o seu contributo forçado persiste, teimam muitos, em todas os sociedades modernas - na nossa também, portanto - pelo condicionalismo que a força, a alimentar barato as populações industriais.
Ora, chegou o tempo de a indústria pagar à agricultura o que lhe deve, ganhando com isto também.
Perante metade da população do País reduzida a rendimentos muito baixos, da ordem de 50 por cento dos da outra metade, a indústria e os serviços têm de considerar-se tamanha clientela lhes interessa ou não e, se a resposta for pela afirmativa, têm de considerar outra vez como a conquistarão: se incorporando-a no seu seio, se apoiando a sua valorização como actividade autónoma. Decerto a primeira modalidade não lhes está ao alcance: não têm empregos a oferecer que, em curto prazo, absorvam suficientemente a população agrícola. Assim, ou terão de associar-se ao movimento para lhe valorizar os rendimentos, ou terão de resignar-se a vê-la morrer de inanição ou fugir do território, em qualquer das hipóteses indústria e serviços perdendo em clientela potencial enquanto a Nação perderá em substância.
Os mercados ou se sustentam por fluxos de bens nos dois sentidos, ou de uma das bandas há perdas de capitais. É a situação em que vive desde há anos a nossa agricultura, a qual, segundo todos os índices, já perdeu capitais até ao comprometimento da sobrevivência; não poderá continuar a oferecer-se como mercado válido, e menos ainda expansível, se não puder revalorizar os seus rendimentos.
Nos campos há uma grande massa capaz, e desejosa, avidamente desejosa, de consumir em maior escala produtos industriais. O par de sapatos ou a camisa nova, a bicicleta, mais uma máquina de lavoura - nos sonhos de muitos lavradores, conscientes da necessidade de se apetrecharem melhor, o tractor já se antepõe no automóvel, e aqui está, creiam-no ou não, um exemplo a falar-vos -, são ardentes cobiças aos diversos níveis da sociedade agrícola, que só aguarda melhoria de- rendimentos para os ir entregar em boa parte à sociedade urbana produtora dos bens apetecidos.
Não vou a pontos de pretender que os acréscimos do rendimento advenientes ao sector agrário se aplicarão totalmente em produtos industriais, entendam-me VV. Exas; todavia, a mesma parte destinada a produtos do sector contribuirá para a animação geral da economia, aumentando o escoamento desses artigos e quiçá os rendimentos dos circuitos da distribuição.
Penso, pois, que o abrandamento ou resolução da crise, agrícola pode contribuir para o crescimento económico geral, pelo alargamento do mercado que oferecerá aos produtos industriais e terciários. Dado tratar-se de um sector mais homogéneo e com máxima apetência ao consumo, com a maior proporção de necessidades primitivas, estou em dizer que uma soma de rendimento novo aqui aplicada ajudará mais poderosamente ao crescimento do que soma igual distribuída pelos sectores secundário e terciário. Contribuirá melhor, porventura, para, pedindo emprestada a um economista a linguagem sintética, «vencer, ou pelo menos atenuar, o efeito limitativo produzido pelos estrangulamentos de dimensão«.
Abrandar ou resolver a crise implica, pois que o mal e de insuficiência de rendimentos, diminuir custos, aumentar valores da produção, ou uma e outra coisa. Con-