O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

14 DE DEZEMBRO DE 1964 4133

Convém salientar, Sr. Presidente, que a falta de médicos é maior problema para os doentes que para os próprios médicos e que, por enquanto, esta deficiência só se sente com certa agudeza nos meios rurais; nas sedes dos concelhos, quanto a especialistas; e, sobretudo, no ultramar.

Cremos que são duas as principais causas da baixa de inscrições nas Faculdades de Medicina: a primeira relaciona-se com os reduzidos atractivos que oferece, actualmente, a profissão em função de um curso longo, complexo e dispendioso; a segunda baseia-se na autêntica impossibilidade com que tantos possíveis candidatos a alunos das Faculdades de Medicina deparam no aproveitamento do ensino médio clássico que dá acesso a essas Faculdades, em virtude da notável falta de liceus em alguns aglomerados populacionais muito importantes.

E porque estão sempre no nosso pensamento os casos que mais directamente vivemos e melhor conhecemos não vamos deixar passar esta oportunidade sem, novamente, pedirmos a S. Ex.ª o Sr. Ministro da Educação Nacional, a, quem respeitosamente - mais uma vez - prestamos justíssima homenagem, que se digne determinar a criação, tão necessária, dos Liceus de Santo Tirso e de Matosinhos.

O Sr. Alberto de Meireles: - Muito bem!

O Orador: - Desta maneira, dar-se-ia ]á a muitos milhares de portugueses o direito à cultura que a Constituição a todos concede e se contribuiria para a desejada melhoria das estatísticas relativas às inscrições nas Faculdades de Medicina.

Mas também é evidente que à profissão médica faltam, actualmente, os atractivos que vencem o temor que aos jovens, naturalmente, sempre desperta a perspectiva de uma caminhada necessariamente longa, áspera, ruinosa c sem destino compensador.

Assim, parece que além da necessidade de criação de mais liceus é fundamental cuidar-se da valorização, do prestígio, dos atractivos da nobilíssima profissão médica.

E é errado julgar-se que os grandes beneficiários desse prestígio são os médicos.

Mais do que eles vão, indiscutivelmente, usufruir todos os doentes.

Se o saber curar se baseia, essencialmente, no estudo, na investigação e na técnica, a arte de curar vai buscar a sua enorme força ao prestígio pessoal de cada médico.

E não se pense também que esta arte tem menor valor que aquele saber nas ansiedades e nas angústias dos doentes.

Recordo, Sr. Presidente, que uma célebre clínica dos Estados Unidos da América publicou uma estatística com 45 por cento de curas por meio de placebos e que foi reconhecido que os elementos verdadeiramente curativos dos placebos prescritos estavam unicamente no prestígio dos médicos e na abnegação sacerdotal de uma arte de curar em que nada havia da tendão exuberante de um Freud, nem da fantasia delirante de um Mesmer.

Se continuarmos a desprestigiar os médicos - ou se eles se desvalorizam pelas suas próprias mãos-, privam-se os beneficiários dos seus serviços de um meio curativo que, ainda actualmente, temos de considerar, no quadro geral da terapêutica e nos respectivos campos funcionais, de valor aproximado ao dos famosos e já tão populares antibióticos.

A medicina dignificada torna, naturalmente, a profissão mais sugestiva, e sem este atractivo nem a acção médica se desenvolve integralmente, nem se consegue impedir o agravamento do problema da falta de médicos, e implicitamente da falta de profissionais paramédicos; da falta de hospitais, da falta de variados serviços de saúde e de assistência; e, como é óbvio, do respectivo apetrechamento material. Pois, é claro, não havendo médicos, nem é preciso lançar mão cio velho argumento, usado e abusado, da falta de verba para justificar a debilidade do nosso sistema assistencial.

Parece podermos concluir que é fundamental prestigiar o profissional da medicina.

Note-se que neste aspecto básico conta mais a qualidade que a quantidade, e, assim, deste jeito, queremos frisar que daqui em diante se torna mais difícil o raciocínio e muito mais ingratas as respectivas conclusões.

Vamos, pois, usar agora da maior cautela, procurando descobrir as causas mais graves da falta de prestígio do médico, com o objectivo de aperfeiçoar a qualidade para despertar a quantidade e melhor se poder cuidar de quem carecer dos seus indispensáveis serviços.

Sr. Presidente: Salta aos nossos olhos, efectivamente, que a profissão médica está perdendo prestígio.

E sente-se o desprestígio nas Faculdades de Medicina, na Ordem dos Médicos, na administração pública, no seio da sociedade e no acto médico.

E muito delicado e até ingrato falar da necessidade de prestigiar as Faculdades de Medicina, pois pode entender-se, a priori, que se esquece o muito que a sociedade deve ao trabalho e ao saber dos mestres da medicina portuguesa.

Podemos, todavia, falar sem receio no desprestígio das Faculdades de Medicina, porquanto este diz mais respeito às condições de trabalho que ao próprio trabalho.

O professor de Medicina, para ser, como convém, essencialmente mestre e investigador, necessita de independência económica e de ter à sua disposição os melhores meios indispensáveis ao cabal desempenho dessas funções.

Sem isso terá de ser sempre muito mais clínico que professor e investigador e os seus discípulos terão de continuar a procurar, como até agora, nos livros estrangeiros mesmo o mais elementar à sua formação profissional.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - Sem isso jamais surgirá aquele espírito criador que prestigia uma Faculdade; nem o Estado poderá ter a força moral precisa para exigir o máximo rendimento desses seus sábios servidores.

Uma Faculdade tem de ser também fonte-nascente, e não o simples conduto da criação alheia.

Mas honra aos nossos mestres, que, tantas vezes em condições bem precárias, nos revelam ainda, de longe em longe, do que seria capaz o espírito criador dos Portugueses.

Sr. Presidente: Sente-se também o desprestígio na Ordem dos Médicos, e este na medida em que à Ordem falta o poder necessário e indispensável para impor o seu direito ao diálogo em condições paralelas com outros órgãos corporativos, nos casos em que se jogam interesses das classes que representam; e ainda na incapacidade para obrigar os médicos inscritos a respeitarem as determinações da Ordem, particularmente aquelas que visam o interesse da colectividade e a dignidade profissional.

Não obstante a boa vontade, o esforço e a competência de todos quantos abnegadamente têm dirigido e dirigem a Ordem, a verdade é que cada filiado faz o que entende, aceitando, por exemplo, contratos vexatórios depois de