11 DE NOVEMBRO DE 1867 1717
do Conselho ao proclamar que «Portugal tem oito séculos de idade, sendo o mesmo povo, a mesma Nação, o mesmo Estado. Ele sobreviveu a muitos Estados modernos já desaparecidos, e realizando, através dos séculos da sua existência, uma das obras mais vastas e mais valiosas para o património colectivo da humanidade. Isto é, não durou porque se furtou a viver; durou precisamente porque viveu - a vida intensa do soldado, do trabalhador da terra, do explorador do mar, do descobridor, do missionário, do portador de uma doutrina e de uma civilização». E tudo isto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, constituiu os alicerces da perdurabilidade de uma Pátria comum repartida por tão distantes e diferentes partes do Mundo; e tudo isto justifica a força da nossa consciência de Nação, que está estruturada desde a fundura dos tempos e é a explicação da nossa presença firme através da ronda dos séculos; e tudo isto nos ajuda a melhor compreender a sobrevivência da Pátria na sua dimensão física, moral e espiritual, a qual, como escreveu, com justeza, o distinto editorialista do conceituado jornal O Século, «os nossos antepassados criaram num conjunto unitário que iguala várias etnias, sem cuidar de diferenças de sangue, de cor, de pele, de idioma ou dialectos, de graus de cultura ou de regras de vida, pois o essencial era considerar a todos seres humanos, nossos irmãos, carecidos de promoção social e económica, de carinho e solidariedade»; e tudo isto faz compreender que Portugal se mantenha, resista e continue pujante de possibilidades na irradiação das suas tradições, recamadas de nobreza, e detentor daquelas múltiplas potencialidades que condicionam a grandeza e asseguram a perenidade das nações.
A nossa presença na florescente província do Indico, durante a qual nunca nos faltaram o companheirismo, tão útil, e também a simpatia, tão estimada, e gentilezas requintadíssimas, sem conta, dos queridos colegas de Moçambique, com posição dianteira para o Dr. Gonçalo de Mesquitela, a distinção da audiência concedida pelo Sr. Governador-Geral e comandante-chefe das forças armadas, os contactos estabelecidos com as mais qualificadas entidades oficiais, desde as administrativas às religiosas e políticas, com as briosas forças armadas, no conjunto dos seus elementos, dos mais aos menos hierarquizados, com a acolhedora população moçambicana, de várias etnias e de diversos escalões sociais, e. enfim, com os mais distintos sectores de carácter sócio-económico-cultural, permitiram-nos, Sr. Presidente, arrecadar uma síntese expressiva, reconfortante, consoladora, daquela formosa e progressiva parcela da Casa Lusitana, na qual brancos, pretos e mestiços, sob a sombra protectora da bandeira das quinas, em perfeito espírito de irmandade alicerçada numa sólida comunhão de sentimentos afectivos e cívicos, ao ritmo de uma actividade esforçada e persistente, entoando cânticos de confiança e de fé, se dão as mãos no alto propósito de a valorizar e tornar mais próspera debaixo do signo da ordem, da harmonia social e do trabalho.
Os nossos irmãos moçambicanos, no seu enraizado portuguesismo, na sua capacidade multiforme de trabalhar, de cultivar, de civilizar, são dotados de uma vontade forte, empreendedores, corajosos e decididos, com a têmpera de espírito própria dos pioneiros que, ao abordarem a África, o fizeram pela primeira vez, ocupando Moçambique vão decorridos quatro séculos e meio e salta aos olhos, Sr. Presidente, e é evidente, e é palpável a existência, também ali, de uma política que é válida porque a sua frutuosidade se concretiza e manifesta em empreendimentos de fomento económico, em obras de promoção social e humana e de progresso espiritual que, na verdade, impressionam em função do número, envergadura e diversificação das suas finalidades para benefício da terra e ao serviço do homem branco ou de cor.
Do contexto destas afirmações emerge naturalmente um axioma e sobressai uma certeza o axioma de que na base de todo o progresso está necessariamente o trabalho; a certeza de que sem ordem e sem paz o trabalho não é possível.
Dentro desta ordem de ideias, diremos que, se o surto terrorista apenas abarcou e abrange uma zona confinada ao Norte da província, se o patriotismo da população de Moçambique faz jus a que o apontemos e exaltemos pela sua estrutura monolítica e real intensidade da sua vibrante eclosão, todavia, não se oculta que, mercê da utilização das armas brandidas pelos nossos inimigos implacáveis e dos actos de perfídia praticados pelos falsos amigos, conservamos uma das mãos apoiada na charrua e a outra na espingarda, mantendo-se as forças armadas em estado de alerta, numa vigília permanente, oferecendo o seu sangue e dispondo-se a jogar a sua vida pela integridade da Pátria e em defesa da honra nacional! E por força da situação que foi criada ao território da África portuguesa, alvo, a um tempo, da tentativa exterior de infiltração de princípios demagógicos criadores da instabilidade política, da desagregação social e de ideias espúrias, malfazejas, de destruição e de morte, de planos estratégicos e de cálculos marcantilistas urdidos por uma fauna de abutres internacionais em que, a par da supuração do embuste, da insídia, do espírito farisaico e da farsa de falsas atitudes, o despeito, a calúnia e o ódio se transformaram em gestos de expoliação e de rapina acobertados e encorajados pela política «antropófaga» seguida na O. N. U. contra Portugal - o justo qualificativo é do ilustre senador brasileiro Vasconcelos Torres -, o teatro da guerra instalou-se também no Norte da província de Moçambique.
E já aí, só nessa parte restrita daquele nosso imenso território africano, que os elementos das forças armadas de Portugal estão a defender a sua própria casa, descoberta, conquistada, construída e ocupada pelo engenho, pelo. espiritualismo, pelo labor e pelo sacrifício das gerações que os precederam. Pela primeira vez, Sr. Presidente, estivemos em contacto apertado com os nossos militares na base de Metangula, situada no distrito do Niassa. Abraçámo-los, interrogámo-los, sentimo-nos felizes e honrados por termos convivido com esse punhado de valentes portugueses! Admirámo-los, edificámo-nos com o seu heróico comportamento e tomámo-los como um paradigma, como um símbolo em lídima representação daqueles outros que em diferentes zonas de Moçambique, em Angola e na Guiné se imolam, abnegadamente, na defesa tenaz da Pátria comum de todos nós.
Sentimos ser pobre e mesquinho o nosso vocabulário para exaltar com a dignidade merecida as virtudes castrenses e patrióticas de que são exemplificação alta e nobre, viva e constante: espírito de disciplina, sentido de responsabilidade, fortaleza de vontade, coragem moral, devoção ao dever, poder de decisão, serena energia, discernimento, combatividade, rara capacidade, insensibilidade ao perigo, desprezo pela vida, em suma, encarnação perfeita dos princípios da ética militar e profunda vivência dos mais puros ideais de civismo - eis, Sr. Presidente, o que define e caracteriza a formação espiritual e a desenvoltura de acção dos bravos portugueses que lutam e morrem para que Portugal de todas as latitudes seja sempre português!