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12 DE DEZEMBRO DE 1964 4115

Tudo anda muito devagar entre nós, talvez porque santos da casa não fazem milagres ... Mas agora não são santos da casa, são homens que vieram do fim do Mundo, pagando do seu bolso as custas da vinda à Mãe-Pátria, os que se estão fazendo ouvir. Tenho a certeza - repito - de que serão escutados.

E as perspectivas são magníficas. A criação de um órgão permanente do Congresso, a promoção de reuniões frequentes nos vários territórios portugueses e no estrangeiro, a organização de cursos de férias nas Universidades da metrópole e Angola e Moçambique para estudantes portugueses residentes no estrangeiro (a exemplo do que já vem fazendo a Formosa), a criação de centros de cultura, a montagem de uma cadeia de programas e até de emissoras de radiodifusão por esse Mundo fora, a extensão das nossas linhas de navegação marítima e aérea a novos portos, com tarifas preferenciais para os mercadores portugueses aí estabelecidos, podem ser, entre outras, excelentes bases de estreitamento das relações morais e materiais entre os diferentes núcleos da comunidade. E lembremo-nos de que a coesão entre os núcleos portugueses espalhados pelo estrangeiro, concretizada por realizações práticas, resultará, afinal, em maior prestígio das nossas comunidades e, portanto, em maior prestígio de Portugal.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não desejo terminar sem dirigir uma palavra de apreço ao homem responsável pela realização do Congresso. Tamanha iniciativa justifica bem que se lhe reserve uma menção especial.

Aqui vão, pois, para o Prof. Doutor Adriano Moreira as minhas mais sinceras felicitações por esta obra de tão larga visão.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Para todos os congressistas reunidos nesta velha metrópole vão as cordiais e fraternas saudações da comunidade da província portuguesa de Timor, pela voz do Deputado que dela recebeu o mais honroso dos mandatos.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. José Manuel Pires: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se todo o português, consciente dos seus deveres para com a Pátria, deve estar atento a todos os sobressaltos que possam ameaçá-la, um deputado, para mais ultramarino, precisa de analisar com toda a seriedade os problemas, internos ou externos, que, de perto ou de longe, interfiram com a vida do nosso ultramar.

Nos últimos tempos, devido a perturbações que se têm manifestado no extremo norte de Moçambique, numerosas pessoas me vêm interrogando sobre a situação nesta nossa vasta província do Indico. Creio, por isso, que desta tribuna alargarei construtivamente o meu diálogo com todos os bons portugueses que procuram merecer, em verdade, e pelas obras, o alto privilégio de pertencer a este velho e nobre Portugal, na conturbada hora ecuménica que lhe coube em sorte.

Nada de anormal se passa em Moçambique, devo começar por garantir. Por um lado, as perturbações da ordem, já perfeitamente conhecidas do público através das informações oportunamente publicadas, foram tão superficiais, esporádicas e longamente esperadas, que em nada quebraram o clima de paz que reina em toda a província, mesmo nas zonas fronteiriças do Norte. Podem, pois, estar certos todos os bons portugueses de que se não repetirá ali a sangueira do Congo português, que há três anos enlutou a província irmã de Angola.

De mais utilidade me parece, pois, dilatar o olhar através da vasta África, analisando os acontecimentos que nela se vêm processando, na incidência do futuro de Moçambique e, de um modo geral, até, de todos os nossos domínios africanos. Três factos, ocorridos nos últimos tempos, se me afiguram da maior transcendência: o regresso de Moisés Tchombé ao Congo ex-belga, a boa vizinhança com o Malawi e a fusão do Tanganhica e de Zanzibar num Estado criptocomunista, com o nome de Tanzânia. A figura do primeiro-ministro congeles, desde que foi chamado a pôr em ordem o seu país, agiganta-se, dia a dia, aos olhos do Mundo: ...

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - ... e não tardará que todos o reconheçam, mesmo os seus inimigos de hoje, o primeiro político negro do nosso tempo, como por mim sempre afirmei. Quando abandonou, forçado, o Catanga, tudo estava contra ele, russos e ocidentais, dentro e fora do Congo, negros e árabes em geral. Mas tiveram de pedir-lhe que voltasse, para reintegrar o caos na ordem. Até entre os africanos, como se viu em Adis-Abeba, a maioria combateu-o duramente.

De russos e chineses nem vale a pena falar ... Começou por um apelo leal à concórdia, e só forçado rompeu hostilidades contra os rebeldes, que não quiseram entrar no diálogo fraternal. A comédia mal montada do Cairo só o prestigiou, ante o Ocidente e, particularmente, entre a vasta negritude, que tem umas velhíssimas contas a ajustar com o pan-arabismo..

Quem ignora, com efeito, que nenhum povo europeu oprimiu jamais o negro com o despotismo secular das hostes muçulmanas, desde o século VIII em diante, tanto na prática da mais cruel escravatura (com mercados e estradas bem conhecidos, através de todo o continente, inflectindo, de norte a sul, e de ocidente para oriente, na direcção da Arábia e das regiões mediterrânicas) ...

Vozes: - Muito bem!

O Orador: -... como na humilhante subserviência em que sempre mantiveram os povos de cor, onde quer que se oferecesse dominá-los, à maneira do que está a suceder no Baixo Sudão, ante a indiferença criminosa da O. N. U.?

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Ao regressar do Egipto à sua terra, Tchombé foi o primeiro político negro que teve a coragem de exprimir em voz alta, com rara coerência, essa vaga imensa de ressentimento da sua raça contra o árabe opressor, desmascarando a política ardilosa de Nasser, de Ben Bella e outros chefes do mesmo grupo maometano, como genialmente a retratou o imortal contista Franz Kafka.

Ficou dado o primeiro passo decisivo para a cisão da África em dois mundos - o árabe e o negro.

No dia em que Tchombé tiver pacificado o seu povo, dia que já se vislumbra muito próximo, iniciará, certamente, a segunda cruzada, como logo anunciou. Coberto pelo extraordinário prestígio de uma vitória que ninguém considerava possível, a sua eloquência e diplomacia torna-