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7 DE FEVEREIRO DE 1964 3163

Na verdade, a crise, procedendo da quebra dos rendimentos agrícolas, é exacerbada psicologicamente pelo paralelo destes com a evolução dos sectores secundário e terciário da economia, e das condições de vida que uns e outros consentem aos respectivos agentes, seja ao nível dos empresários, seja ao dos operários, somando assim a um problema económico da primeira importância fermentos adicionais de descontentamento que levedam em questões de sério alcance político.
No nosso país, que dos seus atrasos não há-de tirar só danos, e onde a manifestação das paixões anda mais contida, muitos poderão não se ter apercebido ainda das possíveis consequências dos sentimentos de frustração desenvolvidos entre os camponeses; mas, para dar a medida de como esses podem levar, por desespero, a encarar a opção da violência, bastar-me-á citar os títulos ou subtítulos de três obras recentes, todas saídas dos prelos franceses nos meados do ano de 1963, da mais recente actualidade portanto: La Revolte Paysannc, do professor da Universidade de Lausana Jean Meynaud, sumário actualizado e estudo bem cerzido da problemática agrícola contemporânea; L'Heure des Paysans: Révolte ou Révolution Paysannc?, verdadeiro panfleto de inspiração, todavia conservadora; e La Révolution Silencicuse - Lc Combat des Paysans, de Michel Debatisse, um dos chefes do movimento reformista dos jovens agricultores do seu país.
Oxalá, oxalá possamos aprender com a experiência e a observação alheias a tempo e em medida bastantes para que jamais essa opção da violência apareça aos nossos agricultores como o recurso último, justificado pelo insucesso de todos os demais processos de reivindicação do tratamento justo!
Assentemos, para tanto, em que não é mais possível contar com a resignação dos homens dos campos; já não os isola no fundo das aldeias a falta de comunicação com o mundo urbano, e a fúria de viver melhor que deste se apossou também os toma a eles. Quem ousará, aliás, e com que direito ou razão, negar-lhes a igualdade nas aspirações e nos apetites?

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O que uns vão conseguindo, não nos iludamos, os outros o reclamarão, e acabarão por tomar para si, cora a força irresistível dos anseios humanos verdadeiramente sentidos! A alternativa só poderá ser a do aniquilamento, a do esmagamento por novos genocídios, discretos ou abertos, suaves ou brutais; mas então, então faltará as cidades a própria vida - como diz Pisani -, ou terão de hipotecá-la a estrangeiros!
Penso ser neste duplo quadro da busca da rentabilidade, das explorações contra a subida dos custos de produção e da da paridade de vida com as populações de outros sectores da economia; ou, melhor, no da busca da rentabilidade capaz de assegurar tal paridade de vida, que se encontra o verdadeiro problema da agricultura; e se este se não desenha ainda em inteira grandeza aos nossos olhos, não tenhamos dúvidas de que a ganhará depressa com o render das gerações e com a subida para a vida de camadas menos conformadas às privações tradicionais, pois os novos camponeses erguem-se a reclamar a plena medida dos seus direitos a vida moderna como condição indeclinável de continuarem a sustentar a das demais gentes.

Vozes: - Muito bem!

a Orador: - O professor Meynaud, a quem já me referi, abre o seu estudo com alguns parágrafos que não posso fartar-me à tentação de reproduzir para VV. Exas., pois, sendo um resumo perfeito das minhas palavras anteriores, dão-lhes o valioso apoio da autoridade científica e da largueza do campo de observação:

Existe hoje em dia na maior parte, se não na totalidade, dos países economicamente desenvolvidos um problema agrícola. Certamente, a natureza e intensidade dos perturbações ou conflitos que daí resultam variam segundo as experiências nacionais; mas raros sãos os governos aos quais, de tempos a tempos, as reivindicações dos cultivadores não acarretam sérios cuidados.
Ora, longe de representar um simples episódio, tal situação corresponde a tendências de fundo dais economias modernas, e seria vão esperar o termo destas dificuldades de evoluções espontâneas dos acontecimentos. Por razões que se precisarão, a agricultura parece destinada a constituir a preocupação permanente das sociedades ditas ricas, quer dizer, daquelas em que o consumidor solvente é amplamente abastecido. A aceleração do crescimento tem em geral por efeito não reduzir, mas agravar, a amplitude dos dissabores sofridos pelos homens da terra.
Se bem que a expressão esteja um tanto desvalorizada em consequência de abuso, é legítimo falar a este respeito de revolta camponesa. Depois de ter longamente suportado a má sorte com passividade, o agricultor, à medida que toma consciência da injustiça da sua posição, entra no campo dos queixosos: de modo silencioso o mais das vezes, a fuga para as cidades traduzindo o seu desânimo, mas também de maneira aberta e por vezes brutal, transformando-se então as manifestações agrícolas em provas de força.

Não sei se demos ou não graças por isto, mas nós ainda não estamos tão adiantados; vamos, porém, a bom caminho de lá chegar, que é precisamente o do desenvolvimento económico, e parece-me que quanto ao essencial do quadro já lhe reproduzimos bastante de perto as linhas.
«Calcanhar de Aquiles» das sociedades modernas, como já outrem lhe chamou, a agricultura aparece em dificuldades, tanto nestas como nas mais primitivas, o traço comum sendo sempre a insuficiência dos rendimentos para retribuir, a nível humanamente satisfatório, o trabalho nela aplicado.
A «miséria imerecida do mundo rural» não é, todavia, bem compreendida, pelas outras esferas da sociedade, de sempre afeitas a vê-lo viver extremamente desprovido de tudo que não fossem produtos directos da terra, estes mesmos quantas vezes duramente medidos pela natureza ou pela organização social; e, afeitas também a vê-lo cronicamente descontente das vicissitudes culturais, julgam as novas queixas ao mesmo nível das velhas inerências da actividade, sem atenderem a que decorrem agora de forças humanas, e não de leis naturais.
E também porque os contactos entre essas outras esferas e o mundo rural se estabelecem através dos elementos mais destacados ou evoluídos, as condições ou comportamentos destes fazendo com frequência generalizar erradamente, ao tomar excepções como amostras ou ao apreciar casos individuais fora das suas devidas relações com o meio próprio e com os casos congéneres de outros meios.
Certamente a luta pela vida é árdua em todos os domínios do esforço humano, e em todos são legião os que não atingem a justa recompensa das capacidades e diligência com que se aplicaram.
Mas parece não ser contestado que em nenhum sector como no da agricultura é hoje ao mesmo tempo tão geral