3164 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 127
e tão acentuado o sentimento dos próprios e o reconhecimento dos observadores quanto á insuficiência da retribuição do trabalho desenvolvido e das especulações empreendidas, como dos capitais investidos, pela dupla medida do valor absoluto e da comparação com os demais sectores.
E, como observa Meynaud, um dos traços mais alarmantes desta situação é que ela se nota tanto entre os que se deixaram ficar na rotina ou na estagnação como entro os que procuraram inovar!
Efectivamente, na apreciação da crise agrícola é ponto extremamente de considerar, para pôr prudência era sugestões como muitas para aí facilmente avançadas, este facto de aparecerem frequentes vezes como mais abalados os agricultores que mais procuraram modernizar-se.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - O arguto Raymond Cartier, no notável inquérito feito à agricultura francesa pelo auge das reclamações que há poucos anos a agitaram, também pôde, por seu Indo, concluir que as cóleras dos agricultores as tinha por muito menos graves do que o desalento que os tomava ao verificarem terem sido inúteis os seus esforços de produtividade para saírem da mediocridade; e no nosso país não faltam exemplos de lavradores, corajosamente lançados no que esperavam ser a senda do progresso apoiados na melhor técnica acessível, profundamente desapontados, até à beira da ruína, quando não mesmo à desgraça da liquidação forçada, por os seus investimentos não haverem resultado bastante rendosos para cobrirem os encargos dos capitais para o efeito mutuados! Direi mesmo que, na minha observação directa, os lavradores que ainda vejo mais endinheirados são aqueles que menos modernizaram e melhor souberam manter-se agarrados às tradições de férrea poupança dos seus maiores!
Do caso particularmente conspícuo de certa lavoura explorada em sociedade, e que se tem expandido territorialmente, dizia-me um conhecedor: «... eles compram as propriedades, e depois deixam que elas tratem de si mesmas ...»; ora, por todos os indícios externos, o resultado, por condições particulares, não tem sido mau. Serão, todos estes, administradores prudentes, convenho; mas não me satisfaz nada a perspectiva de ter de me convencer de que a maior prudência está em não inovar!
Ferindo, pois, indistintamente rotineiros e progressivos, a crise da agricultura manifesta-se universalmente de três formas:
1) Empobrecimento;
2) Desclassificação social;
3) Despovoamento dos campos.
O empobrecimento da agricultura é vivamente afirmado na base da maioria das queixas e reconhecido sem divergências pelos observadores externos. Há, porém, que o distinguir sob duas formas: quanto a participação da agricultura, como classe, no produto nacional, o empobrecimento é universal; quanto às participações por unidade de mão-de-obra, comparativamente nos produtos nacionais e sectoriais, vemos evoluções diferentes em países diversos, conforme o jogo na agricultura dos factores concorrentes do aumento global da produção e do despovoamento, que faz subir a quota-parte produtiva, mas ainda a este título o empobrecimento se verifica em bom número de países, que não só no nosso.
Como é claro, se a capitação do produto na agricultura melhora, há em absoluto um enriquecimento, sujeito, todavia, à erosão dos termos de troca; mas se pia diminui, há empobrecimento, o qual será apenas relativo se o decréscimo só se verificar comparativamente com a evolução dos outros sectores. Em termos mais precisos: registar-se-á um empobrecimento, somente relativo, na agricultura, se as capitações do produto crescerem nela menos do que nos demais ramos da actividade económica, o que já será bastante para justificar o descontentamento dos homens do campo.
Como observei atrás, o mais acentuado crescimento industrial diminuiu por toda a parte a participação das lavouras nos produtos nacionais; isto é demasiado sabido para ser necessário demonstrá-lo, mas, por si mesmo, afectando o prestígio e o poder contratual da agricultura, é, se não uma manifestação, pelo menos um factor de crise.
Quanto ao empobrecimento relativo, ele é bem evidente em Portugal. O estudo do nosso ilustre colega Eng.º Araújo Correia inserto como apêndice do parecer sobre as contas públicas do ano de 1961 referente à metrópole, está ao alcance de todos VV. Exas.; por ele vereis que na década entre 1950 e 1960 o produto bruto por indivíduo activo aumentou apenas 1791$ para a agricultura e silvicultura, enquanto subiu 7561$ para o conjunto, pelas pessoas ocupadas o imediato em importância, das indústrias transformadoras e da construção. Como observa o nosso sapiente colega, a aceleração foi superior quatro vezes. Ao lodo dos demais produtores, os do campo viram subir muito menos o rendimento do seu trabalho; por isto se pode dizer que ficaram relativamente mais pobres. E, atenta a evolução dos salários, parece-me bem provável que, se fosse possível a discriminação por situações na profissão, se verificaria que o grau de empobrecimento relativo se acentuou para os empresários da produção.
No resto da Europa, a este respeito, as coisas não se passaram em toda a parte assim. O acentuado aumento de produção agrícola nos países do Norte e Noroeste europeus, não obstante forte abandono rural, fez com que, segundo a F. A. O. e para a década de 1950 a 1959, o produto bruto por unidade de mão-de-obra aumentasse mais na agricultura do que na indústria para a Bélgica, a Finlândia, a Alemanha Ocidental e a Noruega, enquanto para a Áustria, a Dinamarca, a França, a Itália, a Holanda e a Grã-Bretanha o benefício foi da indústria. São em todo o caso em maior número e representam maior massa económica os países em que o empobrecimento relativo da agricultura se verifica, em menor grau todavia, felizmente para eles, e graças aos esforços que puderam desenvolver, do que para nós.
Estes, porém, são os aspectos relativos da evolução dos rendimentos, a qual todavia partiu de diferenças de base que, diminuídas embora, por vezes, se mantém geralmente. Em termos absolutos, por toda a Europa o agricultor é mais pobre do que os demais produtores: o sindicalista francês Henri Cayre calculou para 1959 que a relação dos rendimentos unitários andaria entre metade e dois terços; em Portugal, pelos elementos que há pouco citei, essa relação seria de 45 por cento em 1960.
O agricultor é geralmente mais pobre, e empobrece ao lado dos demais. Eis a sua crise!
A causa directa desta crise é geralmente atribuída à deterioração dos termos de troca: termos de troca sendo, como sabeis, o nome dado à relação entre os preços recebidos e os preços pagos pelo agricultor.
Ouve-se frequentemente a observação de que a grande indústria tem subido baixar os seus preços; e, na verdade, graças às fabricações maciças, há produtos ou serviços cujos custos absolutos têm variado pouco em períodos até relativamente largos e cujos preços um função dos poderes de compra tom mesmo descido. Sem dúvida; mas o facto é quo os índices de preços sobem todos, mas