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3698 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 147

temporização, para que amanhã, quando a tragédia estalasse e um rio de sangue principiasse a correr, não tivessem de acordar tardiamente para remédios improvisados e, quem sabe, se inúteis. Precisamos de não repetir em Moçambique os erros que andamos a expiar na outra província irmã.
Acusem-me de violento, de intempestivo, se quiserem. Mas, quando todos sofremos na nossa carne, no nosso nome. no nosso espírito, quando a Pátria precisa, mais do que nunca, que todos vivamos unidos em torno de quem nos dirige, que esqueçamos agravos e discordâncias acidentais ante a indeclinável urgência de salvar a integridade do que é essencial, não compreendo a covardia do silêncio e das cómodas soluções de quem adormece ao borralho, para que os caluniadores e os traidores não venham incomodá-lo. Eis aí. Sr. Presidente, e Srs. Deputados, um punhado de verdades amargas que convém lembrar, de vez em quando, como melhor processo de alerta contra os inimigos da integridade da Pátria. Só assim podemos colaborar com Salazar, lealmente, na defesa do nosso vasto património ultramarino.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: permitam-me que estas palavras de sentida homenagem ao nosso eminente Chefe do Governo não fiquem por aqui. É que eu desejava falar ainda a VV. Ex.ªs de outra estátua e de outro homem, ao qual Moçambique muito ficou a dever da sua grandeza cristã.
O ilustre vereador da Câmara Municipal -de Lourenço Marques, Sr. Eng.º Ramalho Correia, teve a feliz inspiração de sugerir, em reunião da sua edilidade, que á capital da província erguesse um monumento condigno ao santo e saudoso cardeal Gouveia, que há dois anos tombou mártir do dever cumprido até ao fim.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - A ideia ganhou asas e não tardará em corporizar-se, numa praça ou jardim, que espero saiba escolher-se de acordo com a grandeza da gratidão que todos devemos ao homenageado. Se Mouzinho tem o seu monumento, ante a catedral que D. Teodósio de Gouveia ergueu, a dominar a majestade da Baixa, porque, é que este grande cardeal missionário não há-de ficar a abençoar a caminhada da cidade nova, ante a moderna catedral que fez erguer no bairro da Polana?

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Jaime Cortesão, o eminente historiador dos nossos descobrimentos, escreveu um dia que tudo quanto fizemos de obra propriamente civilizadora. eficaz e duradoura, em terras do Oriente, se deveu, unicamente, à acção missionária. Algum exagero transparece destas altíssimas palavras. Mas não me parece que possa contestar-se como ela realizou a melhor e maior parte dessa empresa imortal, como eu próprio tantas vezes tenho podido verificar, principalmente no tempo em que trabalhei na nossa província martirizada de Goa.
Mas todo esse esforço de epopeia, que longamente esmoreceu, depois que Pombal baniu de todos os nossos domínios a Companhia de Jesus, num gesto suicida, vive hoje, renascido, horas de grandeza sem par. Mesmo que não fôssemos católicos, bastava um assomo de simples justiça para reconhecer que, não obstante as deficiências inelutáveis a toda a tarefa humana, o missionário continua a ser o maior de todos os nossos colonos, pela capacidade ilimitada, de sacrifícios, pelo total desinteresse material da sua missão divina, pela perfeita integração na maneira de ser c de viver das terras e das gentes que evangeliza, pelo alto padrão da sua cultura científica u técnica c até pelo seu indiscutível patriotismo.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Muito se poderia dizer acerca dessa gesta grandiosa, que só por cometida no escondimento, e sem alardes de propaganda, nem todos vêem nela a maior, a primeira de quantas levamos a cabo, nessas terras portuguesas de além-mar. Sei bem que, depois de Goa, Angola apresenta, neste panorama, o saldo mais grandioso, com números que se aproximam já muito dos 2 milhões de católicos.
Mas também lá a evangelização começou mais cedo, e não sofreu os mesmos hiatos que em Moçambique, além de que o fruto nefasto das missões laicas da primeira república lançou raízes daninhas, algumas das quais ainda persistem, sob numerosas formas, em mentalidades dos mais variados matizes políticos, religiosos ou agnósticos.
Mas também creio que em nenhuma é tão visível o esforço ingente realizado em curto lapso de tempo, como em Moçambique. Basta lembrar que, em 1938, os católicos não iam além de 140 000.
Ora, em menos de 30 anos, estes números subiram, hoje. para cerca de 700 000. Raros eram os missionários, as religiosas, os irmãos auxiliares, as escolas, sobretudo secundárias, quase não havia hospitais nem órgãos de imprensa dignos de consideração. Ao cabo de duas a três décadas, a rede missionária de Moçambique é modelar, tanto na assistência religiosa dentro das cidades e principais centros urbanos, como na irradiação pelo interior do mato.
De uma única diocese (a prelazia de Moçambique), apareceu dividida em oito; os católicos africanos rondam já a casa dos 600 000, o pessoal missionário (incluindo os professores nativos), deve andar perto dos 5000, há mais de 11 seminários, 17 colégios-liceus, 58 escolas de ensino profissional, 104 de ensino complementar, 152 de ensino elementar, 3331 de ensino de adaptação, 155 internatos com 478 seminaristas, e cerca de 1 000 000 de alunos distribuídos pelos diversos graus de ensino.
Acrescentemos, ainda, 28 maternidades, 108 dispensários, 5 hospitais, com uma assistência dedicadíssima e eficiente em que os números, repartidos pelos diversos sectores de cura e alívio de males físicos, trepa a muitos milhões por ano; as capelas, as igrejas, as catedrais, os numerosos imóveis construídos, as tipografias, as livrarias, as instituições de cultura e de piedade, a imprensa, desde o pequeno ménsário ao grande diário (como o Diário de Lourenço Marques e o Diário de Moçambique, na Beira), e teremos uma fugida imagem de empresa estupenda, mesmo com números já ultrapassados, que pude colher no Atlas Missionário Português e no Anuário Católico de Moçambique, o primeiro de 1962, e o outro de 1961, portanto já com um atraso de pelo menos dois anos.
Precisamos de recuar até 1936, para compreendermos como foi possível cobrir tão longa caminhada em tão curto espaço de tempo. Desde 1612. Moçambique constituía uma única prelazia, que na maior parte do tempo esteve sem bispo residente.
Viveu, assim, aos vaivéns da sorte a sua vida religiosa, sujeita ao calor temporário que lhe dava o prelado que vinha ocupar a sua sede. Até que, em 18 de Maio de 1936, a Santa Sé nomeia bispo tutelar de Leuce e prelado de Moçambique o então reitor do Colégio Português em Roma, Mons. Teodósio Clemente de Gouveia, logo sagrado na Igreja de Santo António dos Portugueses, a 5 de Julho seguinte. Desde que, em 11 do Abril de 1937, entrou, solenemente, em Lourenço Marques, a sua vida