8 DE ABRIL DE 1965 4729
É este desequilíbrio que nos atormenta, porque, na verdade, é ele que cristaliza as lacunas evidentes e lamentáveis que cada vez mais sobressaem no nosso panorama social.
Sr. Presidente: Desejamos entrar mais precisamente na ordem do dia, mas não resistimos à íntima tentação de insistir na necessidade de estender a assistência e a previdência àqueles sectores economicamente débeis a que atrás já nos referimos e que constituem ainda uma maioria sem protecção conveniente.
Tem havido, efectivamente, a louvável preocupação de cuidar pelo presente e pelo futuro de muitos quantos trabalham por conta de outrem. A presente proposta de lei confirma isto quase no absoluto.
Todavia, é preciso também reconhecer que estes que não são só estes que formam a magnífica massa dos trabalhadores portugueses.
Outros tantos trabalham por conta própria, mas lutam, da mesma forma, penosamente, pela sua sobrevivência e da Pátria e têm, igualmente, um corpo para manter, um espírito para cultivar e uma alma que perder.
E se lhes é possível, por iniciativa individual, recorrerem às várias empresas seguradoras para efeito de seguros contra acidentes, já nada, porém, podem conseguir quanto a todos os outros riscos de saúde, visto que essas empresas, pelo menos as nacionais, não aceitam um seguro que cubra todas as doenças e incapacidades.
Há que reflectir em que os trabalhadores por conta própria também têm, para efeito dos seus deveres e obrigações, um patrão para quem, na realidade, trabalham. Esse é o Estado, que, como pessoa de bem, não pode esquivar-se às responsabilidades que exige a toda a classe patronal.
Sr. Presidente: Alargámos talvez demasiadamente as considerações em relação aos sectores económicos mais débeis e não protegidos por qualquer sistema de assistência e de previdência, mais porque os benefícios da proposta de lei se limitam aos que trabalham por conta de outrem e, naturalmente, no âmbito restrito dos acidentes de trabalho e doenças profissionais, que pelo receio de que a referida proposta mais venha onerar a mais pobre classe patronal, visto que neste último caso são francamente optimistas as declarações do Sr. Ministro das Corporações.
Com efeito, não obstante a maior amplitude de direitos e valores de indemnizações, não reconhece o ilustre Ministro das Corporações razão às empresas seguradoras para aumentarem as taxas, pois as reservas matemáticas encontrarão o equilíbrio na mais larga obrigatoriedade do seguro social.
Calcula-se em mais 51 700 os empresários a segurar, e que só no sector agrário o número de segurados aumenta em cerca de 50 por cento.
Há ainda a considerar a redução dos riscos pela maior atenção a prestar à prevenção dos acidentes e doenças profissionais, «susceptível de diminuir espectacularmente os casos de reparação e, portanto, os seus encargos». Calcula-se que a prevenção possa fazer baixar os índices de sinistralidade em 30 e 40 por cento. E pensamos nós que é ainda possível uma redução no encargo de 20 por cento relativo ao enganador, ora mais dispensável pelo facto de o seguro ser coisa obrigatória.
Mas não é só naqueles pormenores que se reconhece a preocupação do Sr. Ministro em relação à fragilidade económica de muitos patrões, mas também ainda a mesma atenção se regista nas exclusões permitidas ao sector agrário e no facto de através do regulamento se proceder à extensão obrigatória por escalonamento.
Todavia, quanto a este penúltimo ponto, e que consta da lamenta- base viu, seja-me permitido desde já recear que possa panorama corresponder a uma porta de entrada para algumas mistificações.
Mas, no conjunto, do que não restam dúvidas e merece os nossos melhores aplausos é o evidente aumento de nível de segurança social dos trabalhadores que a proposta de lei vai proporcionar em comparação com o que actualmente se observa
Teremos, efectivamente, para o futuro e por exemplo, menos casos de descaracterização de acidentes, aumento da percentagem nas pensões devidas por incapacidade permanente e por morte e o agravamento destas em função da idade dos beneficiários, a elevação do limite de idade são só dos filhos e de outros patentes sucessíveis, e das despesas de funeral, a acumulação de pensões para além das do cônjuge sobrevivo e dos filhos, e a determinação da remuneração-base sem qualquer redução.
Da proposta de lei em apreciação fica ainda a aguardar-se a criação do Conselho Nacional de Prevenção dos Acidentes de Trabalho e das Doenças Profissionais, a criação de serviços e comissões de segurança nas empresas, a carteira médica profissional e a elaboração da lista das doenças profissionais.
Temos à frente do Ministério das Corporações um Ministro inteligente, sabedor e ansioso de bem servir, e por isso confiamos absolutamente que todas essas inovações não venham a ser letras mortas nem desvirtuadas pelos regulamentos.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Os meios e os fins da presente proposta estão de harmonia com o apuramento da evolução social e dentro das melhores razões jurídicas e da nossa economia.
E, para além de completar a cobertura de todos quantos labutam por conta de outrém e de alargar notavelmente as respectivas indemnizações, em casos de acidentes e doenças profissionais, dá ainda mais um passo em frente no campo relevantíssimo da prevenção.
Já em 1950 o Ministro Veiga de Macedo - hoje nosso distintíssimo e querido camarada nesta Câmara -, ao lançar, com o seu contagiante entusiasmo, a Campanha Nacional de Prevenção, afirmou que só em dois anos - 1957 e 1958 - morreram 1000 operários, compreendidos entre cerca de 1 milhão de acidentes.
E ao recordarmos a actividade do Dr. Veiga de Macedo no Ministério das Corporações não seríamos gratos nem justos se não acrescentássemos que, no âmbito do seguro social, os trabalhadores portugueses lhe ficaram a dever, além dessa Campanha Nacional de Prevenção, muitas outras valiosas iniciativas, de entre as quais devemos destacar a exaustiva elaboração da tabela nacional das incapacidades, que substituiu a tabela de Lucien May et, a publicação do Decreto-Lei n º 41 840 e do Decreto n º 41 821, sobre a segurança do trabalho nas obras de construção civil, o estudo da organização do serviço de medicina do trabalho nas empresas, o estudo da actualização do quadro das doenças profissionais, o estudo das alergias adquiridas no trabalho, no sentido de saber se devem ser consideradas doenças profissionais; o estudo visando a readaptação profissional, o estudo da indústria louseira de Valongo, no que respeita à prevenção da silicose, o despacho determinando o estudo urgente das regras de higiene e segurança a observar nas obras das barragens e idênticas, a determinação do estudo das condições de higiene e segurança do trabalho na indústria de construções e reparações navais de ferro; o estudo dos casos de parasitose e silicose entre o pessoal das minas de carvão de S. Pedro da Cova,