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3354 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 133

nada podem corrigir quando falta a matéria-prima susceptível de correcção ou complementar dela.
Eis aqui, incidência remota mas certa, de causa a efeito, de se não haver atendido a certas leis naturais. Em período temporário, de salus populi, o recurso a deter -, minadas medidas torna-se imperativo. For alguns anos, mas não muitos, seus múltiplos efeitos, podem limitar-se, mas, convertendo-se em regra, tais efeitos passam a impor-se em crescendo alarmante.
Este aviso prévio foi determinado pelo problema do trigo. O problema dos outros dois mais importantes cereais abastecedores do pão nacional, o milho e o centeio, não poderia estar ausente nesta discussão.
Os problemas correlativos, e até, como vimos, o pecuário, são entre si complementares. Hoje tu, amanhã eu. Na protecção que a cultura do trigo deva continuar a merecer não podem esquecer-se esses outros cereais panificáveis, e nunca deverá fazer-se em prejuízo do seu consumo. Isto porque, se na região própria para centeio melhor se pudesse produzir trigo, por certo ele já de há muito lá se teria consolidado. Quanto ao milho, penso, contra o parecer de alguns, que mesmo desprotegido como está nunca deixará de desempenhar papel importantíssimo, mesmo sem falar no monetário, na economia agrária do nosso Noroeste.
Desde que lá foi implantado, oriundo da América, pelo século XVI, e repelindo o milium e o trigo - não o centeio, com que na panificação se associa -, passou a desempenhar uma função forrageira felicíssima. Tornou-se então possível, aumentando consideràvelmente a produção de pão, conservar na mesma o gado de Verão, não obstante converterem-se em campos cerealíferos grande parte de lameiros.
Aumentaram decerto então consideràvelmente aproveitamentos marginais as linhas de água que trouxeram à paisagem do Noroeste aquela viridência estival que nos deslumbra.
Na associação do milho com o feijão, além da sua alternância com as pastagens de Inverno, se deve encontrar a explicação da perene e miraculosa fertilidade da nossa região.
Ora, também na reconversão à cultura do trigo de parte da terra minhota que para tal se preste, associando-o ao restivo milho de relva - o que já começa a praticar-se tanto com o trigo como com o centeio e com felizes resultados -, pode estar não desprezível contributo para uma solução construtiva do problema do pão em Portugal.
E cumpre-me ainda a propósito consignar as perspectivas de mercado industrial que para o milho acaba de declinar o Sr. Deputado André Navarro.
Tem tido por fim esta minha intervenção sobretudo focar os aspectos da realidade das leis naturais a que, como atrás, dissemos, se não pode fugir senão torneando-as prudentemente.
Mas, por outro lado, tem também por fim chamar a atenção para o nosso condicionalismo geopolítico, que nos obriga a prevenir-nos dos dois grandes flagelos possíveis, o da guerra e o da fome.
E como escapar-lhes em tempo útil - caso venham a dar-se em cadeia -, se, minimizando-a, nos esquecemos da experiência consagrada de cultivar o nosso pão?
Se esquecermos de mais, em nome da deseconomia da produção trigueira, hoje, amanhã porventura da do arroz, e, sobretudo, da revolução industrial que é preciso açodadamente precipitar, podemos ver-nos declarada uma guerra em circunstâncias dificílimas, por carecermos de trigo, que por preço algum se nos venderá, trigo que hoje podemos obter, cedido como excesso, por preços incríveis de liquidação.
Ora esta eventualidade o passado e o presente não nos permitem encará-la como sequer improvável; em face do seu risco, embora desamarrando o regime trigueiro de um proteccionismo excessivo de subsídios directos ou indirectos, porque não atribuir àqueles produtos cerealíferos antes certa melhoria de preço? Não será tempo já de que o consumidor colabore mais conscientemente na sua obtenção, conforme o Génesis, e, segundo a verdade do seu custo, «com o suor do seu rosto»?
Ora, simples ponderação comparativa dos preços do sector industrial e do sector agrícola, reportados aos anos de 1940 e de 1960, é de impressionante eloquência, firmando-se aqueles quase sempre acima do valor do correspondente poder de compra da moeda e estes sensivelmente abaixo.
É o que se verifica pela leitura dos quadros da autoria do Sr. Eng.º Barbedo Marques publicados na comunicação sobre o trigo do Sr. Eng.º Mariano Feio, nas Jornadas Agrícolas e Leiteira», p. 110, que eu não vou ler, mas que requeiro, a V. Ex.ª, Sr. Presidente, conste do Diário das Sessões em anexo das minhas palavras.
É isto sobretudo p que se nos oferece dizer a propósito dos riscos de uma nova guerra. A gente mais moça, o que aliás é inteiramente compreensível, só dificilmente consegue fazer dos períodos passados que não viveu uma ideia que não seja de história panorâmica. Outra coisa o sabem e sentem aqueles para quem essa história, como coisa vivida, subsiste profunda como parte da sua personalidade.
É em nome dessa experiência reflectida, sem embargo do progresso que indispensável é imprimir à nossa economia, que eu formulo reservas no sentido de este período de desamarração ser prudentemente processado.
Torno a repetir, não teria sido miraculoso prémio de seguro para a nossa sobrevivência o vultoso investimento da nossa frota mercante?
De resto, as capacidades psicológicas, de resistência e tensão do nosso povo rural estão muito para além, apesar de tudo, daquilo que nós no nosso meio urbano - disso mu penitencio - por ele supomos sentir, tal como se o caso connosco se passasse.
Nessas reservas, nesses invisíveis que não são decerto ilimitados, mas que são muito maiores do que nós, segundo as nossas estatísticas, diagramas, mapas, etc., supomos, algo devemos confiar.
Nesse sentido termino recordando o que a propósito dessa riqueza anímica do mundo rural, lá dizia Virgílio, ao fim da sua segunda égloga, na célebre apóstrofe que começa:

O fortunatos nimium, sua si bona sorint, Agricolas!...

E assim termino.
Disse.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, mandei distribuir ontem, a todos VV. Ex.ªs, os pareceres sobre a Conta Geral do Estado e o relatório com a declaração de conformidade do Tribunal de Contas.
VV. Ex.ªs sabem que, nos termos do n.º 3.º do artigo 91.º da Constituição, compete à Assembleia Nacional tomai-as contas respeitantes a cada ano económico, tanto da metrópole como das províncias ultramarinas, as quais lhe serão apresentadas com o relatório e declaração de conformidade, do Tribunal de Contas.