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4118 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 166

A insistência com que nesta sessão legislativa, verificada, aliás, na" três sessões anteriores, se vem tratando dos problemas da agricultura dá - só por si - a ideia segura de que a coisa, neste sector da vida nacional, está muito longe de correr sequer de forma sofrível.

Sabemos que talvez em nenhuma nação do globo terrestre a agricultura tenha atingido situação de relevo em relação às outras actividades económicas.

Suponho, no entanto, que ninguém discordará de que em Portugal a gravidade do problema assume proporções alarmantes.

O estado francamente deficitário, à beira de ruína iminente, da agricultura portuguesa, tanto quanto me venho apercebendo, parece alicerçar-se, sobretudo, em três ordens de circunstâncias:

Primeiramente, na actuação perniciosa do intermediário dispensável. Em segundo lugar, no espírito de rotina dos processos do agricultar. Finalmente, nos baixos preços do mercado.

Se estas razões justificam o estado calamitoso que a agricultura portuguesa está a atravessar, têm especial incidência nas regiões nortenhas, onde impera o cultivo do centeio, da batata e, vá lá, do milho.

Embora a pinceladas largas, atentemos em cada uma destas causas:

A ninguém resta duvida de que os preços de compra no produtor não se harmonizam com os preços de venda ao consumidor.

De lá para cá, as diferenças para mais, no dizer do mui ilustre Deputado Dr. Pinto Carneiro, vão de 100 por cento nalguns géneros ato 800 por cento noutros.

Quer dizer: o grosso da coluna, a carne de primeira, para o intermediário; o restante, o menos aproveitável, para o produtor.

Quem trabalha no mourejar do dia a dia e com o seu próprio suor rega as terras que amanha arruína-se.

O intermediário, com um empate de capital, tantas vezes a curto prazo, vai amealhando o suficiente para viver uma velhice regalada.

Talvez não seja despropositado perguntar: de quem é a culpa?

A resposta menos pensada atingirá duramente o produtor, precisamente por não se organizar na defesa de interesses comuns.

A verdade é que são precisamente os menos evoluídos, mental o economicamente, como sejam, na generalidade, os produtores de batata, centeio e milho, que, por si sós, se julgam incapazes de remar contra a maré baixa dos seus interesses. As suas possíveis iniciativas, por falta de mentalidade e de disponibilidades financeiras, estariam sujeitas a um autêntico fracasso. Carecem da intervenção dos organismos do Estado, que noutros sectores da vida económica nacional têm meritòriamente alcançado êxitos incontáveis. Exemplos? Temo-los nas próprias actividades do sector primário, como sejam: lagares cooperativos de produtores de azeite, adegas cooperativas, actividades concernentes ao bem-estar rural, operações de emparcelamento, etc.

Vem-se, no entanto, verificando, que a intervenção dos organismos do Estado se vai processando em relação aos grandes problemas dos proprietários e produtores mental e económicamente mais capazes e mais evoluídos.

Assim, vão ficando num esquecimento e num abandono lamentáveis os que, por serem mais pobres de tudo, mais precisariam das iniciativas e do amparo dos Poderes Públicos.

Em segundo lugar, fala-se muito de espírito de rotina, mostrando-se -do que a ninguém resta dúvida - que o que sobretudo interessa é produzir mais barato.

Mas, como se evoluirá nesse sector se a verdade é que nada ou muito pouco se tem feito para educar em tal sentido as classes mais desprotegidas e mais débeis? Por falta de meios e de conhecimentos, encontram-se impossibilitados de actuar por si, aguardando que sejam os serviços do Estado a ministrar-lhes os ensinamentos e a colocarem à sua disposição os maquinismos que, em regime de aluguer, lhes permitam - na medida do possível - substituir o braço pela máquina num esforço de barateamento dos géneros produzidos.

Não teriam os grémios da lavoura alguma palavra a dar sobre estes assuntos?

Não duvidamos da acção benéfica das operações comerciais dos referidos grémios, no sentido da estabilização de preços. Mas confessamos que mais operações, só por si, não justificam a sua existência. Bem podiam tais organismos dar um contributo mais eficiente ao barateamento do cultivo, conseguindo, assim, que os preços do mercado fossem menos comprometedores e consequentemente mais rentáveis.

Criticar o pequeno proprietário e o agricultor de rotina é injustiça tão grande como seria a de um déspota que, sem intervenção cirúrgica,- exigisse que um cego visse. A culpa da rotina na produção agrícola não é, pois, de quem a pratica, mas de quem, podendo e devendo intervir, ministrando ensinamentos, o não tem feito.

Assim se vão deixando ao abandono, entregues à sua própria ignorância, os que, por menos dotados, mais precisam da protecção e amparo dos respectivos serviços públicos.

Embora no séculos das luzes, continuam os processos de cultivo a ser vistos à luz mortiça da velha candeia de azeite.

Finalmente, referimos os baixos preços do mercado, que, sem vantagens apreciáveis para o consumidor, são realmente aviltantes.

Se a produção foi escassa e se a procura é superior à oferta, os géneros sobem.

Não tarda, no entanto, que se estabeleça tabela de preços máximos, como medida, aliás justíssima, de protecção ao consumidor.

Se, pelo contrário, o preço é da ordem de não pagar o custo do cultivo, ninguém se lembra do produtor, e se alguém o recorda, como deste mesmo lugar brilhantemente referiu o nosso ilustre colega Dr. Nunes Fernandes, as medidas tomadas parece pretenderem atingir o contrário daquilo que se propõem.

Haja em vista o caso da intervenção da Junta Nacional das Frutas anunciada nos jornais de 28 de Agosto último.

Dela constava que os armazéns situados em Lisboa e Porto - e só estes -, parecendo que os situados nas regiões altamente produtoras do tubérculo não merecem as atenções daquele organismo, receberiam a batata Arranbanner a $80 o quilograma e as outras qualidades a $90.

Nas Beiras, e certamente em Trás-os-Montes, o preço que ao tempo corria era de 1$ por quilograma.

Aquela deliberação, como tudo faria supor, fez descer imediatamente o preço para quantia inferior à anunciada, dado que as regiões produtoras mais afastadas teriam de suportar encargos de transporte superiores aos das áreas de Lisboa e Porto.

Por este andar bem se poderia afirmar que o atraso no sector da produção agrícola em relação a outras actividades económicas é tão grande que se vai perdendo de vista, e talvez por isso caindo no esquecimento.

Destas circunstâncias, que só de leve foram comentadas, resulta o inevitável êxodo dos campos, que, se-