5 DE DEZEMBRO De 1964 3997
Sr. Presidente: Um dia - há mais de uma década - trouxe ao plenário um tema de vasto e urgente conteúdo.
Disse, na altura, que deveríamos cancelar gradualmente todos os nossos destinos emigratórios, com excepção do que se prende ao Brasil, uma vez que o relativo aos Estados Unidos da América, pelos entraves e reduções que lhe puseram, mais valia aproveitá-lo como meio de refrescar o amor e a lembrança da Pátria no coração e na memória dos centos de milhares de portugueses que trabalham e vivem nesse grande país.
Estudei com afinco o tema e tenho a certeza de lhe ter dado o melhor do meu esforço.
Pois ao ler a proposta de lei e o projecto do Plano em apreciação senti reforçarem-se as razões alegadas ao sugerir que estancássemos a saída do nosso sangue para regiões onde ele se .entregará irremediavelmente, com o decorrer do tempo, a árvores com as raízes mergulhadas em outro chão e em outras sei vás.
Estamos a industrializar o País e já nos vão faltando braços para a indústria.
Estamos empenhados em combater o êxodo rural e já temos campos ermos de enxadas.
Apontei ainda ." premente necessidade de desviarmos para o ultramar as corrente emigratórias que nos levam gente válida - por vezes a gente mais válida -, e não podemos desfalcar o nosso caudal humano em proveito alheio.
E certo que as circunstâncias mudaram e que não se deve perder de vista o grave problema das divisas, de que tanto depende o nosso futuro imediato. No entanto, tudo devemos fazer para aumentar o potencial do mundo lusíada, sem prescindir da ajuda do Brasil, cuja imigração nos cumpre alimentar em percentagens capazes de contrabater, na medida do possível, a entrada e a influência de massas provenientes de outras nacionalidades.
Não quer isto significar que se pretenda dominar a área brasileira por intervenção na sua política, mas sim concorrer para que nessa área não se apague o carácter nem o estilo de vida dos pioneiros portugueses que no Brasil plantaram e renovaram vidas através de canseiras sobre-humanas - inacreditáveis, se a verdade histórica as não tivesse registado, com seus laivos de dor e lampejos de glória.
Jamais devemos contribuir, seja de que maneira for, para que se extingam, na estrutura da nação brasileira, a língua, a religião e os costumes, que são de perpétuo interesse para o Brasil e Portugal.
A verdade, por mais certa e pura, torna-se, por vezes, inoperante à força de ter sido dita. Mas esta será então uma verdade que brota do seio da história com inalterável sentido de actualidade.
Continuemos a dar ao Brasil o sangue que ele merece, e, atentando nas imposições do momento, reservemos o mais que pudermos para nós próprios, que enriqueceremos assim a comunidade luso-brasileira e chegaremos à cifra populacional capaz de a impor ao respeito e ao temor do Mundo.
Sei que não estou dando nenhuma novidade ao Governo e que ele é capaz de resolver este problema tão grave, com inteligência e acerto, mas sei também que, por vezes, é bom dar ao Governo o apoio de uma palavra para que ele sinta à sua volta o calor de uma opinião favorável aos desígnios nacionais, que são os seus próprios e indefectíveis desígnios.
E ao tomarem-se as medidas indicadas ou mais aconselhadas para se conseguir alcançar tão altos e vitais objectivos - entre as quais avulta a de não reduzirmos sensivelmente a massa da mão-de-obra indispensável aos
nossos cometimentos industriais e agrícolas - não deverá olvidar-se que o Estado não pode continuar a despender somas com a preparação profissional dos seus servidores através da concessão de bolsas de estudo para que, depois de utilizadas essas bolsas e de esgotado o tempo que a lei actualmente marca para os respectivos bolseiros trabalharem no País, os mesmos se ausentem para- o estrangeiro em busca de maiores proventos. Evidentemente que deverá ponderar-se o que auferem, de forma a compensá-los o melhor possível do seu esforço, mas se não pudermos acompanhar o que ganhariam no estrangeiro terão de funcionar as razões de interesse nacional. Pelo menos o aumento do tempo de serviço obrigatório após a utilização proveitosa das bolsas de estudo, figurando num regime contratual estudado convenientemente, representará, a meu ver, o primeiro passo a dar sem demora.
O turismo tem sido também um dos grandes problemas debatidos nesta Assembleia, até por mais de uma vez. Recentemente, e nesta mesma tribuna, na sequência de um debate do maior interesse, tive ocasião de expor os meus pontos de vista e deles não me arredo. Verifico, no entanto, que surgem opiniões favoráveis ao desenvolvimento do "turismo das massas" e de uma certa dispersão de recursos.
O parecer da Câmara Corporativa, mitigando, aliás, o parecer subsidiário da respectiva secção, alude à conveniência de não se abandonar completamente o chamado "turismo das massas", "pelo menos enquanto não subir muito o nível de vida do nosso povo e se quiser atender, como é mister, ao turismo dessa natureza que acorre ao continente em elevado número".
Ora o "turismo das massas" é um turismo pobre, que quase traz a merenda consigo, e que por vezes origina complicações ao abastecimento público. Além disso, é um turismo que influi directa e activamente nos hábitos do povo. Daí o poder contribuir de modo indesejável para a alteração da nossa típica maneira de ser. A própria Câmara Corporativa não deixa de reflectir nesse mal ao obtemperar, embora com optimismo que reputo contrariado pela experiência:
Alguns riscos de alteração sobre os nossos tipos de vida sempre advirão daí, mas crê-se que poderão ser encaminhados para proveito.
"Crê-se", mas não se garante, e o que pode garantir-se é a deterioração dos costumes da nossa gente, que viriam mesmo a perder muito do seu pitoresco e da sua originalidade, impregnada do nosso clima e trabalhada pelo tempo, e a característica, sobretudo, da índole desta raça, que tem o carinho do sol, os segredos do mar, mais a pureza da terra a dotarem-lhe a virtude.
Acresce que ao turismo de qualidade nem sempre agrada o ver-se misturado com o ruído da quantidade, o que pode traduzir-se, e já se tem traduzido, no afastamento daquele, com prejuízo manifesto da verdadeira economia do turismo.
Outra questão é a de saber se devemos concentrar mais os recursos em determinadas zonas ou pulverizá-los peitas zonas todas.
Já aqui foi dito e sustentado que o melhor e o mais imperioso interesse está agora em investir onde maior for o rendimento, e é evidente que o Algarve e a Madeira oferecem - dadas as suas condições especiais, designadamente para o turismo de Inverno - argumentos que recomendam uma mais rápida e criteriosa promoção através de obras e equipamentos turísticos o mais possível adequados e rentáveis. Não quer isto dizer que se