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4392 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 180

vencões e de crimes, transformados, como por encanto, era actos lícitos, porque já nem reprovados nem punidos por qualquer norma de moral ou direito.

Depois disto que fica a restar da argumentação trazida à liça pelos adversários da indivisibilidade?
Nada, a não ser talvez o também já estafado argumento de que a industrialização dos produtos farmacêuticos atingiu hoje um tal grau de desenvolvimento que apenas em 5 ou 6 por cento dos casos a receita não ficará totalmente aviada pela entrega ao cliente de um ou mais produtos especializados, e para ser intermediário de tão comezinho acto de comércio não é necessário possuir um curso superior com uma breve prática de alguns meses, quiçá de semanas, o proprietário não farmacêutico ficará apto a vender ao público todas as especialidades existentes no seu estabelecimento!
Na verdade, a venda de um medicamento não passa de mero acto comercial para o proprietário não farmacêutico Para ele, de facto - e é claro que ressalvo aqui todas as honrosíssimas excepções existentes - , a única condição da entrega ao comprador da especialidade solicitada, quer por receita médica, quer verbalmente, está na conferência do nome do produto estampado na respectiva embalagem, e pouco mais. E ele pode fazer isso dezenas de vezes por dia, regularmente, mecanicamente, sem falhas Até que surge o «caso», e com ele a dúvida, por falta de conhecimentos técnicos, com ele a perplexidade, por falta de competência e consciencialização profissional e com ele, as mais das vezes, e pelas razões apontadas, uma solução errada, perigosa ou até moralmente censurável.
Não assim para o proprietário farmacêutico, como é evidente.
Como técnico diplomado por um estabelecimento de ensino superior, sentindo o peso da sua responsabilidade profissional e a grilheta sagrada do seu escrúpulo deontológico, familiarizado com toda a nomenclatura química, conhecedor profundo de posologia, indicações e contra-indicações terapêuticas, perito em tóxicos, antigenésicos, estupefacientes, abortivos, tranquilizantes e outros produtos cuja venda está regulamentada, o farmacêutico, à frente da sua oficina de farmácia, tem, necessàriamente, uma alta missão a desempenhar, muito diferente da de simples intermediário na venda dos medicamentos.
Com a sua formação cientifica, com a noção da sua responsabilidade, com o pensamento posto nos deveres da deontologia, ele, e só ele, está em condições óptimas de poder aconselhar, esclarecer, responder a dúvidas, recusar a entrega de determinados produtos sem prévia indicação clínica, e até negar o aviamento da própria receita médica quando constate haver nela erro ou omissão que torne a sua execução perigosa.
Bem diferente, na verdade! Tão diferente quão evidente é a impossibilidade da sua substituição por outrem não farmacêutico!
E quanto aos famigerados 5 ou 6 por cento de produtos que devem ser manipulados, e em cuja composição entram muitas vezes aqueles tóxicos, e estupefacientes, e tranquilizantes, etc, acaso essa percentagem, aparentemente diminuta, poderá fazer esquecer o perigo sempre iminente a que a saúde pública está sujeita?
Esse perigo não existiria mesmo que tal percentagem baixasse para 1 por cento? Não continuaria a existir sempre, mesmo com a eliminação completa dessa percentagem?
E tão óbvia a resposta que não nos deteremos mais sobre esse ponto.
Não resta, pois, mais nada da argumentação produzida em favor da tese da livre propriedade da farmácia.
Mas nunca será de mais repetir que sobre o aspecto primordial do problema em debate - a saúde pública - os defensores dessa tese não invocam, nunca invocaram, uma única razão válida demonstrativa de que o regime por eles preconizado é o mais aconselhável, o mais eficiente para a defesa daquele bem comum.
Remetem-se, sim, à afirmação cómoda e fácil de que a solução do caso estará na obrigatoriedade de uma «gerência técnica, pessoal e efectivamente exercida por farmacêutico» e sempre garantida por uma fiscalização rigorosa e implacável Deste modo ficará salvaguardado o aspecto sanitário da actividade farmacêutica e, portanto, defendido o interesse público.
Simplesmente, uma tal solução nunca poderia conduzir a resultados satisfatórios, quando considerados adentro do regime da livre propriedade.
E não porque, na imensa maioria dos casos, essa pretendida gerência dissociada da propriedade da farmácia seria - como já o é hoje - puramente nominal, e a pretendida fiscalização, rigorosa, actuante, implacável, seria uma deliciosa utopia, de nulos resultados práticos.
O impor a obrigatoriedade da gerência técnica no domínio da livre propriedade, a ser exercida pessoal e efectivamente por um farmacêutico, só terá real significado quando essa obrigatoriedade se refira a uma permanente e efectiva presença do farmacêutico-gerente na farmácia, e uma tal exigência implicará, por força, que o gerente técnico se conserve na farmácia todos os dias, desde a abertura ao encerramento, fora as noites de turno o os domingos por escala. Não poderá fazer mais nada, não poderá pensar em qualquer outra actividade lucrativa, não lhe restará tempo senão para ser, real e verdadeiramente, um gerente técnico.

O Sr. Burity da Silva: - V. Exa. dá-me licença? V. Exa. acha, pelo facto de o proprietário de uma farmácia ser o farmacêutico, que não se desviará de lá, estará sempre presente?

O Orador: - É assim que nós desejamos que seja.

O Sr. Sales Loureiro: - Mas para isso é necessária uma regulamentação.

O Orador: - É o que a lei em discussão pretende.

O Sr. Gamboa de Vasconcelos: - Acerca do mesmo assunto, como médico, posso informar que muitas farmácias de Lisboa têm à sua frente um farmacêutico, com permanência, e que na grande maioria das da província, pelo menos onde o princípio da indivisibilidade se verifica, o proprietário da farmácia está sempre à frente do seu estabelecimento.

O Orador: - Mas, chegado aqui, urge perguntar uma tal soma e qualidade de trabalho especializado como terá de ser remunerada? Com os irrisórios e quase ultrajantes 500$, 700$, o máximo 1000$, com que os proprietários não farmacêuticos vêm pagando o empréstimo do nome e do diploma do farmacêutico? Decerto que não, como todos, esses proprietários não farmacêuticos inclusive, hão-de concordar.

O Sr. Proença Duarte: - V. Exa. dá-me licença?

O Orador: - Faz favor.