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3166 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 132

De momento, porém, o quadro é este: um investimento que consta ser de perto de 3 milhões de contos e funcionando a três quartos da capacidade, um valor anual de produto da ordem de 500 000 contos, com menos de 3000 pessoas empregadas. Desse produto, porém, uma terça parte tem de ser exportada, com 46 por cento de desvalorização; e o que cá fica poderia, segundo há pouco ouvimos aqui mesmo, ser importado do estrangeiro por cerca de metade do preço, de modo que até o objectivo conexo do desenvolvimento das indústrias metalomecânicas pelo acesso mais fácil à matéria-prima tem sido frustrado. Sobre tudo isto, ainda importámos, em 1962, 1 300 000 contos de outros produtos de ferro e aço.
O empreendimento foi largamente saudado como forte avanço no sentido do desenvolvimento da Nação; penas de estudiosos e de políticos, melhor ou pior aparadas, derramaram torrentes de embevecimento sobre ele, e na inauguração da fábrica fomos todos informados de quanto ela contava, pois um país sem siderurgia era uma horta ... Não sei se com isto se quis marcar uma preferência por aquele belo céu plúmbeo-alaranjado do Seixal sobre as verdes frescuras das nossas terras saloias; o que sei é que, se por este critério dantes éramos uma horta, agora seremos um luxuoso parque ... para recreio de raríssimos apenas!
Não posso deixar de pensar, com certa melancolia, que talvez com uma décima parte apenas do investimento feito, se tanto, em igual tempo, com igual afinco, se necessário com igual recurso a experiência estrangeira, poderíamos ter constituído uma fruticultura capaz de suportar satisfatoriamente muito mais gente e de nos ganhar muito mais divisas.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Quem se atrevera na altura, todavia, com esperanças de ser escutado, a propor esta diversão como objectivo de imediata rentabilidade?
A sujeição da agricultura ao escopo de todos os governos, que é o de assegurar aos habitantes dos grandes centros alimentação barata, relega a actividade camponesa a um fim que lhe é estranho - o de favorecer as condições de existência dos meios não agrícolas - e dá ao lavrador a impressão de ser reduzido à mera categoria de instrumento de uma economia que não trabalha para ele.
A cidade esmaga o campo, escreveu o economista agrário Jules Milhau. Direi, por mim que a cidade pratica sobre o campo o último colonialismo dos nossos dias.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Toma-lhe matérias-primas, a preços e condições que ela mesma regula, e vende-lhe, nos suas condições próprias, produtos acabados, com cuja preparação enriquece. E, tentando impor-lhe os seus próprios valores e critérios, soma à exploração económica uma verdadeira desmoralização, na medida sobretudo em que tenta o campo a esquecer ou a revoltar-se contra as leis biológicas que têm de regular-lhe a vida, por tanto depender da Natureza.
Os quadros políticos, administrativos e industriais das nações modernas raciocinam em termos mecânicos, em termos matemáticos, com esplêndida, e porventura algum dia fatal, indiferença pelas incertezas da biologia, e na duvidosa segurança da armadura que têm tentado forjar contra as contingências da Natureza vão pouco a pouco minando na alma rural o amor e à conformidade com os ditames e as variedades da sua mãe, da sua mestra, da fonte mesma da sua existência. Poderá o homem da cidade finalmente subsistir à margem, ou em oposição ao equilíbrio biológico? Não sei, mas sei que, por agora, mostrando-se orgulhosamente indiferente às suas servidões, acrescenta mais algumas pedras ao prato da balança em que o camponês pensa vê-lo elevar-se no mundo social!
Deslumbrado o campesino pelas riquezas, e comodidades, e seguranças da cidade; acabrunhado pelo sentimento da subalternização progressiva, é apenas inevitável que procure fugir para onde tudo lhe parece mais brilhante, e dá-se o abandono dos campos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O despovoamento é a terceira grande manifestação, ou efeito, da crise que assoberba a agricultura; e parece estabelecido, até onde pode chegar-se com alguma verosimilhança, que na pouquidão ou insegurança dos ganhos está a sua grande causa. Remeto VV. Exas para um moderno estudo estrangeiro, há pouco publicado em tradução pelo nosso Instituto de Investigação Industrial; ali se nos diz que, segundo inquéritos directos, as principais razões alegadas para o abandono dos campos se reduzem todas a manifestações diversas da insuficiência do rendimento, a própria dureza da vida contando por muito pouco. Outra voz nos vem de Itália no mesmo sentido; ali, de entre 27 000 jovens camponeses, 73 por cento declararam que abandonariam imediatamente a terra se tivessem a oportunidade, mas a maioria acrescentou que ficaria se pudesse ganhar melhor.
Sobre a matéria penso que os mais de nós nesta Casa, todos quantos temos alguma ligação com o campo, também teremos as nossas próprias observações, filhas dos pedidos de empenho para emprego urbano. Pela minha parte, não me levam a outra conclusão.
Para os puros economistas, a redução do emprego agrícola é a consequência do desenvolvimento, posto que este só se entende possível pela via da indústria, e a condição necessária de maiores expansões, que abastecerá de mão-de-obra.
Também crêem, provavelmente com razão - ponto está em os demais factores ajudarem -, que só através da redução da carga humana poderão os restantes ter no campo a melhor vida ambicionada.
E por tudo isto olham sem preocupações o êxodo e, por vezes, julgá-lo-ão insuficiente; nem tenderão a apoiar medidas que pensem poder, evitá-lo, nem se afligirão todos muito com a crise agrícola enquanto ela se lhes apresentar como factor de aprovisionamento barato dos efectivos fabris.
Há que prevenir este egoísmo nas atitudes perante as aflições da lavoura!
Pondo de banda a posição dos sentimentais, dos conservadores e dos bucólicos, creio que o êxodo rural é fenómeno já inevitável, e, portanto, a olhar com equanimidade se puder ser processado em termos de permitir vida decente aos que ficam e de assegurar igualmente vida decente aos que partem. Nenhuma destas condições se tem realizado perfeitamente entre nós, e aqui os males a remediar.
Dos que partem, muitos não são bem acolhidos pela cidade que vêm aviventar. Mal preparados eles, mal preparada ela, a absorção não é sempre pronta, e a acomodação não é mais; e aí fica esse rebotalho demasiado numeroso, reduzido aos misteres mais humildes, fácil presa da doença, sem emprego certo, relegado para as barracas infames, de quando em vez a pedir esmola pelas ruas, furtivamente se a cidade não lhe destruiu ainda toda a dignidade humana, sabe Deus quantas vezes sau-