3350 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 133
Ao contrário, terá ela de ser aproveitada para uma conveniente expansão económico-industrial, local e regional, que corresponda aos necessários ajustamentos sociais.
Menos trabalhadores na agricultura não significa, assim, mais habitantes na cidade, mas apenas mais unidades industriais, complementares ou não da agricultura, a enriquecerem os meios rurais de todas as regiões do País. Uma agricultura progressiva pressupõe uma indústria próspera a solicitá-la, a estimulá-la, a fortalecê-la, desde a aquisição de matérias-primas que lhe pede cada vez em maior volume e por melhor preço, aos consumidores que lhe oferece também cada vez em maior número e com maior poder de compra.
E por isso se me afigura que a crise da lavoura nacional alcança, no seu diagnóstico, as próprias relações com a indústria, que no seu actual estado de reorganização e funcionamento a não alivia, se é que a não agrava.
Não desejo entrar nesse exame - o das relações criadas por condicionalismos legais entre a lavoura e a indústria. Não fujo, porém, a registar como índice o que se passa neste pormenor: o exclusivo da laboração da cortiça de falca, mercê de um condicionamento industrial que suponho, pelo que dele conheço, altamente nocivo em muitos dos seus aspectos para a economia nacional, obriga a lavoura a vendê-la, a quem tem esse exclusivo, por preço sensivelmente igual a metade daquele por que a venderia se essa modalidade industrial se exercesse em regime que permitisse a livre, sã e desejável concorrência.
E como anda pelo milhão de arrobas a quantidade anualmente extraída daquela cortiça, a lavoura deixa aí de receber uns milhares de contos em benefício de outrem, graças ao condicionamento industrial.
Neste exemplo de mero pormenor, como disse, aflora um difícil e grave problema - até onde vai a responsabilidade do condicionalismo legal criado à indústria pela crise da agricultura?
Esta crise, em quantos dela se têm ocupado, parece ser mais de estrutura que de processo e parece exigir profunda reconversão em certos sectores da nossa economia agrária.
As providências anunciadas e já em execução para alguns deles não terão logrado unânime acolhimento. Sobretudo pelo que respeita ao fomento do regadio alentejano, são díspares as opiniões autorizadas.
Outro tanto o serão ainda as que incidem sobre a florestação que vem sendo proposta e defendida como um dos elementos da solução para a mencionada crise. Nem admira que assim seja.
Frente a uma arreigada tradição secular de culturas que, embora probríssimas, vêm resistindo a solicitações renovadoras, frente a uma como que ancestralidade de animadversão à árvore (talvez herdada dos Árabes!), a um conservadorismo que tem tanto de cómodo como de indolente, a uma lavoura de tão exíguos réditos que não permite uma poupança para alguns anos que consinta o desenvolvimento das árvores sem apreensões, frente a uma mentalidade pouco evoluída e a um generalizado desconhecimento da natureza e aptidão dos solos, como não entender a incompreensão de muitos per a ate as vantagens  da silvicultura e as suas possibilidades de verdadeira solução para uma boa parte da agricultura nacional?
E, no entanto, é hoje um lugar-comum afirmar que dos 8 900 000 ha de terra da metrópole, cerca de dois terços só comportam uma exploração florestal desde que se pretenda fazer neles uma economia de lucro. Assim o pedem as condições edafo-climáticas aí dominantes. Com efeito, solos altamente erosionados e erosionáveis, solos desprovidos de camada arável, solos degradados e econòmicamente improdutivos, solos de fraca fertilidade natural, solos declivosos, solos delgados de granito, clima irregular com quedas pluviométricas anuais que ficam, em média, aquém dos 500 mm, parecem definir, nesses dois terços da terra metropolitana, uma decidida vocação florestal.
Há aí um imperativo do mundo físico que é preferível aceitar a combater ou mesmo a contrariar.
A essa como que fatalidade da própria natureza somam-se razões de conveniência económica, traduzidas desde logo na obtenção de novas possibilidades de criação de riqueza.
Na verdade, «ao revestimento florestal se fica sempre devendo a melhoria do clima, a defesa e regeneração do solo,. com o aumento das suas reservas hídricas, a regularização dos cursos de água, com os naturais reflexos no regime das cheias e no problema de assoreamento das albufeiras, a valorização turística do meio rural, a absorção de mão-de-obra excedente ou mal remunerada e, consequentemente, a fixação do elemento humano pela garantia de trabalho na constituição e exploração dos povoamentos e possibilidade de instalação de novas actividades subsidiárias, o encorajamento do progresso geral das populações mais afastadas, mercê das imprescindíveis linhas de penetração constituídas pelos caminhos florestais rasgados nos serranios».
Por outro lado, as perspectivas de uma economia florestal são aliciantes.
Os países da Europa ocidental, diz a F. A. O., terão, a partir de 1967, um deficit anual de 50 000 000 m3 de madeira e só para a Espanha está previsto um deficit que atingirá 17 000 000 m3 em 1975.
E que o consumo de madeira vai em ascensão permanente. A produção de pasta aumentou cerca de 80 por cento nos últimos dez anos. A química extrai cada vez mais produtos da madeira - desde os fertilizantes orgânicos às lacas, vernizes, tintas, filmes, plásticos, fibras variadas, etc.
Por outro lado, ainda a florestação permite a desconcentração industrial com todas as vantagens sociais inerentes. É possível e devem mesmo implantar-se nos respectivos enquadramentos regionais as unidades fabris dela dependentes com matéria-prima - e tantas são.
A rentabilidade por hectare dessas terras ora empobrecidas, quando revestidas de floresta, fará multiplicar os índices actuais.
É que, como acertadamente escreveu o engenheiro silvicultor Gabriel da Costa Gonçalves, a florestação «tornará possível uma fácil, segura e remuneradora colocação dos produtos e o substancial aumento da nossa produção e, em muitos casos, exportação de madeiras, cortiças, resinosos, pastas de papel, óleos essenciais, aglomerados, desenrolados, painéis de madeira aglomerada ou de partículas, painéis de fibra, caixas e embalagens, etc.».
Não obstante tantas e tamanhas vantagens, a florestação vem a processar-se com o ritmo tão lento, que, a manter-se, levará muitas décadas a cobrir de árvores os quase 4 000 000 ha desnudos de vegetação. E no entanto torna-se indispensável atingir esse efeito em breves anos.
A proposta de lei que em 5 de Março de 1857 foi apresentada à Câmara dos Deputados dava ao povoamento florestal uma solução tão empírica como fácil. Havia ao tempo 3800 autarquias locais. Cada uma delas teria de, em cada ano, fazer o revestimento florestal de 1 ha: em 100 anos seriam arborizados 380 000 ha!
Como se vê, era simples, tão simples que não deu qualquer resultado ...
E, no entanto, se assim se tivesse praticado, o País estaria hoje quase inteiramente florestado nos seus 6 000 000 ha, aptos apenas para essa forma de explora-